Das girafas...
Só através das girafas afastadas da praça se pode pôr sombra no FC Porto campeão...
Meu caro Frederico Varandas:
ANTES do mais, deixe-me que comece por contar-lhe uma história: ao raiar de várias manhãs, um homem desatou a aparecer todo vestido de vermelho (o vermelho talvez fosse de mudar, como adiante verá), na praça duma moderna cidade. Vermelho (aqui, o vermelho talvez fosse, igualmente de mudar, como adiante verá) era também o chapéu que levava encafuado a tocar-lhe os olhos - e que, de súbito, puxava da cabeça para a mão direita, agitando-o, num frenesim sem fim, de um lado para o outro. Assim sucedeu dois, três, quatro dias - até que polícia no giro se abeirou dele, perguntando-lhe, suspicaz:
- O que é que o senhor está a fazer?
e a razão (de o fazer) soltou-se-lhe, então, de um brado (em fervor):
- Estou a espantar as girafas!
Retorquindo-lhe o guarda em pasmo:
- Mas aqui não há girafas!
despachada foi a resposta do insólito agitador:
- Se não há girafas é graças ao bom trabalho que aqui faço, espantando-as...
A história descobri-a em A Arte de Pensar com Clareza de Rolf Dobelli - e ele conta-a para explicar um dos 52 erros de raciocínio que não devemos cometer quando comandamos homens ou criamos sonhos - podendo, porém, servir de metáfora para outros meandros de vida (ou do caráter). Talvez já esteja a imaginar por que me lembrei dela, da história. Não, não me lembrei dela, da história, por tê-lo ouvido afirmar o que afirmou de Pinto da Costa (sem se preocupar com Frei Tomás...) - arrastado por aquilo que ele julgou «piromania mediática». Lembrei-me dela, da história, porque me parece que você só se atirou a Pinto da Costa (como se atirou) porque, vendo o FC Porto ganhar como ganhou o campeonato e a Taça - a única forma de lhe pôr mácula (ou de lhe insinuar sombras...) teria de ser a que foi (como foi): através desse insólito agitador que se pôs, em bicos de pés, na ponta da sua língua, a soprar ilusões iguais à ilusão das girafas afastadas (ou em piores engodos...)