Rui Costa no Benfica-Estoril
Rui Costa no Benfica-Estoril
Foto: IMAGO

Benfica: quando já só o futebol dá alguma esperança

OPINIÃO10:00

À Luz voltaram as nuvens carregadas de incerteza e os dias em que o clube é e continuará a ser falado pelas piores razões. Bruno Lage tem de resistir até a isso e alcançar o 'milagre'

Se há algo que o Benfica não precisava era de mais nuvens negras. O efeito Bruno Lage ainda se fazia sentir, sobretudo depois do regresso das grandes noites europeias à Luz com a subjugação do Atlético Madrid, e deixava cada vez maiores expetativas de retoma. Embora sem sinais de fragilização na vantagem e consistência dos rivais, a estabilidade era o mínimo dos mínimos que o técnico poderia pedir para atacar o que falta da temporada, desde logo um segundo ciclo que promete bastante elevado grau de dificuldade, e assim tentar assinar novo milagre. No entanto, isso talvez seja pedir demais. Não o milagre, mas a acalmia para trabalhar com serenidade.

Não sei se as ações dos acusados estão feridas ou não de ilegalidade e isso caberá aos tribunais decidir, penalizando quem tem de penalizar e/ou ilibando quem têm de ilibar, mas o nome do Benfica não deixará de andar novamente durante demasiado tempo e pelas piores razões nas bocas do mundo– como já aconteceu num passado recente e com óbvio prejuízo para os encarnados, na perspetiva do rendimento em campo –, o que irá mais uma vez criar um ambiente negativo em torno da equipa. Não tenho dúvidas de que os adeptos o esquecerão e se prepararam para, com entusiasmo, tentar de tudo para que se dissipe desde as bancadas, porém a boa-vontade poderá não ser suficiente.

No que diz respeito ao tema, digo o que sempre disse em relação a estes atores, principais e secundários, e a outros, de outras companhias, no passado: sempre houve proximidade a mais em vários momentos da nossa história (e, sim, não só da nossa) entre os diversos agentes, ou seja, dirigentes e quem detém o poder ou quem não o detém todavia pode ser influenciado. E isso, seja ilegal ou não, ou esteja apenas no limite do ético, colar-se-á à pele dos intervenientes durante tempo a mais. No caso, vai entranhar-se nas paredes do próprio clube. Tal como o Apito Dourado está longe de ter ficado bem resolvido na consciência coletiva do futebol português, também toupeiras e emails mancham o nosso desporto. E, mais uma vez, reforço: para isso não é preciso haver crimes e culpados, basta que se tente manipular algo a que não se tem direito. Isso diz muito da cultura desportiva que temos. Ou, melhor, que não temos.

Encontrar o melhor Pavlidis no Benfica

É com este ambiente difícil à sua volta que Bruno Lage vai ter de consolidar o que andou a trabalhar com os que ficaram, absorvendo, obviamente, o moral acumulado por alguns dos que viajaram, nomeadamente Pavlidis, que chegará naturalmente muito mais confiante do que quando partiu. Não é que a sua qualidade estivesse em algum momento em causa ou que não estivesse a contribuir de outras formas, todavia o que conseguiu sobretudo diante da Inglaterra em Wembley reforça o status quo no regresso a Lisboa. Talvez um dos objetivos mais imediatos do treinador seja ter este Pavlidis ao seu serviço, de vermelho e branco vestido, sem apagar os restantes elementos à volta. Um caminho que passará sempre pelo processo coletivo.

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Na verdade, a ligação ao goleador tem sido um dos problemas dos dois processos que o tiveram na Luz, o de Schmidt e, agora, o de Lage. O grego está sempre demasiado apertado e isolado na área, tanto que precisa escapar várias vezes para conseguir respirar, e nem a ambição de Akturkoglu ao querer estar também em zonas de finalização tem conseguido libertá-lo na totalidade. O ataque do Benfica, e parece paradoxal dizê-lo, carece de unidades ofensivas. Melhor, necessita de profundidade nos seus elementos mais adiantados para abrir espaços (e oportunidades) para o seu ponta de lança.

Ajustar o momento de pressão

Claro que não será só por aqui. Os encarnados continuam com dificuldades na transição defensiva e o puzzle parece ainda sem solução visível. E não se tratará de nomes, uma vez que já inclui a ética de trabalho de Akturkoglu, a capacidade mais pressionante de Pavlidis e ainda Aursnes na distribuição de tarefas e espaços a meio-campo, além de o norueguês ficar ainda atento ao desligar de Di María. Não há nesse aspeto mais a fazer. Trata-se talvez de acertar os tempos, os gatilhos, a proximidade entre blocos e até, talvez, o local a partir da qual a equipa deve esperar o rival e saber de um momento para o outro mudar de estratégia. Até para isso terá servido o Atlético Madrid, embora haja muitos poucos da sua igualha na liga portuguesa e que, naturalmente, obriguem as águias a recuar.

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Dar espaço na equipa a Tomás Araújo

Há ainda dúvidas atrás. Não acho, no entanto, que Roberto Martínez tenha complicado a vida a Bruno Lage. Ele próprio já terá pensado inúmeras vezes em quem deve jogar a central. Aqui também a tomada de decisão não é fácil: existe o critério de Tomás Araújo no passe e a sua velocidade para controlar a profundidade, há a maior fisicalidade de um António Silva um pouco mais confiante e que lhe garante talvez maior eficácia nos duelos (e, não menos importante, ser um ativo que não deve ser desvalorizado tendo em conta a política desportiva) e ainda a experiência e a irredutibilidade de Otamendi, embora nem sempre com a dosagem certa. Lage parece querer levar mais longe do que o seu antecessor a aposta no menos habitual dos três e isso revela alguma coragem, embora para mim não seja claro há muito que António Silva deva ser o preterido. Não deixa é de ser verdade que se trata de boa dor de cabeça.

A maior conquista até agora do técnico, além da óbvia atenção dada ao corredor interior direito, onde pisa Di María, e que prova o cuidado que teve com um problema mais do que evidente, há o renascimento de um Carreras que não deixou de um momento para o outro de necessitar de trabalho – e talvez aí Lage seja muito mais a pessoa certa do que Schmidt –, mas que parece sobretudo outro jogador.

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Primeiro com os resultados e depois com as exibições, também as bancadas voltaram a sorrir e este segundo casamento parecia tão perfeito e cheio de promessas eternas quanto o futebol pode alguma vez permitir. No entanto, é impossível isolar os bons sinais do que se passa à volta. Onde antes havia falta de liderança ou liderança fragilizada está também agora a negridão da incerteza à volta.