Opinião As Mulheres a fazerem história

OPINIÃO04.12.202412:55

A Seleção Nacional de futebol feminino marca presença no terceiro Europeu consecutivo. Até 2017 nunca tinha estado numa fase final de grandes competições. Poucas coisas na vida surgem por acaso

A Seleção Nacional de futebol feminino escreveu na terça-feira uma das mais bonitas páginas da sua história. A luta começou há muitos, muitos anos, e acaba de ser plasmada num livro que conta, justamente, todo o percurso da equipa nacional até este ponto, aquele em que se atingem fases finais de grandes competições, sejam europeias ou mundiais. Até 2017, Portugal nunca tinha estado numa. Daí para cá vai no terceiro Europeu consecutivo e esteve num Mundial, falhando de permeio a presença na fase final de 2019. A Mary Caiado, autora do tal livro — História do Futebol Feminino, da Cultura Editora e parte integrante da coleção Livros FPF — deve estar muito contente pelo feito das Navegadoras e ao mesmo a tempo a pensar que vai ter mais trabalho, no futuro, se quiser continuar a escrever esta história.

«Navegar é preciso, viver não é preciso.» Na primeira página de hoje, A BOLA homenageia as Navegadoras pelo feito com esta frase. Terá sido proferida originalmente por um general romano, foi tomada por Fernando Pessoa para enriquecer ainda mais a sua poesia, Caetano Veloso pegou nela para escrever Os Argonautas, a pedido da irmã Maria Bethânia, que a cantou pela primeira vez. Ao apropriar-se da frase, o poeta, autor, compositor, cantor, ativista, ator, pensador, político — génio pode ser um bom resumo — deu à canção um título que remete para a mitologia grega.

Roma, Grécia, Brasil, Portugal. Há nesta frase — «Navegar é preciso, viver não é preciso» —, conjugada com a felicidade de quem escolheu o nome de guerra desta Seleção feminina, um sentido quase épico da procura de um bem maior e comum.

É isso que a Seleção feminina de futebol tem feito nos últimos largos anos e, fruto de uma aposta pensada e estruturada, consegue na última década colher frutos que jamais terão sido imaginados, a não ser pelos líricos e líricas que na década de 80 do século 20 acreditavam que um dia o futebol poderia, também, ser das Mulheres.

Na terça-feira, dias depois de quase ter lotado o Estádio do Dragão na primeira mão do play-off, a equipa de Francisco Neto foi à Chéquia vencer e carimbar a presença no Europeu. Não se chega de barco de Portugal à Suíça, o que podia estragar a metáfora das Navegadoras. Mas não: é mesmo «por mares nunca dantes navegados» que se está a escrever uma nova história. A Mary Caiado vai ter muito trabalho nos próximos anos.