2 novembro 2023, 08:30
2024: revolução em curso na seleção de andebol
Portugal vive o melhor período da história e tem vindo a renovar-se; torneio de preparação na Tunísia terá muitas novidades
Quarteto foi que vice-campeões europeus de sub-20 em 2022 trabalha para estar no Europeu de andebol sénior em janeiro; rabalho no Sporting, FC Porto e Cangas já valeu a convocatória de Paulo Jorge Pereira
Parecem bandos de pardais à solta: os putos. Os putos!
Não existe uma idade certa para deixar o ninho. É uma questão de confiança, uma dose indispensável de coragem e talvez alguma sorte, também. E depois é vê-los voar.
A receita tem origem na ornitologia. Mas não é disso que falamos aqui. Até porque a metáfora já ganhou asas para lá dessa realidade e ganhou novos mundos. Neste caso, recorremos a ela para falar sobre uns miúdos que andam muito saídos das cascas no mundo do andebol.
Há pouco mais de um ano, Diogo Rêma, Pedro Oliveira, Ricardo Brandão e Kiko Costa faziam parte da seleção de sub-20 que levou Portugal ao segundo lugar do Europeu da categoria. Na última semana, integraram a Seleção principal que alcançou o segundo lugar no Kempa Trophy, que se realizou na Tunísia.
E pelo meio, têm vindo a brilhar no Sporting (Kiko), no FC Porto (Rêma e Oliveira) e em Espanha (Brandão), o que lhes valeu um lugar entre os eleitos de Paulo Jorge Pereira, a pouco mais de dois meses do Europeu que se disputa em janeiro na Alemanha.
Kiko Costa, apesar de ser o mais novo do quarteto, já é um nome regular da Seleção há mais de um ano e meio – tal como o irmão Martim que só não entra nesta história porque uma lesão o afastou na véspera do início do estágio. Mas os outros três começam também a ganhar asas e mostrar querer voar alto.
Mas estará a geração da medalha de prata no Europeu sub-20 do ano passado preparada para tomar conta da Seleção principal? Foi isso que A BOLA foi tentar perceber.
Francisco Costa, o mais ‘experiente’, recebe a provocação de sorriso no rosto, mas tal como dentro de campo, sem medo de encarar a responsabilidade.
«Claro que temos condições para ter mais gente dessa geração na seleção principal. São jogadores muito evoluídos que querem chegar longe e atingir esse patamar. Já estamos cinco e há mais gente que pode chegar», avisa, ele que inclui o irmão no grupo.
E será que foi preciso dar um moral extra aos amigos que começam agora a ganhar espaço entre os ‘crescidos’?
«Nada disso! Estes jogadores sabem o que significa estar aqui. O Rêma e o Pedro [Oliveira] estão a jogar a Liga dos Campeões pelo FC Porto, sabem bem o que é a exigência. O Brandão é o menos experiente de nós, mas está a jogar em Espanha e aqui percebe que só tem de se soltar e desinibir para crescer e chegar longe», analisa.
Além do lateral de 18 anos do Sporting, Diogo Rêma foi quem teve mais minutos de jogo nos três jogos disputados na Tunísia. Aos 19 anos, o jovem guarda-redes mostrou que não é por acaso que tem sido titular tantas vezes na baliza do FC Porto, tanto na Liga dos Campeões como no campeonato, e foi o guardião em melhor plano no conjunto português.
Antes disso, já confidenciara sentir-se totalmente pronto para assumir a baliza da Seleção. Tanto ele, como os jovens companheiros.
«A preparação que fizemos ao longo dos anos deu-nos asas para evoluir. Porque não há nada que dê melhores bases do que jogos internacionais pela seleção. Tomar conta da Seleção? Com tempo, vamos passo a passo», recomenda.
Tempo. Tempo é a receita para estes e outros jogadores mais jovens assumirem um papel de relevo na Seleção que marcou presença em todas as grades competições desde 2020, depois de uma ausência de 14 anos dos grandes palcos do andebol. Mas foi também o tempo que os trouxe até aqui. O tempo de dedicação e preparação para assumirem neste momento.
«Esta é uma geração com muito potencial e jogadores muito promissores, que já estão a jogar a um nível alto. Muitos daqueles jogadores cresceram a preparar-se que chegar ao ponto mais alto do andebol, que é a Seleção A», garante Pedro Oliveira.
De resto, para o ponta de 21 anos do FC Porto não é surpresa que o crescimento tenha sido tão rápido.
«Há um ano, quando fomos vice-campeões da Europa, se calhar não diria que cinco jogadores daquela equipa estariam já na Seleção A, mas três sim, sem dúvida. E não são todas as gerações que conseguem fazer isso com jogadores tão jovens», orgulha-se
E era ele próprio um dos três que imaginava entre os grandes?
«Talvez duvidasse que já pudesse estar, mas sem dúvida que via isso a acontecer a médio prazo. Porque esse é o objetivo pelo qual luto todos os dias», resume.
Certo é que Paulo Jorge Pereira viu em todos eles capacidade para integrar a Seleção, na preparação para o Europeu. E nenhum deles afasta essa possibilidade do horizonte.
«Todos nós temos condições para integrar a convocatória para o Euro, mas temos de continuar a mostrar trabalho nos clubes e há sempre fatores inesperados, como as lesões», aponta Kiko Costa.
«Estar no Europeu é o objetivo», admite também Rêma. «Não será fácil porque os outros guarda-redes têm mais experiência do que eu, mas tenho jogado bastante no FC Porto, no campeonato e na Champions, e jogar regularmente contra os melhores é muito bom e tem ajudado à evolução. Se continuar a jogar a este nível, acredito que tenho possibilidades de estar na convocatória para o Euro», remata.
Apesar da juventude, nenhum destes jogadores é novato ou desconhecido. Todos eles têm muitos minutos jogados no campeonato, não só nesta época, mas já antes.
Kiko Costa, claro, é um caso à parte. Estreou-se na equipa principal do FC Porto com 15 anos e antes de se tornar figura central no Sporting em 2021, logo aos 17, ainda jogou uma época no Avanca.
Ora, mas não foi apenas Kiko Costa a passar por essa experiência. Todos os elementos do quarteto foram emprestados – Ricardo Brandão está novamente cedido – antes de se afirmarem, neste caso no FC Porto.
E para todos, essas experiências se revelaram fundamentais na evolução. Que o diga Pedro Oliveira, que nas últimas duas épocas jogou no Avanca e no Gaia.
«Os dois anos emprestado, a jogar muitos minutos, foram fundamentais. Porque quando somos jovens, o mais importante é jogar. E foram duas épocas nas quais senti muita evolução», assegura.
A prova da evolução de Pedro Oliveira é que, em teoria, regressava este ano aos dragões como terceiro ponta, atrás de Diogo Branquinho e Leonel Fernandes, os dois habituais pontas esquerdas da Seleção nacional. Ou seja, a luta pela vaga é… diária.
«Para mim é muito positivo. Tenho a concorrência a treinar comigo todos os dias e temos uma competição saudável entre nós», nota.
Para Pedro Oliveira ser convocado, Diogo Branquinho, o mais experiente dos três, ficou de fora. E a verdade é que isso não surpreende quem tem visto os jogos do FC Porto, nos quais o caçula tem sido titular com regularidade e surpreendido. Mas só pela maturidade que mostra em campo. Porque da qualidade poucos teriam dúvidas.
Pedro Oliveira admite que é para isso que trabalha, mas confessa que não esperava estar à frente da concorrência nesta fase da época.
«Nunca estamos propriamente à espera. Eu tenho consciência de que estou a competir com os dois melhores pontas nacionais. Foi um desafio a que me propus quando surgiu a possibilidade de regressar, tenho trabalhado bem para isso e estou a corresponder», orgulha-se.
Ricardo Brandão é o único a jogar fora de Portugal. Depois de uma época cedido ao Gaia, o pivô de 19 anos rumou no início da época a Espanha e tem-se destacado no Cangas. O que dá razão à aposta.
«Estou muito satisfeito pela oportunidade, tenho trabalhado muito para isto [chegar à Seleção], estou a jogar bastante tempo e a fazer bons jogos em Espanha e tenho mais tempo de jogo para me mostrar do que se tivesse ficado no FC Porto. Está a compensar claramente», admite.
Natural de Aveiro, o jogador assegura que a distância para os familiares e amigos não foi obstáculo maior, afinal já estava longe de casa desde que se mudou para o FC Porto.
«Estar longe da família não está a ser obstáculo porque já estava no Porto e eles até têm conseguido ir ter comigo algumas vezes. Está a ser uma boa experiência. A adaptação à língua correu bem e o balanço da mudança está a ser muito positivo», conclui.
E isso leva-nos de volta a Carlos do Carmo, com quem abrimos estas linha. Afinal, o fadista já o tinha dito:
São os putos deste povo. A aprenderem a ser homens.
2 novembro 2023, 08:30
Portugal vive o melhor período da história e tem vindo a renovar-se; torneio de preparação na Tunísia terá muitas novidades