O clube da minha terra vai aos Jogos Olímpicos: de não ter teto ao topo do mundo
Filipa Martins (Estela Silva/Lusa)

Paris 2024 O clube da minha terra vai aos Jogos Olímpicos: de não ter teto ao topo do mundo

JOGOS OLÍMPICOS31.07.202408:00

A BOLA foi em busca dos emblemas portugueses que poucos conhecem, mas que estão bem representados em Paris

Há uma Sociedade Filarmónica mais antiga que os Jogos Olímpicos. Um clube com 20 anos que nem tinha tecto quando nasceu. E até o clube de uma aldeia.

Paris recebe o evento desportivo mais importante do mundo. Lá vão estar os mais rápidos, os mais fortes e os que saltam mais alto. Mas também é lugar para os pequenos que se agigantam.

A BOLA foi conhecer alguns dos clubes que, apesar do nome poder dizer pouco ao grande público, conseguiram ter atletas nos Jogos Olímpicos.

Acro Clube da Maia surgiu há menos de 20 anos, porque um grupo de ginastas ficou sem clube; hoje é referência na ginástica nacional e vai estrear-se em Jogos Olímpicos

Em 2004, após a participarem no Campeonato do Mundo de ginástica acrobática, de onde trouxeram bons resultados, os ginastas do Ginásio Clube da Maia depararam-se com uma decisão inesperada: o clube tinha decidido terminar com a modalidade.

Mas em vez de se lamentarem, a decisão dos atletas foi imediata: iam criar um clube de raiz.

Foi assim que, em dezembro, nasceu o Acro Clube da Maia, que nos últimos 20 anos se consolidou definitivamente como referência da ginástica nacional.

Inicialmente, apenas dedicada à acrobática, o clube foi expandindo a atividade e atualmente é o único do país com títulos mundiais na ginástica acrobática e participações olímpicas na artística, tendo ainda atletas de trampolins, num total de 400 atletas divididos pelas três categorias.

Mesmo que durante os primeiros anos, os atletas tenham sido obrigados a andar com a casa às costas.

«Inicialmente, os ginásios que utilizávamos eram nas escolas do concelho da Maia. Durante esse tempo, o clube treinava em espaços alugados porque as instalações do clube só surgem em 2010», contextualiza Lourenço França, treinador e diretor técnico do Acro.

Atualmente, a realidade é diferente e o clube tem um espaço com 3000 metros quadrados, ainda que a ginástica artística continue a funcionar em instalações da autarquia.

E antes de completar 20 anos de vida, o Acro tem uma atleta, Filipa Martins, nos Jogos Olímpicos. Ainda que Lourenço França garanta que esse era um sonho longe da imaginação de todos no momento da fundação.

«A melhor forma de fazer as coisas é ir crescendo consoante os resultados. Ter as melhores condições e não ter ginastas não vale de nada porque os recursos humanos são sempre a maior mais-valia de um clube», defende.

«O Acro foi feito de raiz sem pensar num objetivo como os Jogos Olímpicos. A presença é uma consequência da exigência do trabalho diário que todos impomos», acrescenta.

A Maia prepara-se então para ter, em Paris, uma ginasta que já marcou presença em Tóquio 2020, mas em representação do Sport Clube do Porto. E Lourenço França garante que será um momento especial.

«Há uns anos ninguém sonhava que na Maia poderia haver uma ginasta nos Jogos Olímpicos. Por isso, é um sentimento de enorme felicidade e orgulho. Porque significa atingir o topo na ginástica artística. Não há nada maior do que os Jogos Olímpicos, independentemente do resultado. Basta dizer que em 10 milhões de portugueses, há uma ginasta olímpica. Não há duas: há uma e é a Filipa, do Acro Clube da Maia», orgulha-se.

Mensalidade dos atletas é a maior fonte de receita

Apesar de os resultados colocarem os maiatos constantemente no centro dos holofotes no que diz respeito à ginástica, isso não se traduz em facilidades. Porque os apoios, para além do autárquico, são escassos.

O crescimento do clube fez com que sejam cerca de 30 os treinadores que trabalham atualmente na estrutura que sobrevive, sobretudo, graças… aos atletas.

«A maior fatia da receita provém dos atletas que pagam a quota de sócio e a mensalidade. Além disso, conseguimos angariar fundos através das competições e eventos que organizamos», contextualiza Lourenço França, revelando que o clube tem cerca de 400 sócios, sobretudo ginastas.

Filipa Martins (Estela Silva/Lusa)

O sucesso sai, portanto, do suor de todos aqueles que representam o clube e o responsável diz sentir que, também fruto da juventude, têm de trabalhar a dobrar.

«Sentimos que temos de trabalhar mais do que os outros. Historicamente, somos um clube muito jovem e só os anos trazem maturidade e estrutura», nota Lourenço França, que acredita ter atletas a crescer com potencial para voltar a marcar presença em olimpíadas, mas deixa um alerta.

«Sem dúvida que temos ginastas que podem vir a marcar presença em grandes competições. Somos um viveiro de bons atletas, que serão olímpicos se quiserem trabalhar para isso. Porque ninguém nasce olímpico: têm de se fazer. E os resultados na ginástica não são para amanhã, demoram muito tempo a surgir», finaliza.