Nuno Borges: «Não sei se todas as pessoas querem que ultrapasse o João Sousa»
Fotografia Imago

ENTREVISTA A BOLA Nuno Borges: «Não sei se todas as pessoas querem que ultrapasse o João Sousa»

PARTE 2 - Um mês após ter sido obrigado a parar devido a lesão e com o corpo também a exigi-lo, o maiato está de regresso aos 'courts'. Conta o que o faz querer sempre mais e revela a pressão para que bata recordes.

— Contou que querem que seja 20.º, 15.º do ranking e que referem muito o João Sousa. Existe muita pressão vinda do exterior? Entretanto, com a paragem que teve de fazer, já passou a ser 32.º, mas em Portugal as pessoas colocam-lhe muita pressão para, pelo menos, tornar-se 28.º, 27.º?

— Não sei se todas as pessoas, todas, querem que o ultrapasse [sorri]… Mas já que estou aqui o pessoal deseja que dê continuidade a este momento. As pessoas gostam de ver os recordes serem quebrados e das vitórias.

Gostava de quebrar o meu próprio recorde. Agora, se isso implica quebrar o recorde do João, OK

— Mas o Nuno também, não é?

— Claro que sim, mas gostava de quebrar o meu próprio recorde. Agora, se isso implica quebrar o recorde do João, OK. Siga! Mas penso que temos caminhos tão diferentes na carreira. Já não somos propriamente da mesma geração. Pelo menos eu tive o prazer de apanhá-lo ainda um bocado no seu percurso, principalmente nas seleções para a Taça Davis e aprender tanto com ele. Mas acho que, de certa maneira, não somos comparáveis.

E mesmo cada um dos jogadores da geração anterior, como são os casos do Frederico Gil e o Rui Machado, foram muito mais comparáveis. No entanto, o Rui foi para Espanha enquanto o Gil ficou cá em Portugal, o que é tão diferente. E, apesar de tudo, foram tão díspares. Terminaram mais ou menos com o mesmo ranking e ainda assim as respetivas carreiras foram totalmente distintas. O bonito é mesmo assistir a toda essa caminhada».

As pessoas adoram falar desse número. Só que isso não me ajuda em nada, principalmente quando o meu corpo está a precisar descansar um bocadinho e existe já a pressão do ano estar a acabar.

«No entanto, por vezes o número do ranking em si diz mesmo pouco, porque um torneio correu super bem, de repente, sobe-se 30 posições. No meu caso, agora não, mas quando estava em 120 do ranking colocava-me em 90.º de repente com um torneio… Está bem, tinha sido um torneio incrível mas, de um momento para o outro, parece que mudou tudo. Tenho mantido um bocadinho essa perspectiva. Cada vez que vou a um torneio desses quase que me muda a perspectiva. Neste momento, em 30.º [32.º] provavelmente não será tão fácil, mas ainda assim é um gap gigante. Foi um bocadinho a encarar as coisa desta maneira que me fez chegar aqui, mas sim, as pessoas adoram falar desse número. Só que isso não me ajuda em nada, principalmente quando o meu corpo está a precisar descansar um bocadinho e existe já a pressão do ano estar a acabar. Tudo isso não ajuda.

Fotografia Imago

— Isso quer dizer que este mês foi bom para recuperar o corpo mas a nível psicológico não o deixaram descansar muito?

— Sim, mas é normal que pense que esta época correu-me tão bem, até porque neste período não tinha grandes pontos para defender. Não poderei defender os pontos no Challenger da Maia no final do ano, por isso era bom conseguir aqui um empurrãozinho para tentar acabar a temporada ainda melhor e procurar novamente esticar mais um bocadinho. Já sei é que não dá para estar sempre a esticar.

Quando for a jogo irei confiante que está tudo bem e mesmo que exista um ou outro desconforto agora é sempre a subir

— Regressa agora à competição na próxima semana, na Suíça.

—Sim, vou ao torneio de Basileia, é um ATP 500.

— Até porque estas situações variam de pessoa para pessoa, quando regressa de uma lesão, e neste caso fez questão que ficasse bem para não correr o risco de andar naquele vai e volta competitivo, tem algum receio antes do primeiro jogo? Que aconteça alguma coisa devido ao esforço ou os treinos que efetuou já lhe permitiram afastar isso?

— Neste caso foi uma recuperação que foi evoluindo progressivamente e eu fui-me testando de mil e uma maneiras. Quando for a jogo irei confiante que está tudo bem e mesmo que exista um ou outro desconforto agora é sempre a subir, até porque o foco tem sido totalmente nesta recuperação. Mas há lesões que sim. Às vezes quando se torce os pés ou um joelho, coisas mais traumáticas, é normal que exista receio quando é para de voltar a competir, mas neste caso felizmente não.

Fotografia Imago

Logo na altura em que o defrontei [Rafael Nadal] soube que tinha tido sorte em apanhá-lo pela frente pela primeira e última vez.

— Neste momento seria quase incontornável não falar de Rafael Nadal e da retirada dele da competição. O Nuno foi dos últimos tenistas a jogar contra ele, quando, em setembro, lhe ganhou na final do Torneio de Bastad, na Suécia. Quando soube a notícia na passada semana, porque ela rapidamente correu o mundo, pensou na sorte que teve de ainda o poder ter defrontado, até porque recordo-me sempre de ter afirmado que uma parte de si queria que ele vencesse.

— A primeira reação que tive foi mesmo isso que pensei, sabia que tinha tido sorte em ter podido apanhá-lo. O Nadal quase que já não competia, toda a gente sabia que o anuncio da retirada estava para breve, ainda assim as pessoas sentiram o choque do momento e isso pesa. Mas, como referi, logo na altura em que o defrontei soube que tinha tido sorte em apanhá-lo pela frente pela primeira e última vez. Ainda por cima numa final.

Foi superespecial e só isso contou. Já quando se retirou não fiquei muito surpreendido porque penso que pelo menos as pessoas do mundo do ténis sabiam o que estava para vir. Tínhamos, se calhar, até estranhado ele não se ter retirado em Roland Garros ou nos Jogos Olímpicos de Paris, que ainda por cima foram em Roland Garros. Mas lá está, pelos vistos para o Nadal a Taça Davis também tem um significado incrível, onde foi segurar a bandeira e tudo. Faz todo o sentido.

— E se com o Rafael Nadal pensou logo: com este ainda joguei, qual seria o outro tenista que gostaria de ter tido a oportunidade de defrontar.

— O Roger Federer, mas penso que neste caso teria sido praticamente impossível, quase não joguei um ATP enquanto ele ainda competia. Na verdade, nem me lembro do momento em que ele se retirou e onde é que eu estava. Teria sido bastante difícil de acontecer. Teria de ter sido num torneio mais pequeno ou por caso num grand slam que às tantas ele nem sequer foi, mas adorava poder ter tido a oportunidade de jogar contra ele.