Nuno Borges: «O que me move é ganhar torneios e jogar contra  os melhores»
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ENTREVISTA A BOLA Nuno Borges: «O que me move é ganhar torneios e jogar contra os melhores»

PARTE 1 - Um mês após ter sido obrigado a parar devido a lesão e com o corpo também a exigi-lo, o maiato está de regresso aos 'courts'. Conta o que o faz querer sempre mais e revela a pressão para que bata recordes.

— Mais de um mês depois de estar parado devido a lesão e após ter atingido o 30.º lugar do ranking ATP, o segundo melhor de sempre de um português e tendo chegado aos oitavos de final do US Open, está de regresso à competição na próxima semana no ATP 500 de Basileia, na Suíça. Qual foi especificamente a lesão que sofreu?

— Ao certo foi no punho esquerdo. Não foi nada grave, só que tratou-se de uma coisa que demora a curar e até para estar bastante confiante na recuperação. Mas já estava a lidar com esta limitação há algum tempo. Com os jogos que fui ganhando e disputando, as coisas também não melhoraram. Não estava a conseguir dar vazão à carga que andava a fazer, mas penso que o corpo também chegou a uma altura e pediu uma pausa por uns tempos.

— Por isso preferiu recuperar primeiro totalmente fisicamente para depois não ter de voltar atrás e tornar a ter de parar, do que estar sempre a trabalhar sobre a lesão?

— Também estava muito cansado mentalmente, já senti que estava ali a fazer um esforço, mais um, mais um… e, de certa maneira, o corpo arranjou uma forma de me dizer que ele precisava descansar um bocadinho. Eu também estiquei-o, estiquei-o e estiquei-o por uma boa razão.

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— Estava a valer a pena esticar?

— Ah, isso estava. Estava bom, não andava a querer parar enquanto o corpo andava-me a dizer o contrário, mas ele também não sabe o momento incrível que eu andava a viver [risos].

— Era um pouco: não estás a perceber que sou 30 do mundo? Pára lá quieto!

— Isso. ‘Deixa-te de coisas [risos]'...

— Esse momento de ser 30.º do 'ranking', depois também surgiu logo a seguir a presença da Seleção na Taça Davis, em que se ficou a ver se o Nuno ainda iria ou não jogar na Noruega, mas acabou por ser o início da paragem, o que é que significou ver, oficialmente, numa segunda-feira, que chegara a tal posição. Mesmo sabendo que iria acontecer?

— Trinta! Ainda por cima um número redondo… Foi incrível. Sinceramente, continuo com a mesma conversa de sempre, cada vez que vou a campo tenho vindo a sonhar com novos números, novos objetivos alcançados. Lá está, andavam-me sempre a falar de números e eu estava só preocupado com o próximo torneio. Tem sido sempre desta forma e acho que é isso que me tem ajudado tanto. Mas também por não pensar tanto nesses números, porque existem outras coisas. Depois chegam e falam-me do número do João Sousa [conseguiu subir até 28.º] e depois é mais isto e aquilo. Agora é também chegar ao top-20. O pessoal começa-me a falar em ser top-20 e top-15 e eu continuo a responder que estão malucos e qual quê...

Cada vez aprecio mais este estilo de vida que é de muito sacrifício e muito esforço, mas também é uma vida de luxo.

— E quando lhe diziam que iria chegar a 'top'-30, já lhes respondia que eles eram malucos?

— Sim, dizia sempre. Mas, de certa maneira, cada vez que vou ao jogo sonho um bocadinho como eles, não é? Como as pessoas me veem de fora e dizem: ‘Ah, agora estás em top-20. Ah, agora é para ganhar este jogo’. Mas foi um esforço que compensou. Não sabia era qual o preço que iria ter de pagar por jogar tanto, não é?

Claro que os números são sempre bons, só que não posso estar a pensar neles quando vou para o jogo. É pressão que não preciso.

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— Mas, se não olha tanto para os números, o que é que o move? Cada dia ser melhor do que era ontem?

— Não, o que me move é ganhar estes torneios e jogar contra os melhores. Cada vez aprecio mais este estilo de vida que é de muito sacrifício e muito esforço, mas também é uma vida de luxo. Com todas as viagens, lugares e competições e sei lá mais o quê o pessoal, por vezes, acha que estou quase sempre de férias porque há hotéis espetaculares e estádios espetaculares... mas a pressão aumenta, a responsabilidade aumenta. Sinto-o cada vez mais e também aprecio cada vez mais o privilégio de poder estar ali a competir com aqueles jogadores e isso move-me. Claro que os números são sempre bons, só que não posso estar a pensar neles quando vou para o jogo. É pressão que não preciso. Pelo menos eu não funciono assim, mas sei que há muita gente que precisa de ver o live ranking para dizer: ‘Ah, para onde é que vou se ganhar este jogo? OK, vamos lá!’. E vão buscar energia a isso. Comigo não funciona tanto assim.

Nunca vou ver quem poderá ser o meu adversário da ronda seguinte.

— E o adversário funciona? Na próxima ronda vou defrontar esta determinada pessoa… Isso já serve?

— Não, aliás tento mesmo não olhar para quem pode vir na próxima ronda. Só estou com atenção para o meu adversário de agora. Por vezes até espero um bocadinho para saber, mas nunca vou ver quem poderá ser o meu adversário da ronda seguinte.

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— Sim, mas quando está num torneio, a partir de um certo momento vai-se tornando difícil não saber quem vem na seguinte.

— Pois, às vezes as pessoas desbocam-se e dizem-me logo, assim do nada, quem vou defrontar.

— É o problema do raio das mensagens hoje em dia…

— Lá me estragaram a surpresa. Aconteceu-me isso em Montreal [Canadá]. Estava a treinar com um rapaz, acabámos, ele senta-se e quando já estou a sair do campo, vira-se e diz-me só assim: ‘Kecmanovic!’ E eu: ‘O quê?'. ‘You play Kecmanovic’ [Vais defrontar (o sérvio Miomir) Kecmonovic]. E eu: ‘OK. Já está...’. O quadro tinha acabado de sair quando estávamos a treinar. Terminámos, ele pegou no telemóvel e pimba! Disse-me.