Portugal: é preciso coragem para ver além de um penálti e do maior da história
Há de haver um dia em que a Seleção joga como em 2000 e ganha como em 2016
João Félix falhou um penálti e Portugal saiu do Euro 2024. Quis o futebol que fosse assim. Que um jogador como Félix, que vive entre o que o futebol te dá e o que o futebol te exige, talento e compromisso, fosse o português determinante na noite de Hamburgo. Sobre Félix há de escrever-se muito neste verão e muito neste fim de semana. Mas é preciso ver além do Viriato de Ouro, galardão que Viseu lhe deu aquando da mudança milionária para o At. Madrid. É esse além, mais do que o próprio João, sobre o qual é necessário refletir, até porque o penálti de Félix caiu, como nódoa no melhor pano, no melhor Portugal.
Há quem só consiga ver virtudes e há quem consiga ver apenas defeitos. Mas a crítica não pode ser tão ‘cega’. Já o escrevi e repito. Portugal é uma potência mundial em seleções. O respeito que a França teve com a seleção foi um sinal claro. A sobranceria futebolística francesa acabou naquele 2016, em que Portugal igualou uma vantagem psicológica. Em Hamburgo, foram tantos os franceses a ter fé nas penalidades como os portugueses. O que nos leva às questões restantes.
Na primeira fase do jogo, vi um Portugal com Bruno Fernandes, mas sobretudo Bernardo Silva, mais influentes. Esses foram sinais de que Roberto Martínez também viu o que de mal fora feito com a Eslovénia. Podia falar também de Pepe, Nuno Mendes, João Palhinha, Vitinha – o futuro e presente da seleção está mesmo aqui – e do bom que fizeram. E Ronaldo? A pergunta que todos se fazem, o homem em quem todos acreditavam – e isso é culpa exclusiva dele, pelos seus feitos – mas que redunda num número: seis horas, zero golos de Portugal.
Ronaldo fez o seu melhor jogo do Euro com a França, ainda que tenha sido o elemento mais discreto. O capitão soube jogar com os colegas, foi mais altruísta que nos oitavos, procurou apoiar, mas vítima ou não, acabou por não se destacar. Repito agora: seis horas de Portugal sem marcar um golo. Quem viveu os anos 90 da seleção não se surpreenderia. Mas Cristiano Ronaldo foi o mais prolífico dos avançados do século XXI, pelo que ter tantas horas de futebol sem golo e, incrivelmente, sem um golo de Cristiano deve fazer toda a gente refletir: sobre a seleção, sobre o espaço de Cristiano Ronaldo, sobre as opções de Martínez. Para mim? Simples, à partida para este Europeu. Ronaldo tinha, obrigatoriamente, de estar. Não tinha, obrigatoriamente, de ser titular ou jogar 90 minutos.
Agora que acabou o Euro 2024 para Portugal, é preciso, então, ver para lá do penálti de Félix. Sobre a seleção, cabe-me dizer isto: há muito, muito tempo que não via tanto espírito de adepto em torno da equipa. É preciso manter o cântico, é preciso manter o cortejo, é preciso que Bernardo Silva e Bruno Fernandes se mantenham ‘jovens’. A Argentina também perdeu antes de ganhar, mas foi sempre cantando. Chamem-me romântico, otimista, mas eu até acho que se está a construir qualquer coisa. É preciso é ter coragem para ver para lá de um penálti, ou da maior figura da nossa história. Há de haver um dia em que Portugal joga como em 2000 e vence como em 2016.