Roger Schmidt, o procrastinador
Roger Schmidt

Roger Schmidt, o procrastinador

OPINIÃO19.08.202410:20

Viktor Gyokeres, Vítor Bruno, Roger Schmidt e José Mourinho são, presumo, adeptos da chamada lei universal da atração. Atraem aquilo em que pensam, para o bem e para o mal...

Vi recentemente umas declarações antigas de Novak Djokovic, tenista que parece estar a desfalecer em quase todos os seus últimos jogos e que ressuscita sempre, também quase por milagre, nas quais o sérvio dizia acreditar na chamada ‘lei universal da atração’. Nela se afirma, grosso modo, que a força dos nossos pensamentos atrai determinado tipo de coisas para as nossas vidas, sejam elas positivas ou negativas. Sinto-me tentado a acreditar nesta suposta lei quando vejo Gyokeres a jogar. O Viktor, como diz Rúben Amorim (um dia, ainda perceberei a razão pela qual os treinadores se referem aos seus jogadores pelos nomes próprios: Viktor, Nico, Iván, Cristiano, Lionel, etc.), só pensa em golo. Quando se levanta de manhã, antes de arrancar para Alcochete, a primeira imagem que o cérebro do sueco processará deve ser bola. Bola e baliza. Bola, baliza e redes. Bola, baliza, redes e remate. Bola, baliza, redes, remates e máscaras. Daí atrair tanto golos.

Outro Viktor, o Vítor Bruno, deve acordar a pensar, não apenas em treinos, pinos, sistemas, subsistemas, transições e basculações, mas também na forma ideal de comunicar. Fazendo fé na tal ‘lei universal da atração’, o treinador do FC Porto deve passar parte substancial dos seus dias a pensar em palavras e ideias. Depois, quando chega às conferências de imprensa, consegue que as pessoas, não só percebam o que diz, como quase sempre concordem com o que diz e com a análise que faz aos jogos do FC Porto. Presumo que não seja fácil estar hora a meia (às vezes mais) com o coração a bater a 150 pulsações por minuto (às vezes mais) e, 10 ou 15 minutos depois, estar em frente a jornalistas que podem fazer as perguntas mais mirabolantes. Vítor Bruno tem estado bem nas conferências de imprensa, talvez por acreditar na citada lei e, assim, sentir-se confortável a falar do que se passou o dia a pensar. Ou então é genético.

Roger Schmidt, por seu turno, deve concentrar grande parte dos seus pensamentos em procrastinar. Procrastinar, como se sabe, é a arte de adiar, atrasar, demorar, retardar. Ou, no fundo, não fazer hoje aquilo que podemos fazer amanhã. É uma arte que muito prezo, embora não aprecie a procrastinação do alemão na hora da substituição (sim, são ãos a mais, mas pronto). Há coisas que entram pelos olhos dentro, mas Schmidt adia o máximo possível mexer no que não está bem. Pode ser convicção, eu acho que é a arte de procrastinar elevada ao máximo nível. Ou, no fundo, não substituir aos 45’ o que podes substituir aos 65’. Como frente ao Casa Pia. Procrastinador ou não, o resultado acabou por dar razão ao treinador do Benfica. Trocou três jogadores aos 65’ e, aos 70’, Pavlidis marcou. E Tiago Gouveia. E Kokçu.

Anti-procrastinador por natureza é José Mourinho. Não deixa para amanhã o que pode fazer hoje, nem sequer deixa para o final da tarde aquilo que pode fazer a meio dela. Fenerbahçe-Lille (1-1): «Seria melhor se não dissesse nada sobre o penálti. Só o árbitro sabe por que o 1-1 foi penálti». Fenerbahçe-Goztepe (2-2): «Tenho que me adaptar ao futebol turco. Os meus jogadores também precisam de começar a desperdiçar tempo e atirarem-se para o chão. Eles têm de fingir lesões, tal como faz toda a gente. Eu não sou um mágico, sou apenas experiente». É também a ‘lei universal da atração’ no seu esplendor. Não é preciso que Mourinho procure a polémica, ela vai ter com ele. Acho até que o maior treinador português de todos os tempos, o anti-procrastinador por excelência, é o criador da referida lei da atração. Mourinho atrai tudo em que pensa: vitórias, troféus, polémicas. Ou, sejamos sinceros, atraía até há alguns anos...