DIA DA MULHER A competência não tem género
Em Julho, pouco depois de ser eleita a primeira Presidente mulher do Rio Ave FC, e de um Clube na 1ª Liga, afirmei que “a competência não tem género”.
Tenho verdadeiramente a convicção de que assim é, tal como entendo que é com naturalidade que devemos observar o papel da mulher em meios tradicionalmente ocupados, em maioria, pelo homem.
Nestes muitos anos que já levo no futebol, em momento algum senti na pele a discriminação, a desigualdade ou a desconfiança por ser mulher. Serei, porventura, uma privilegiada, pois não ignoro o caminho que ainda é preciso fazer no âmbito da igualdade de género, nomeadamente, no acesso ao trabalho, às oportunidades, na relação trabalho-família, às hierarquias nas mais diversas competências.
Um estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos, em 2018, a propósito da “igualdade de género ao longo da vida”, concluiu que “o maior sucesso escolar das raparigas não encontra tradução prática imediata”, uma vez que “a taxa de emprego da população jovem é ligeiramente mais elevada entre os homens”. Ora, esta é, efectivamente, uma demonstração de que a competência feminina ainda é, de certo modo, olhada com desconfiança. Não existe uma igualdade plena no acesso ao mercado de trabalho, que se reflecte nos vários níveis hierárquicos das empresas. E quem fala do acesso, pode ainda falar sobre as condições remuneratórias, onde está por demais estudado que os homens continuam a auferir genericamente mais do que as mulheres.
Simone de Beauvoir declarou que “é pelo trabalho que a mulher vem diminuindo a distância que a separava do homem”. Recuando ao século XX e analisando a emancipação progressiva da mulher, não é difícil concordar. O empoderamento da mulher é hoje uma realidade, mas em construção, ainda frágil, que requer mais e melhor atenção, assente na consciencialização das massas e, sobretudo, das gerações vindouras.
Ser mulher, em meios como o do futebol, não obstante a minha boa dose de felicidade, ainda é um desafio diário. Basta observarmos o número de mulheres em cargos de decisão no nosso futebol profissional, por exemplo.
Após a minha chegada à presidência do Rio Ave FC recebi dezenas de convites para entrevistas. Boa parte delas tem o genuíno interesse de falar do quanto sou pioneira neste meio. Compreendo que possa haver a tentação de me verem como ‘bandeira’ da chegada das mulheres ao futebol, mas a minha prioridade é trabalhar para que o Rio Ave FC tenha um futuro mais risonho e se potencie.
Pretendo que a minha presidência seja um dia reconhecida pela competência do trabalho desta Direcção, e não pelo género de quem a liderava. Se a mesma servir para que mais mulheres tenham a coragem e a oportunidade de colocarem a sua experiência ao serviço do futebol, ganhará com isso a sociedade, porquanto será sinónimo de que ficou menos desigual, mais plural e fortalecida, pois a competência não tem género.
Alexandrina Cruz
Presidente do Rio Ave Futebol Clube