23 março 2025, 09:50
Joelho de Toni a falar sozinho no passe para Eusébio
Antigo médio simula para A BOLA o cruzamento de março de 1975 e exclama: «Mesmo com pouca força, logo já tenho que fazer gelo no joelho...»
23 de março de 1975 - 23 de março de 2025. O último golo do Pantera Negra de águia ao peito foi no Estádio do Bonfim. Toni fez a assistência e Vaz sofreu o golo. A BOLA levou ambos ao relvado e à baliza onde tudo aconteceu.
Toni entra no carro que nos conduzirá a Setúbal e, entre sorrisos, pergunta: «Como é que vocês foram descobrir que o último golo do Eusébio em jogos oficiais pelo Benfica foi há 50 anos e, sobretudo, como é que descobriram que fui eu a fazer o passe para esse golo?!».
A pergunta tem resposta fácil: arquivos de A BOLA e também o único vídeo que existe sobre esse jogo entre V. Setúbal e Benfica, de 23 de março de 1975, realizado no Estádio do Bonfim. Toni recebeu a bola sobre a direita, um pouco antes da quina da área do Vitória, olhou levemente para a grande área e viu uma figura negra e esguia, então com 33 anos, a correr para a pequena área. Cruzou e depois, em força, mas também em jeito, a cabeça de Eusébio da Silva Ferreira fez o resto: golo.
Estávamos na jornada 26 de 1974/1975 e o Benfica liderava a Liga com cinco pontos de avanço sobre o Sporting e com 21 sobre o Vitória. Era, pois, quase impensável que, com Bento, Artur, Humberto, Toni, Eusébio, Simões e Vítor Baptista, entre outros, os encarnados de Pavic pudessem sair derrotados de Setúbal. Até porque, até então, só uma vez tinham perdido: 0-1, na Luz, com o FC Porto, na ronda 7. Mas saíram. Eusébio chegou ao tal golo ao minuto 21, mas o Vitória daria a volta ao resultado, com golos de Jacinto João aos 56’ e Duda aos 86’.
É nisto que Toni vai pensando enquanto viajamos para Setúbal, para encontrarmos Vaz, o guarda-redes do Vitória que, no final de março de 1975, sofreu o último golo de Eusébio em jogos oficiais pelo Benfica. «A primeira vez que estive em Setúbal foi, salvo erro, em [23 de janeiro de] 1966, num Vitória-Académica. Lembro-me de que o Jaime Graça jogava no Vitória, já era um grandíssimo jogador e, meses depois, estaria no Mundial-1966», recorda o agora diretor da Federação Portuguesa de Futebol.
«Eu só conhecia o Jaime dos cromos. Não havia internet e, na altura, pela televisão só se viam as finais da Taça dos Campeões Europeus, da Taça de Portugal, da Taça de Inglaterra; jogos da I Divisão portuguesa… zero. E, por vezes, aos sábados, alguns jogos de râguebi, narrados pelo senhor Cordeiro do Vale», continuou Toni, lançado nas memórias dos anos 60, enquanto entrávamos na ponte 25 de Abril.
À saída da ponte, Toni continuava a relembrar Jaime Graça. «Ele é muito subvalorizado quando se fala dos grandes jogadores portugueses das décadas de 60 e 70, por exemplo. O Jaime tinha tudo: inteligência, técnica, tática, compromisso e compreensão do jogo. Taticamente, então, era soberbo», analisou. «Grande, grande, grande», completou.
Toni entrou no Benfica no verão de 1968. «Quando cheguei, o meio-campo era formado pelo Jaime e pelo Coluna e eu fiquei em lista de espera. Porém, como as substituições começaram em 1968/1969, em 26 jornadas do campeonato ainda joguei em 22 [e na parte final, quase sempre a titular]. Depois, quando o Coluna saiu para o Lyon [1970/1971], comecei a jogar muito mais», explicou.
A meio da viagem para Setúbal, Toni recorda o dia em que conheceu Eusébio. «Vi-o a primeira vez num jogo da Taça, na Luz. Tínhamos eliminado o Vitória a duas mãos [1-0 em Setúbal e 2-1 em Coimbra] e fomos jogar com o Benfica. Ganhámos em casa por 2-0 e perdemos na Luz por 1-2. Foi nesse dia [18 de junho de 1967] que estive com o Eusébio em campo pela primeira vez», diz Toni, já perto de Setúbal.
Toni jogou no Benfica entre 1968/1969 e 1980/1981 e, em sete destas 13 épocas, teve a companhia do Pantera Negra. Relembra que ainda o veria jogar no Beira-Mar e nos Estados Unidos. «Já não tinha a explosão e a velocidade dos 20 ou mesmo 30 anos, mas ainda marcava muitos golos. Jogaria pelo Boston Minutemen, pelo Toronto Metros-Croacia e, mais tarde, pelo Las Vegas Quicksilvers e ainda pelo New Jersey Americans. E, em 1976, salvo erro, foi campeão da North American Soccer League pelo Toronto».
A viagem Lisboa-Setúbal termina às 12h50, quando chegamos ao local combinado para nos encontrarmos com António Vaz, que sofreu o último golo de Eusébio pelo Benfica: o restaurante ‘A Baliza’. «É pá, estás sempre igual», atira Vaz na direção de Toni.
Minutos depois, já sentados à mesa, a conversa entre ambos vai fluindo como nos tempos em que jogavam por Vitória e Benfica. «Já viste, Vaz», diz Toni, «foram descobrir que tu foste o último guarda-redes a sofrer um golo do Eusébio pelo Benfica e que eu fui quem fez o passe para esse golo». Vaz ‘pica’ Toni: «Sim, mas o Vitória ganhou por 2-1!». Toni cofia a cabeça e ri-se: «Ainda por cima perdemos, ora bolas».
O Vitória teve grandes equipas nos anos 60 e 70 e, nessa época de 1974/1975, tinha jogadores como Vaz, Rebelo, José Mendes, Carlos Cardoso, João Cardoso, Lino, Carriço, Matine, Octávio Machado, Vicente, Câmpora, José Maria, Torres ou Duda, íamos nós puxando da cábula, quando Vaz nos interrompeu: «… e o Jota-Jota, não se esqueça do Jacinto João». O antigo guarda-redes, agora com 79 anos, recua mais de 50 anos. «Em 1971 ou 1972 [1972, António], fomos segundos atrás do Benfica; era uma grande equipa», recorda com orgulho. Toni acrescenta: «Sim, sim, treinada pelo sôr Pedroto».
23 março 2025, 09:50
Antigo médio simula para A BOLA o cruzamento de março de 1975 e exclama: «Mesmo com pouca força, logo já tenho que fazer gelo no joelho...»