Aquela máquina
Álvaro Pacheco assumiu responsabilidades pela pesada derrota com o Flamengo (Foto: Hugo Delgado/LUSA)

Aquela máquina

OPINIÃO08.05.202408:30

As aspirações de Álvaro Pacheco são legítimos mas o timing [com o Cuiabá] foi péssimo

Sentido de pertença

1 - Quando as coisas correm bem, é sempre fácil falar sobre desejos e expectativas porque a possibilidade de eles serem cumpridos e realizados aumenta potencialmente. Para um pessimista intermitente como eu, dá sempre jeito acalentar o que corre menos bem como um acidente de percurso e acreditar que o melhor está para vir.

2 - O meu desejo era que com o lastro que Álvaro Pacheco foi deixando na equipa, desde que pegou nela, mesmo com algumas intermitências e apagões, este Vitória e uma boa parte dos seus jogadores continuassem a alimentar a máquina. E a máquina, em Guimarães, tem a exigência dos clubes grandes mesmo sem ter os mesmos recursos e a mesma potência financeira. Gosto da analogia, porque depois do falso arranque do início de época, Pacheco fez do Vitória aquela máquina, mesmo com revisões forçadas pelo meio, suspeitas de quebra de produção e ritmo, jogadores a gripar e outros riscos que foram sendo tomados por conta própria, na forma como foi gerindo a máquina e a ambição da equipa. E fomos seguindo, quase até à final da Taça… quase a bater o recorde de pontos, quase no, pelo menos, quarto lugar… quase… falta o quase!… que exige vitórias sobre SC Braga e Arouca e acreditar que o FC Porto vai depois fazer estragos no território do nosso rival. Difícil mas não impossível, como escrevi há algumas semanas. Tudo isto seria muito bonito se não fôssemos contemplados no fim da viagem com um desassossego infeliz e desastroso. Desassossego para a equipa e para os adeptos, que legitimamente foram criando expectativas, infeliz e desastroso porque interrompe subitamente um ciclo que parecia ter potencial para crescer e afinar a máquina.

3 - Quando há uns anos fiz o Macbeth, na sua alucinada ambição, há um desígnio de que nunca me esqueci, porque era a grande sombra da personagem na minha cabeça, que é a de que toda a ambição é legítima mesmo se não estamos preparados para ela ou quando ela nos conduz ao desastre. Quando se tenta ler nas entrelinhas, a margem de erro pode ser enorme, mas julgo que terá sido um sopro parecido ao de Macbeth o que terá induzido em erro Álvaro Pacheco nesta negociação inusitada. As aspirações são legítimas mas o timing foi péssimo mesmo que isto não retire nem mérito ou louvor ao seu trabalho e à sua dedicação. Sobra-me agora menos espaço para as expectativas , talvez porque tenham ficado mais curtas depois deste episódio. Ficava para já pela mais modesta, que as partes se entendam e deitem fora o que não presta, mesmo que isso se traduza num divórcio inevitável. Depois, podendo e querendo ser um pouco mais ambicioso, que quem vier, se vier, que venha por bem, que queira manter a máquina firme e a carburar ao nível do que se vive no clube e na cidade, e que comece a dar forma ao desejo adiado: a de que o melhor está para vir!

4 - Uma nota final para a conquista da Taça da Federação no voleibol feminino do Vitória, o primeiro título absoluto do clube nessa modalidade, e que é recordista de praticantes na cidade. Uma janela aberta para reforçar a dimensão do clube e sublimar os desejos adiados do outro lado.

Coluna de opinião de João Reis, ator e associado do Vitória de Guimarães