Casa-Pia-Benfica, 3-1 Gansos foram a melhor equipa, Benfica apenas uma caricatura (crónica)
Nove pontos perdidos nos últimos quatro jogos comprometem candidatura ao título dos encarnados, que em Rio Maior assinaram a pior exibição da época...
Tivessem os jogos de futebol 25 minutos apenas, e o Benfica teria saído da morada emprestada ao Casa Pia, onde atuou com uma plateia que em 95 por cento lhe era favorável, com uma vitória justa e confortável por 1-0. Durante 27 por cento da partida, a equipa de Bruno Lage marcou um golo, conseguiu mais três remates enquadrados, fez a bola embater no travessão da baliza de Patrick Sequeira, e teve uma posse de bola de 71 por cento.
Depois, nos restantes 65 minutos, a produção dos encarnados foi baixando, os erros acumularam-se, a desorganização imperou, e o Casa Pia não só não deixou a saída de bola dos encarnados funcionar, como empurrou o Benfica para um jogo sem imaginação, feito de cruzamentos primários, e ainda aproveitou os espaços para se estender em ataques rápidos que, à medida que os minutos passavam, levavam a turma da Luz de mal a pior.
Seria injusto se, ao mesmo tempo que fica evidenciada a «falta de comparência»em Rio Maior do Benfica-candidato-ao título, não se louvasse a organização dos gansos, a personalidade com que trocaram a bola, aproveitando os buracos da equipa adversária, incapaz de ser defensivamente competente, essencialmente porque, nesse capítulo, muito cedo saiu de cena Di María, Barreiro e Kokçu perderam posição, e Florentino não teve capacidade para por ordem na casa; ao mesmo nível, a raiar a indigência esteve a saída de bola dos encarnados, que serviu sobretudo para colocar a baliza de Trubin em sobressalto constante (a forma como a pressão alta do Casa Pia perturbava o Benfica dava para uma tese de doutoramento em futebol, com ênfase na prevalência do coletivo sobre o individual).
Foi assim, após um erro garrafal de António Silva que os gansos empataram, e foi assim que a maior parte das iniciativas encarnadas não passaram da intenção. Ao intervalo, o prejuízo benfiquista só não era maior porque Vasco Santos reverteu um penálti assinalado por António Nobre, que passou a livre direto.
Benfica de mal a pior
Depois de 20 minutos penosos, pensou-se que o intervalo ia ser bom conselheiro para a equipa de Bruno Lage, que procederia às mudanças individuais e coletivas que se impunham. Não foi isso, porém, que sucedeu, e perante um Casa Pia sempre muito bem montado num 3x4x3 com setores juntos e muita capacidade para ter bola e olhos para a baliza contrária, o Benfica passou de mal a pior, limitou-se a um perigo pífio junto da baliza casapiana, fruto de um futebol telegrafado, onde era evidente o desgaste de Angel Di María (só foi substituído aos 81 minutos, quando, há muito, muito tempo, já tinha desaparecido do jogo) e as dúvidas que assaltavam os jogadores do Benfica passaram a pânico quando, após alguns avisos, o Casa Pia tornou uma ação de contra-ataque no golo da vantagem, aos 60 minutos.
Foi preciso esperar mais nove minutos para que Lage desfizesse um 4x1x4x1 onde Florentino era o trinco, Kokçu o playmaker e Barreiro o homem de chegada à área, fórmula que tinha funcionado bem contra o Famalicão, graças a uma dinâmica completamente diferente e a um sentido coletivo que esteve ausente em Rio Maior. Entraram então (69) Schjelderup e Pavlidis, o primeiro para a esquerda e o segundo para junto de Arthur Cabral, mas com este 4x4x2 que facilmente se transformava num 4x2x4 que partia o jogo encarnado, a mediocridade manteve-se, e até passou a haver mais espaço para o Casa Pia ter bola.
Só aos 81 minutos Bruno Lage tentou equilibrar a equipa (entradas de Manu Silva, Amdouni e Aursnes), mas o mal estava feito e seria irreversível, tendo o golo do 3-1, por Livolant, servido de cereja no topo do bolo casapiano, perante um Benfica de cabeça baixa.
Que fique bem realçado que o Casa Pia não ganhou ao Benfica graças a um contra-ataque fortuito, depois de ter colocado um autocarro em frente à baliza. O triunfo dos gansos deveu-se ao facto de, sem terem melhores jogadores que o adversário, terem sido melhor equipa, mais lúcida, mais esclarecida, mais personalizada e mais organizada.
É um caso de estudo a incapacidade do Benfica colocar qualidade nas saídas de bola (e estando as coisas a correr mal, insistir na fórmula guardioliana), e dá também que pensar a necessidade (que tramou Schmidt) em dar muitos minutos a Di María, hipotecando o processo defensivo, quando o génio argentino está numa fase da carreira em que deve ser aproveitado em qualidade e não em quantidade.
Na quarta-feira, em Turim, o Benfica saberá se continua na Champions; quanto à Liga, quem perde nove pontos em doze possíveis, arrisca-se a passar ao lado de ser feliz e fica dependente, à falta de méritos próprios, de eventuais deficiências da concorrência.
Em Rio Maior viu-se o pior Benfica da época. Serão tiradas ilações perante este facto, perturbador sem dúvida para a nação encarnada? É que mais do que terem perdido, pior ainda foi a forma como os encarnados perderam...