De que teve tanto medo o FC Porto?

OPINIÃO19.03.202205:55

A opção de Sérgio para o jogo de Lyon mostrou um indisfarçável respeito pelo Sporting e um infeliz retrocesso na habitual cultura global de vitória

NÃO há nada como começar pelos factos para daí se partir para a análise. O FC Porto comanda comodamente o campeonato. Faltam oito jogos e ainda não perdeu nenhum. Tem seis pontos de avanço sobre o Sporting, segundo classificado, e doze sobre o Benfica, ou seja, doze pontos que o sustentam numa posição de entrada direta na Champions. Mesmo assim, perante o desafio de apostar nos seus melhores jogadores e na sua melhor equipa para poder emendar uma lamentável exibição no Dragão, que esteve na origem de uma imprevista derrota com o Lyon para a Liga Europa, Sérgio Conceição preferiu economizar forças e energias e mudar drasticamente a habitual cultura de vitória, em qualquer jogo e em qualquer circunstância, que diferenciava positivamente o FC Porto de outras equipas portuguesas, que se têm sentido mais confortáveis a jogar no seu quintalinho de aldeia.
A verdade é que a decisão de Sérgio Conceição representava três pontos essenciais na decisão: o primeiro mostra um tão inesperado como indisfarçável respeito pelo Sporting, que mesmo a seis pontos continua a ser considerado como um temível candidato ao título; o segundo mostra um lamentável retrocesso na cultura de uma visão global do espírito de conquista da equipa, regressando à divisão de objetivos entre Portugal e Europa, nacional e internacional, o que é uma evidente expressão de menoridade do clube à escala global; o terceiro afirma, de uma forma bem explícita, a crítica antes feita por Sérgio Conceição no momento de saída de Luis Díaz, quando assumiu que, naquelas condições, a equipa teria de se realinhar para outros objetivos.    
As consequências não são boas. O FC Porto pode ganhar no Bessa, garantir cedo a conquista do campeonato (mais um a somar a tantos conquistados) e até vencer a Taça de Portugal, mas a época ficará sempre manchada por um retrocesso claro e preocupante naquela que era a sua maior afirmação de marca: credibilidade, competência e valor internacional. Algo que verdadeiramente distinguia o FC Porto de todos os outros clubes portugueses. Internacionalmente, o FC Porto era respeitado como nenhum outro e tinha conquistado um prestígio invulgar.
Pode-se sempre argumentar que depois da saída da prova rainha, a Champions, o FC Porto já não teria muito a ganhar numa competição como a Liga Europa. Não é verdade. Veja-se o exemplo do Barcelona, que é dos maiores entre os maiores, que teve de vencer uma difícil crise e que, precisamente na Liga Europa, não desiste de afirmar o seu nome, o seu prestígio, o seu poder, tal como o o FC Porto deveria ter feito.
Dirão também alguns observadores que o FC Porto não podia correr o risco de deixar o Sporting vencer o segundo título consecutivo, o que lhe daria um balanço e uma dinâmica de vitórias preocupantes. Sendo improvável que nas condições atuais e em função das dificuldades que ambos terão de enfrentar no campeonato até ao seu final o FC Porto esbanjasse a vantagem que tem neste momento, a questão de fundo mantém-se. Enquanto os clubes portugueses continuarem a hipervalorizar a conquista do título, de tal forma que preferem subalternizar as provas internacionais, o futebol português, a nível de clubes, não sairá da cepa torta.
Fica, assim, de pé a esperança na Seleção Nacional e vêm, aí, dois desafios muito difíceis. Portugal joga com a Turquia e, provavelmente, com a Itália a presença no Mundial do Catar. E joga muito mais do que isso, que já não seria pouco. Joga uma continuidade sistemática, neste século, nas grandes provas internacionais.
 

Sérgio Conceição, treinador do FC Porto 


DENTRO DA ÁREA – BENFICA NO PALCO DAS ESTRELAS 

Benfica nos quartos de final da Champions e SC Braga nos quartos de final da Liga Europa. Dois sucessos assinaláveis e que, em ambos os casos, foram expressão de alguma surpresa dos observadores internacionais. Agora, na prova maior do futebol mundial a nível de clubes, o adversário do Benfica será o Liverpool. Exigência máxima na performance de um palco de visibilidade mundial. Injusto exigir o impossível, mas aconselhável exigir-se a dignidade competitiva a que uma eliminatória destas obriga. É assim no palco das estrelas.  


FORA DA ÁREA – A COMUNICAÇÃO  E A GUERRA 

A maior surpresa nesta guerra desumanizada que a Rússia impõe à Ucrânia não tem como protagonista principal qualquer nova arma  destruidora, mas a suprema importância da comunicação. É claro que a Rússia vence em armas, mas a Ucrânia vence em comunicação. O resultado, também para a Rússia, é inesperado. O que parecia ser um problema resolvido em dias está a tornar-se um nó difícil de desatar. A comunicação de Kiev tem sido de uma eficácia decisiva. No acerto da mensagem global e na força moral dos seus cidadãos.