SPORTING Áustria, a maldição do leão
Sporting tenta quebrar jejum de vitórias em território austríaco. Seis jogos, dois empates, quatro derrotas e muitas… hecatombes. Será desta que Rúben Amorim quebra o enguiço?
GRAZ - O Sporting joga esta quinta-feira em Graz, cidade a cerca de 200 quilómetros da capital Viena, com uma ideia clara: colocar ponto final no jejum de vitórias em território austríaco. Sim, é verdade. Por incrível que possa parecer, os leões nunca ganharam, fora de casa, a equipas da Áustria.
A equipa de Alvalade jogou lá em seis ocasiões: dois empates, quatro derrotas, 4-16 em golos. Defrontou duas vezes o LASK Linz, outras duas o Rapid Viena, uma o Casino Salsburgo e o Swarovski Tirol. Fernando Vaz, Keith Burkinshaw, Bobby Robson, Carlos Queiroz, José Peseiro e Silas eram os treinadores nestas seis deslocações a território austríaco.
Só mesmo quatro golos marcados pelo Sporting na Áustria: Gonçalves e Lourenço em 1969, Sealy e Paulinho Cascavel em 1987. E outros grandes atacantes jogaram pelo Sporting na Áustria e não marcaram quaisquer golos: mais recentemente, Liedson, Balakov, Figo, Cherbakov, Cadete, Paulo Alves, Amunike, Pedro Barbosa e Sá Pinto e ainda Peres, Litos ou Sealy.
O último golo leonino em solo austríaco data de 30 de setembro de 1987, quando Paulinho Cascavel fez o 2-2 na derrota por 4-2 em casa do Swarovski. Ou seja, há quase 36 anos que nenhum leão festeja golos na Áustria.
O despertar dos oito da seleção
(Lask Linz-Sporting, 2-2, 1969/1970)
Entre jogos do Campeonato Nacional e da Taça das Cidades com Feira, os leões levavam notável andamento: 18-0 em golos. A moral estava, pois, em alta, porque em Alvalade os leões tinham vencido por 4-0. Em Linz o empate a duas bolas chegou e sobrou para o Sporting seguir em frente e oito jogadores tiveram menos descanso. Vítor Damas, Pedro Gomes, Alexandre Baptista, Gonçalves, Caló, Hilário, Peres e Nélson tiveram de levantar-se muito mais cedo do que os restantes jogadores na manhã seguinte ao jogo. Às 6.40 horas tomaram o comboio de Linz para Viena, depois o voo até Frankfurt e, finalmente, novo voo até Lisboa. A acompanhá-los esteve Manuel Marques, dedicado massagista do Sporting. O motivo era de força maior: a selecção nacional chamava-os para integrarem os trabalhos de preparação para o Portugal-Roménia, dez dias depois: 0-1, em Bucareste. Só Caló e Peres não foram titulares.
Cuidado com as montanhas
(Swarovski-Sporting, 4-2, 1987/1988)
Em Alvalade, na primeira mão, o Sporting goleou por 4-0, dois de Sealy e dois de Paulinho Cascavel. Por isso, a derrota na Áustria por 2-4 não colocou em causa a passagem à segunda eliminatória. Na equipa do Swarovski jogava Tomislav Ivkovic, guarda-redes dos leões anos depois, e o treinador era o mítico Ernst Happel. Verdadeiro problema foi a viagem para a Áustria. O avião fretado da TAP e que levou a comitiva leonina até terras austríacas não aterrou em Innsbruck, preferindo fazê-lo em Munique com a equipa a fazer o resto do trajeto de autocarro. A explicação foi simples: a TAP enviou emissários a Innsbruck para conhecer as condições do aeroporto da cidade e desaprovou-o por não ter gostado da ideia de o avião ter de voar entre montanhas algo apertadas. Como o Sporting não levantou, obviamente, qualquer problema, foi em Munique que os jogadores aterraram. Bem longe de Innsbruck.
Desastre em Salzsburgo e desastre de Cherbakov
(Casino Salzsburgo-Sporting, 3-0,1993/1994)
Noite fantasmagórica: o médio Muzek partiu o braço em choque com Figo sendo substituído, cinco cartões amarelos até à meia-hora, Sporting a aguentar o 0-0, sofrendo o 1-0 após o intervalo num remate de longe, Robson decide defender o resultado aos 85 minutos (trocando Cadete por Capucho), vê os austríacos reduzidos a dez homens (86 m) mas pouco depois (89 m) vê-os também marcar o 2-0, num lapso monumental de Costinha, forçando o prolongamento. Na segunda parte deste período surgiu o 3-0: o Casino marcara três golos em quatro remates à baliza leonina. Peixe, Carlos Jorge e Valckx estiveram impecáveis, com Paulo Sousa e Balakov muito abúlicos. Três dias depois da derrota com o Casino Salzburgo, Sousa Cintra decidiu afastar Bobby Robson. Já com Queirós no comando da equipa, os jogadores compareceram num jantar de homenagem ao treinador inglês. Cherbakov também. A seguir ao jantar, o promissor ucraniano foi vítima de um acidente de viação na Avenida da Liberdade, em Lisboa, que o deixou paraplégico.
Expulsão de Dani no dia dos 19 anos
(Rapid Viena-Sporting, 3-0, 1995/1996)
Vitória por 2-0 em Alvalade, na primeira mão, com golos de Sá Pinto e Paulo Alves, prenunciavam viagem tranquila até Viena. Na Áustria, o Sporting sofrera um golo cedo mas depois controlou muito bem as operações durante (quase) todo o jogo. O quase diz respeito ao minuto 89. Foi nessa altura que, no meio de tremenda confusão na área leonina, Stumpf fez o 2-0, empatando a eliminatória. Dani (que comemorava nesse dia o 19.º aniversário) levou dois amarelos em cinco minutos (85 e 90), o primeiro indiscutível por jogar a bola com a mão, o segundo, mais discutível, por pontapear a bola que estava em cima da linha lateral, pelo que o Sporting avançou para o prolongamento com menos um homem. Resultado: sofreu dois golos e passou o resto do tempo sem sequer conseguir pensar, quanto mais correr.
«Do you remember 02.11.1995?»
(Rapid Viena-Sporting, 0-0, 2004/2005)
Tranquila vitória em Alvalade, por 2-0, na primeira mão, golos de Tinga e Liedson. Logo a abrir o jogo de Viena, numa desmarcação de Rogério para Liedson, os leões estiveram perto do golo, mas Liedson, apenas com o guarda-redes Macho pela frente, fez o que raramente fazia: falhou. O Rapid foi adversário muito tenrinho e o Sporting só tremeu, embora ligeiramente, quando Hugo foi expulso, num forçadíssimo cartão vermelho: foi Lawaree quem tropeçou em Hugo e não este que derrubou o austríaco. Pela primeira ver na história das competições europeias, o Sporting saía da Áustria sem sofrer golos: nos quatro jogos anteriores sempre tinha sido batido. Os adeptos do Rapid procuraram jogar com o fantasma de nove anos antes, quando o Sporting baqueou frente ao mesmo adversário por 0-4: «Do you remember 02.11.1995?» era tarja colocada numa das bancadas por alguns dos 18 mil austríacos presentes no estádio.
A última cicatriz austríaca
(Lask Linz-Sporting, 3-0, 2019/2020)
Quando o leão terminou o jogo e a sua figura principal tinha sido um jovem a assumir a baliza, no caso Luís Maximiano – após a expulsão de Renan Ribeiro pouco depois da meia hora de jogo – pouco haverá a dizer de mais uma exibição cinzenta de uma equipa que, na altura, com Silas no comando, vivia muita turbulência. Ilori, Eduardo Henrique, Rafael Camacho, Miguel Luís, Jesé Rodriguez ou o jovem Pedro Mendes, jogadores que nunca se afirmaram em Alvalade, não fizeram esquecer as ‘estrelas’ que foram poupadas, no caso Bruno Fernandes, Mathieu ou Vietto. E os sinais foram claros. Um desastre após 45 minutos com dois golos sofridos e uma expulsão. Sem criatividade e pouca coesão coletiva esta foi a última cicatriz deixada em solo austríaco. Que, no caso, até foi um mal menor, uma vez que esta derrota tirou o Sporting do primeiro lugar da fase de grupos da Liga Europa e deixou de ser cabeça-de-série no sorteio da próxima ronda…