ENTREVISTA A BOLA «Ninguém pede para sair em duas semifinais e em nono lugar no campeonato brasileiro»

Tem feito carreira como treinador no Brasil. Começou como principal no Athletico Paranaense, depois de ter tido uma primeira experiência no futebol brasileiro como adjunto de Jesualdo Ferreira, no Santos. A única experiência em Portugal foi no Benfica B e em entrevista A BOLA elogia os jogadores que o marcaram por cá e a ligação quase umbilical do lado de lá do Atlântico.

Começaste como treinador principal no Brasil. Nada comum para um português. O que é que te recordas?

Antes de mais, estas palavras de circunstância teriam de ser ditas: obrigado pelo convite. Já nos conhecemos há muitos anos e para mim é sempre um prazer falar contigo Irene. Eu tenho valores na vida dos quais jamais vou abdicar e um deles é a gratidão. A forma como eu cheguei ao Brasil, e a carreira que eu faço no Brasil são coisas que foram acontecendo de uma forma bonita. Tenho uma gratidão enorme por o professor Jesualdo me ter dado a oportunidade de integrar a sua equipa técnica. Depois, através de algumas circunstâncias que foram ocorrendo, e pelo facto de eu treinar a equipa de sub-23 do Santos, outras pessoas viram-me competência e como algumas dessas pessoas transitaram para o Athletico Paranaense, mais tarde fizeram-me o convite para ir para lá. Lembro-me que tinha sido o Dorival Júnior, que hoje é selecionador, a sair do Athletico Paranaense. Depois o Eduardo Barros, que é o adjunto do Fernando Diniz, também saiu e foi o Paulo Autuori para o clube. Eu vou para auxiliar do Paulo Autuori. O mestre Paulo, como lhe chamo, é outra pessoa a quem estou grato. É uma das pessoas que faz parte da minha história. Ele basicamente era um manager, que por fora geria principalmente em termos grupais. E a minha ascensão foi feita de uma forma natural. Um dia, a seguir um treino, ele fecha-me no gabinete e pergunta-me se eu quero ser o próximo treinador do Athletico Paranense e obviamente que lhe respondei que sim. A minha ascensão no Athletico Paranense foi feita de forma natural. Entrámos num período de estabilidade muito grande e transitou a maioria da equipa do ano anterior. Cheguei ao Athletico, e no final do primeiro turno a equipa estava em 19º lugar, com 16 pontos, numa posição extremamente difícil, de quase descida, e estávamos em mais duas competições. Na Taça dos Libertadores, onde eu digo que por sorte, nos calhou o River do Gallardo, e estávamos nos oitavos de final da Taça do Brasil, com o Flamengo do Doménec. Saímos das duas competições, mas saímos de forma honrosa. Nós, após a saída dessas duas competições, tivemos mais tempo para trabalhar e a equipa fez uma ascensão grande e acabamos em 9º lugar, que nos deu a oportunidade de disputar a Sul-Americana, no ano seguinte, que acaba com o Athletico Paranaense a chegar à final e a vencê-la.

Uma final onde o António Oliveira não esteve como treinador. Algum arrependimento por a saída do comando técnico do Athletico Paranaense ter sido antes da final?

Digo sempre que eu não me arrependo, eu aprendo. Eu aprendi muito. Hoje, tinha gerido essa situação, esse meu ímpeto, com mais maturidade. Ninguém pede para sair em duas semifinais e em nono lugar no campeonato brasileiro. Uma coisa é nós fazermos essa caminhada até à final e outra é podermos tocar na taça. Já houve adeptos do Athletico a dizerem-me que eu tenho de voltar para acabar aquilo que não acabei. O jogador que marcou o golo na final até me dedicou a vitória, mas a verdade é que eu não vivi aquele momento. Isso era o que eu mais queria, mas que tenho a certeza de que um dia vou vivê-lo.

Porque é que saíste?

Porque há situações do nosso trabalho, onde não gostamos de ter interferências. As coisas vão acumulando e acabamos por rebentar. A quente nós não devemos tomar decisões, nem dizer nada. Foi um erro que cometi. Mas, foi através dele que hoje sou uma pessoa e um treinador diferente. Ganhei essa bagagem e hoje vou gerindo as situações de outra forma, com muito mais tranquilidade e com muito mais experiência. Serve de aprendizagem, mas, em nada apaga a história que foi feita. O caminho que foi percorrido e o carinho enorme que eu tenho por o Athletico-Paranaense.

Começas por ser o filho do Toni e é com ele que te inicias como adjunto. Depois vais para o Brasil com um grande amigo dele, e alguém que te viu crescer, o Jesualdo Ferreira, e acabas por ser acolhido por outro amigo, o Paulo Autuori. A amizade também te foi abrindo portas?

Na minha vida há o meu pai, que indissociável de mim e deu-me a oportunidade de começar o treino com ele em 2012. Ele sabia, do ponto de vista académico, a formação que eu estava a ter e aliado a isso, os diferentes cursos UEFA. Estive seis anos com o meu pai, em dois contextos diferentes, e rapidamente percebi que fui preparado para aquilo. Ser filho do Toni é uma bênção.

O Brasil permitiu-te ser só o António Oliveira, sem esse peso de ser o filho do Toni?

Sim. No Brasil a visibilidade e reconhecimento são grandes e não existe essa questão. Em Portugal tenho de fazer mais para ter esse reconhecimento.

Em 2020 atravessaste o Atlântico para seres adjunto do Jesualdo Ferreira no Santos. Ainda há alguma coisa desse António Oliveira?

Sou uma pessoa completamente diferente. Nem sonhava a quantidade de coisas que aconteceram durante estas quase cinco temporadas no futebol brasileiro, e isso orgulha-me imenso. Em nenhum momento eu pensava que a minha carreira tivesse uma ascensão tão rápida como teve. Mas, ainda tenho muito para andar.

Vais para o Brasil com o terceiro nível de treinador e depois tiveste de voltar para conseguires entrar para o quarto nível.

Temos de andar muito para atingirmos o nível maior de treinador que é o UEFA Pro, o quarto nível, e eu só tive acesso à minha licença agora em maio. Já estava no Corinthians.

Treinas o Athletico Paranaense sem o quarto nível e quase que és obrigado a vir para Portugal e vais treinar o Benfica B.

Porque um dos critérios que está estabelecido é treinar nas ligas nacionais e o quarto nível para mim era uma independência enquanto treinador, para poder desempenhar a minha função em qualquer parte do mundo e poder estar descansado. Por exemplo, quando fui do Athletico Paranaense era eu que estava no banco, mas era o Paulo Autuori que aparecia na ficha. Eu quando estive no Santos inscrevi-me para tirar o UEFA Pro e não entrei, porque naquela altura ser adjunto numa primeira liga de uma equipa estrangeira era o 11º ou 12º critério. Levei uns não e acabo por entrar pelo critério de estar a treinar numa liga portuguesa, no caso o Benfica B. Foi importante para mim, mas representei com muito orgulho uma instituição que eu já tinha representado durante a minha formação toda enquanto jogador. Tive o maior prazer em poder fazer aqueles seis meses.