«Senti o orgulho do primeiro golo no novo Estádio da Luz»
Nuno Gomes foi o primeiro a festejar no novo Estádio da Luz, no jogo que o Benfica venceu o Nacional, de Montevideu, por 2-1

«Senti o orgulho do primeiro golo no novo Estádio da Luz»

NACIONAL25.10.202308:05

Entrevista a Nuno Gomes, o primeiro jogador a fazer levantar as bancadas do novo estádio, que celebra 20 anos nesta quarta-feira

Qual é a sensação de se terem passado já 20 anos desde a inauguração do Estádio da Luz?

— É uma sensação agridoce: por ter memórias bem vivas e positivas desse momento e por outro por já se terem passado 20 anos, o que quer dizer que já não caminho para novo [risos]. Mas parece que foi ontem porque as boas recordações ficam mais bem registadas, os maus momentos tenho tendência para esquecer rápido. 

Partilhou a bola de saída desse jogo com o Nacional, do Uruguai, com Eusébio. Ainda se recorda do que ele lhe disse naquele momento?

— Não me lembro do que me disse, mas tive a felicidade de ter partilhado com ele vários momentos desses, fosse na Eusébio Cup ou noutros jogos festivos. Isso para mim sempre foi um orgulho. Primeiro, porque aparecia sempre nas fotos com ele; segundo, porque estava ao lado do grande símbolo do Benfica. Ele sentia-se em casa, adorava aqueles momentos, adorava pisar o relvado. Felizmente sou do tempo do velho Estádio da Luz em que privámos muito com Eusébio, ele estava sempre nos treinos connosco, equipava-se ali e fazia umas corridinhas à volta do campo, sentia muitas saudades e queria muito estar sempre perto dos jogadores. No novo estádio isso já não acontecia porque não nos treinávamos ali. Mas, voltando a esse momento, foi algo espetacular. Ele dizia sempre: ‘Quem me dera estar a jogar agora’. Depois olhava para a relva, para as bancadas e afirmava: ‘Quem não souber jogar neste relvado tão bem tratado não sabe jogar em lado algum’.

Acredito que essa foto sua com Eusébio ocupe um lugar especial em sua casa…

— Tenho várias fotos com ele, sim. Esses momentos de que falei anteriormente deixavam-me muito orgulhoso, foi muito bom poder ouvir os conselhos dele em pleno jogo. 

Mesmo que estejamos a fugir do assunto principal, diga-me, já agora, que conselhos lhe deu Eusébio durante os jogos?

— Ele estava sempre junto ao banco, com a toalha enrolada na mão, no velho estádio. Quando havia paragens para assistência a jogadores, por exemplo, dava instruções à equipa, principalmente aos avançados. Ainda sou do tempo em que os pontas de lança não iam defender nas bolas paradas. Quando os primeiros treinadores começaram a fazer isso ele virava-se para mim e dizia: ‘Fica na frente para o contra-ataque [risos]. Eram outros tempos.

Voltando ao jogo de inauguração da Luz: fez alguma aposta com algum colega de que o primeiro golo seria seu?

— Não. Nesse jogo eu estava duplamente feliz: primeiro, porque ia participar na estreia do estádio; segundo, porque estava a regressar de lesão e era o meu primeiro jogo. Na época anterior, quando percebemos que já não tínhamos hipótese de nada ganhar, fui operado ao tornozelo e só voltei em outubro. Estava muito feliz por participar naquele encontro e pisar a relva pela primeira vez em ambiente de jogo, mas estava igualmente ansioso para perceber se aguentava os 90 minutos. Foi um dia cheio de emoções, não fiz qualquer aposta, mas estávamos em estágio, íamos seguindo a transmissão televisiva e quando os jornalistas perguntavam aos adeptos sobre quem gostavam de ver marcar o primeiro golo muitos deles disseram o meu nome. Sentia orgulho, posso ter essa vaidade.

 Ainda se lembra bem do golo, de toda a jogada?

— Lembro-me, sim. Foi uma jogada em que eu nem era para participar, mas a bola ressaltou na área para mim, eu estava vivo e atento e percebi que tinha hipótese de rematar. Sokota tentou dominar, mas a bola veio para mim, assim meio perdida, a chamar-me, eu tinha um defesa nas costas e atirei rasteirinho. O guarda-redes provavelmente não estava à espera que eu rematasse de primeira.

Do que se recorda da preparação do jogo? Os jogadores tinham a noção de que era um dia muito importante?

— Tínhamos noção de que era um marco na história do clube. Naquele tempo vivemos um misto de emoções: dissemos adeus ao antigo estádio, depois andámos um tempo com a casa às costas treinando no Estádio Nacional, no Estádio Universitário, em Massamá ou no Monte da Galega. Depois passámos a usar o balneário do novo estádio, mas não podíamos treinar lá, depois começou a crescer aquela ansiedade de ver como seria o estádio cheio de gente… Aquela noite foi totalmente diferente de tudo o que conhecíamos, ainda me lembro de ouvir no balneário parte do discurso de Manuel Vilarinho, do Fialho Gouveia, que foi muito emotivo e bonito. Lembro-me muito bem disso tudo, foi muito emocionante entrar, ver as bancadas cheias e assistir à emoção das pessoas pela beleza do estádio.

Faz parte de uma geração que jogou nos dois estádios. Que maior diferença sentiu de um para o outro?

— O estádio antigo era imponente, quando estava cheio era o inferno da Luz, embora este também seja de maneira diferente. O outro criava talvez mais respeito ao adversário. Não há ninguém que não tenha saudades do velho estádio. Na nossa perspetiva, no relvado, o antigo parecia maior no comprimento e no espaço. Mas era uma ilusão de ótica porque as medidas do campo eram as mesmas. No jogo em si, não senti grandes diferenças entre um e outro. 

Que pormenor mais gosta deste estádio?

— O facto de ser mais moderno. No outro havia a sensação de grandeza, mas não garantia o conforto que as pessoas têm hoje. Antes víamos pessoas de pé, é tudo diferente… 

… até o dia a dia dos jogadores, que no velho estádio treinavam-se no estádio e tinham contacto diário com os adeptos que ali se deslocavam. 

 — Sim, eram outros tempos, tínhamos o campo de treinos ao lado do estádio, quando não nos treinávamos mesmo no principal. Agora há uma distância maior entre equipa e adeptos. Tudo evoluiu, até a própria forma de ver o futebol, com as novas infraestruturas que estão ao dispor de todos.

Qual foi o seu melhor golo neste estádio?

— O segundo golo que marquei no jogo de estreia. Ou um de cabeça frente ao Nápoles, no primeiro jogo transmitido pela Benfica TV. 

Qual foi o golo que queria ter marcado e não conseguiu?

— Todos os que não entraram [risos]

Qual foi o melhor golo que viu enquanto espectador?

— Qualquer um de João Félix ou de Jonas. Ou o primeiro golo de Renato Sanches pelo Benfica.

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