Ver para crer como São Tomé

OPINIÃO09.08.201804:00

As eleições no Sporting continuam a concitar uma mais do que justificada atenção. Na caminhada que estamos a empreender em direção a 8 de setembro, muitos são os aspetos jurídicos que têm sido trazidos à tona, alimentando públicas controvérsias sobre o processo eleitoral aqui tomado em sentido lato. As eleições fazem-se para escolhermos equipas em que confiemos, gente honesta e competente, que seja capaz de implementar bons programas, os quais, por seu turno, deverão corresponder a soluções adequadas para o clube. Eis o essencial. Mas os tais assuntos de índole mais jurídica, sendo periféricos, não deixam de ser muitíssimo relevantes, sobretudo numa fase em que leis, estatutos e regulamentos têm tido uma dose avantajada de importância no quotidiano dialético, correspondendo a uma presença massiva e inaudita no nosso quotidiano clubístico. O peso específico que ocupam nos debates e o espaço privilegiado que patenteiam no aquecer dos motores, momento prévio à verdadeira campanha eleitoral, disso dão testemunho. Os próprios tribunais têm sido convocados e intervir sobretudo no âmbito da justiça cautelar. Permitam-me, então, que levado por esta onda aborde aqui quatro fragmentos desta complexa realidade, a partir dos elementos disponíveis para consulta e que, tal como São Tomé, decidi ir ver.

Até quando

se podem entregar as candidaturas? Ontem, dia 8, ou hoje, dia 9?

Tenho lido e ouvido dizer que o prazo destinado à apresentação das listas terminaria no dia 8 (ontem). Salvo melhor opinião não me parece que seja o caso. Com efeito, de acordo com o que se dispõe nos nossos estatutos, mais concretamente no n.º 2 do artigo 48, «as candidaturas são apresentadas até ao trigésimo dia que preceda a data marcada para a eleição ou até o primeiro dia útil seguinte a esse, se o trigésimo dia for sábado, domingo ou feriado.» Norma semelhante se encontra no artigo 31, n.º 2, do Regulamento da Mesa da Assembleia Geral. Havendo divergência os Estatutos prevaleceriam sobre o Regulamento. Mas aqui há convergência. Ora, se contarmos, em sentido de marcha à ré, os tais trinta dias, a partir de 8 de setembro, concluiremos que o termo do prazo destinado à entrega das candidaturas terminará hoje, quinta-feira, dia 9.

O regulamento disciplinar

está em vigor?

Outra dúvida que se tem colocado, consiste em saber se o celebérrimo Regulamento Disciplinar, aprovado na assembleia-geral de 17 de fevereiro de 2018, estará ou não em vigor. Já várias vezes me pronunciei sobre o contexto da aprovação do documento e as intenções que estiveram na base da apresentação da peça a sufrágio. Mas agora que o documento foi aprovado e, o que não é despiciendo, por rechonchuda maioria, não percebo porque se questiona a respetiva vigência. Apesar de estar habi- tualmente atento ao que se passa no planeta Sporting, nunca ouvi um argumento capaz de sustentar a tese, segundo a qual o dito Regulamento não estaria, afinal, vigente e plenamente aplicável. É que, no seu artigo 26, pode ler-se com clareza: O presente Regulamento Disciplinar, aprovado na Assembleia-Geral de 17 de fevereiro de 2018, entra imediatamente em vigor. Não sobra espaço para grandes dúvidas, isto sempre mantendo o devido respeito por opinião diferente. 

Quanto à questão da lista ligada ao

ex-presidente

do conselho diretivo:

O sentido

da providência cautelar

No que toca a este particular episódio, também muito se tem dito e escrito, mas nem sempre com o necessário rigor. No meio da turbulência vivida em torno do caso chegou mesmo a ser anunciada uma espécie de candidatura Matrioska, visando ultrapassar constrangimentos de elegibilidade. Mas esse é um aspeto mais de mérito, salvo seja, e de estratégia, de aqui não quero curar. Regresso ao prisma de ordem legal em que a minha análise se situa. Conhece-se o problema: o Presidente da Mesa da Assembleia-Geral ter-se-á recusado a aceitar a entrega de uma lista, isto é, a recebê-la, com vista à verificação da sua aceitabilidade. A isso reagiram os afetados. A única providência cautelar divulgada sobre a matéria, corresponde a uma decisão proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa no passado dia 3 de agosto, que decidiu, basicamente o seguinte: para que uma candidatura seja apreciada, tem de ser apresentada. Por isso ao ser apresentada, deve ser recebida. Isto porque só após ser recebida poderá ser apreciada. A decisão parece-me corretíssima. Os serviços competentes deverão receber a candidatura e, de seguida, analisar a sua conformidade com os estatutos; feita essa análise decidirão sobre a respetiva admissibilidade. Não pode, digamos assim, haver um indeferimento liminar concretizado no hall de entrada das instalações. Foi o que o tribunal disse e é o que, seguramente, será seguido. Não foi, todavia, de modo nenhum, imposto a quem deve aferir da regularidade das candidaturas, que aceitasse, para participar no ato eleitoral, esta ou aquela lista. A coisa é clara e inequívoca no seu estado atual.

Uma nota sobre o teor da convocatória da assembleia-geral eleitoral

As candidaturas devem ser propostas por sócios com capacidade eleitoral ativa, que representem, pelo menos, mil votos. Assim se determina nos Estatutos e também no Regulamento da Assembleia-Geral. Ora, do texto da convocatória desta Assembleia-Geral Eleitoral consta o seguinte: Cada sócio com capacidade eleitoral ativa apenas pode subscrever uma proposta de candidatura. Não concordo com esta opção. Sem embargo de melhor observação não encontro qualquer norma, legal ou regulamentar, na qual uma tal limitação possa ter sustento. Ademais, quando pretendeu reger sobre uma questão algo similar, o Regulamento soube ser expresso, pois, no seu artigo 32, n. 4, determina, de forma expressa, que nenhum sócio pode candidatar-se por mais do que uma lista e para mais do que um cargo eletivo, salvo nos casos previstos nos Estatutos do Sporting Clube de Portugal ou no presente Regulamento. Não havendo uma norma expressa, impondo que cada sócio com capacidade eleitoral ativa apenas possa subscrever uma candidatura, parece-me excessivo, digamos (só) assim, que se decida introduzir esta restrição. Uma vez mais não discutirei, aqui e agora, se deveria ser assim, ou deveria ser assado, o que teria mais ou menos lógica ou maior ou menor sustentação substantiva. O que digo é algo diverso. Na falta de disposição expressa, não se deveria ter cingido o direito de subscrição do sócio a um limite criado por via doutrinal. Espero, sinceramente, que no momento da verificação e conferência dos subscritores, esta opção, que tenho por errada, não cause entropias ou constrangimentos. Finalmente, após as verificações a efetuar e as correções a que possa haver lugar, para o que existem dois prazos sucessivos de 48 horas, conheceremos o naipe de candidatos.