A BOLA FORA «Há falta de reconhecimento do Rúben Amorim enquanto jogador»

A BOLA TV23.09.202411:20

Entrevista A BOLA FORA: parte IV

Este episódio de A Bola Fora é com o Rui Fonte, avançado do Paços de Ferreira. O ponta de lança formou-se no Sporting, mudou-se para o Arsenal, de Inglaterra, e passou por vários clubes, nacionais e estrangeiros, numa carreira ligada ao irmão, José. É em Braga que vive e onde vai continuar a viver. Esta é a sua história, com altos e baixos, como a lesão contraída no Benfica.

Depois de um curto empréstimo ao Belenenses é para Braga que vens. Moras aqui, sentes que foi o renascer da tua carreira?
Sem dúvida, começou na equipa B do Benfica, em que o «mister» Hélder Cristóvão me deu a oportunidade. Já tinha 23 anos, ele acreditou em mim, deu-me esse tempo até para eu poder jogar, ver como estava. Ele também acreditava no meu potencial, e foi aí que eu dei começo, com confiança, com golos, com participação, ele acreditar em mim. Tive esse período no Belenenses e depois a chegada aqui a Braga foi efetivamente o poder, aos 25 anos, começar uma carreira forte. Foi o recomeço da minha carreira, onde eu fui muito feliz, conseguimos a conquista da Taça de Portugal ao fim de 50 anos para o clube, isso foi o culminar de uma boa experiência, não só no clube, mas com a cidade. Também reflete a minha decisão de ficar aqui, a experiência que tive com o clube e com a cidade.

 Sentes que foi realmente um grande momento, porque o António Salvador já andava à procura de um título há muito, muito tempo?
Sim, principalmente da Taça. Tinham ganho, creio que em 2013, a Taça da Liga, e o Braga já tinha estado em algumas finais. No ano anterior tinha perdido de uma maneira dramática, e quase repetiu, porque foi muito parecido, mas conseguimos a vitória. Mas é o culminar de anos de evolução do clube com essa Taça de Portugal, mais tarde presenças em finais da Taça da Liga, e ganho novamente dessa Taça da Liga.

 Quando voltas a Braga, a título definitivo, é essa a tua melhor época?
Sim. Tem alguma tristeza porque foi uma época atípica para o clube, tivemos vários treinadores, é a época que acabámos em quinto, em que para os standards do Braga já não é aceitável. Tive pena por isso, por ter feito uma boa época a título individual, mas coletivamente não termos estado ao nosso nível, com essa tal instabilidade. Mas também criou as fundações para o Braga, a partir do ano seguinte, com o «mister» Abel, fazer e estabilizar em relação àquilo que são os objetivos do Braga, quer com títulos, quer com boas classificações, muitas vitórias, competições europeias chegar longe. Pode acontecer um momento de perturbação num clube, e também souberam identificar o que era necessário e retificar isso.

Falavas que tiveste vários treinadores, realmente foi, nesse ano foi bastante, bastantes anos que passaram, posso-te perguntar quem é que te marcou mais
Sinceramente, gostei de todos. Aprendi um bocadinho sempre com todos, agora claro, há sempre um treinador que se identifica mais connosco, ou também até pela própria experiência, jogamos mais, às vezes gostamos mais desse treinador. Nem digo pela pessoa, é pelas características que ele quer, se calhar nós acabamos por jogar um bocadinho menos, mas tenho o Rúben Amorim porque para já tinha sido meu colega, é meu amigo, e foi de sucesso. Fazer parte dessa experiência que ele teve como treinador de I Liga, conquistar o primeiro título com ele. É marcante por tudo isso e pela maneira que o conheci como jogador. Nunca imaginei que o Rúben… ele tinha o conhecimento, aliás, há falta de reconhecimento do Rúben enquanto jogador. Era um jogador inteligente porque ele jogava em várias posições e conseguia fazer tudo.  Acabou, não diria prejudicado, mas acho que faltou reconhecimento àquilo que foi, à ajuda que ele deu ao Benfica e aos clubes onde esteve, mas pela vivência que tínhamos no balneário, eu nunca imaginei que ele conseguisse fazer-se treinador. A verdade é que o conhecimento estava lá. Depois, o Paulo Fonseca, por tudo o que ele me ensinou e por todas as visões que ele tinha enquanto treinador. O que ele me ensinou, as coisas que eu tinha de fazer, que eu nem imaginava que fazia sentido assim. Eu diria que eles os dois, mas todos os outros que eu tive, felizmente tive a sorte de trabalhar ao longo da minha carreira com excelentes treinadores. E isso foi recompensador também por aí.

Ia perguntar acerca do Rúben, o facto de vocês já se conhecerem, de haver já uma relação pessoal entre vocês. De alguma forma limitou ou condicionou quando ele passou a ser treinador?
Tanto da parte dele como da minha parte sempre houve esse respeito, não foi por aí. Até porque o Paulinho estava num momento bom, pouco eu poderia dizer ao Rúben, treinador, que eu queria jogar. Por isso houve sempre esse respeito. E também da minha parte, se fosse o Rúben ou fosse outro treinador qualquer, haveria sempre o respeito com o treinador como com o meu colega. Que é, nos momentos que eu tivesse para participar, para dar o meu melhor. Nunca houve problema algum em relação a isso. Até porque brincávamos muitas vezes e se eu tivesse de não jogar, também não jogava. E aconteceu várias vezes, do tempo que ele esteve cá.

«Jogo que repetia? Aquela final no Jamor com o FC Porto»

A experiência no Fulham, conta-me um bocadinho sobre ela.
Recompensadora a todos os níveis. Também a fazer a mudança de um Braga para o Championship, teria de ser para um clube que permitisse lutar por objetivos diferentes. A parte financeira fez a diferença, como é óbvio. Para a nossa realidade aqui em Portugal, apesar de ser um campeonato da 2ª Liga de Inglaterra, o nível financeiro é superior. Eu não posso, nem poderia ser hipócrita a esse ponto, dizer que não fez a diferença. Que fez, mas também que juntasse o clube, ter a ambição de fazer algo mais. Fulham é Londres e é perto do centro, então estava perto de tudo. A experiência foi boa, consegui encontrar o sítio certo para viver. O clube também, dentro do que são as suas limitações, não por opção própria, mas porque são as regras em Inglaterra, do que eram as condições. Eram boas, aceitáveis, poderiam ser melhores, sim. Mas eram boas e foi um clube que me providenciou tudo para poder ser feliz. Felizmente, conseguimos subir, numa experiência magnífica, onde eu pude ter família e amigos em Wembley a ver o jogo com o Aston Villa. Poderem festejar comigo esse momento em que, passado um ano, valeu a pena fazer a transição em que me custou muito deixar Braga e ir para a Inglaterra. Apesar de tudo o que eu disse para trás, custou-me imenso deixar Braga, deixar o clube, deixar as pessoas do clube, deixar a cidade. Mas foi recompensadora um ano depois.

 A seguir vem a experiência no Lille, com o teu irmão também. Vocês ficaram em segundo lugar. Imaginarias que passado dois anos eles poderiam ser campeões?
Aquele ano, o ano em que o meu irmão vai primeiro, faz a pré-época, e eu vou já no fim do mercado, é um ano de viragem para o clube. Muitas alterações no plantel, mesmo estruturais, enquanto clube. Na época anterior, salvou-se a 3, 4 jornadas da despromoção. E nós conseguimos fazer esse segundo lugar. Foi quase como ser campeão, em relação ao PSG, com toda a capacidade financeira que tem e da qualidade que pode trazer ao nível dos jogadores. Foi o ir escolhendo as peças certas, da parte de quem estava à frente do clube, que era o Luís Campos, em contacto direto com o «mister» Gaultier, em que conseguiram culminar e aproveitar uma época menos boa do PSG.

A Inês nunca se opôs, ou queixou, de tantas mudanças, porque realmente mudaste imensas vezes, e já também com a família?
Não, até porque a maior parte das experiências que nós tivemos no estrangeiro estávamos só os dois ainda. O Gabriel nasce nas férias de Natal, quando estava no Lille. Depois Fulham na pré-época e depois Braga. Quando me ligam para voltar, a decisão estava tomada. Agora, difícil pode ter sido a saída para Lisboa, mas foi um momento familiar em que o Gabriel já compreendia muita coisa, mas a Inês foi o meu maior apoio.

Pretendes viver em Braga no futuro?
Já quando saí do Estoril o intuito era voltar para Braga, para o Norte. Como família seria difícil ir para o estrangeiro, até porque rejeitei propostas e não sei se já teria fora para fazê-los mudar ou eu ir sozinho.

 Paços é uma equipa que costuma estar na I Liga, é esse o objetivo?
O clube está numa fase de transição para SAD. Tem um investidor para entrar e é um período para o que pode vir a ser o bom porto de atingirmos essa subida. Há que fazer o melhor que pudermos, jogo a jogo, desfrutar do processo e poder ganhar o máximo número de jogos.

Se pudesses repetir um jogo, qual seria?
Pela experiência e alegria que foi, o jogo da Taça de Portugal com o FC Porto, no Jamor. Marcar num estádio em que todos sonhamos jogar, naquele dia de festa da Taça. Poder marcar e ganhar com o Braga foi a melhor experiência futebolística.

 

A entrevista a Rui Fonte na íntegra