Villas-Boas já errou
Apelar ao bom senso e à elevação não é, seguramente, o melhor caminho para convencer o presidente da SAD a renunciar ao cargo
O presidente do FC Porto, André Villas-Boas, tomou posse, terça-feira, com a legitimidade da esmagadora votação de 80,3 por cento e de tudo o que isso representa, também, para quem foi derrotado. Quer, como se percebe, tomar conta o mais depressa possível da SAD e, para que isso aconteça, só precisa que partam aqueles que lá estão. Mas, pelo visto, não está fácil.
O ex-presidente do clube e ainda presidente da SAD, aquele que com um gesto poderia ter evitado tudo o que se passou na famosa, pelos piores motivos, assembleia geral das agressões, insultos e coação, o maior responsável por se ter chegado na sociedade desportiva a «uma situação limite», nas palavras de Villas-Boas, não quer de lá sair. Até parece que está difícil aceitar o resultado das eleições.
Villas-Boas ainda agora começou e já está a errar. Compreende-se, está na primavera das funções de dirigente, talvez prefira evitar confrontação mais forte numa altura em que precisa de zelar pela união e de não ferir o espírito das viúvas de quem está, com relutância, a deixar do clube.
Apelar ao bom senso e considerar a renúncia um ato nobre que elevaria os ainda administradores e presidente da SAD, porém, é tão óbvio como inocente. É difícil, também temos de reconhecer, saber qual o melhor caminho para tirar já da SAD aqueles que os sócios não querem que lá estejam.
O ex-presidente do clube e ainda presidente da SAD argumenta que não sai pelos interesses do FC Porto, que se sacrifica ao conforto da tribuna presidencial, onde poderia estar ao lado dos amigos, para estar no banco de suplentes e ajudar a equipa. Pode ser comovente para os mais sensíveis ou para os que andam distraídos há mais de 42 anos. É inútil lembrar quem está agarrado como lapa ao poder que os sócios consideram, esmagadoramente, que os interesses dos dragões estão mais bem salvaguardados com Villas-Boas, ou perguntar porque só agora se sacrifica a estar no banco de suplentes se considera que é lá que mais ajuda a equipa. Para quem gozava dos louros de usar da mais fina ironia, a piada faz-se sozinha. Talvez seja difícil, porém, encontrar alguém que lhe encontre graça.
Villas-Boas lamentou que o FC Porto, nesta transição, não seja um exemplo, como foram os «rivais mais diretos». Também não valerá a pena ir por aí contra alguém cujo comportamento só denuncia o desrespeito pela vontade de quem votou.
Somos todos mais aquilo que fazemos mais vezes do que aquilo que dizemos mais ou menos vezes. E o que está a fazer o ex-presidente do clube e ainda presidente da SAD enquadra-se na dignidade de outros comportamentos que já testemunhámos e de que ninguém terá saudade.
Villas-Boas prometeu um FC Porto moderno, organizado, arrojado, estruturado, transparente e financeiramente sustentável. Não se sabe, ainda, como lá chegará, mas os sócios deixaram bem claro por onde não querem que vá. E provavelmente ninguém levaria a mal se o presidente do FC Porto citasse o poema Cântico Negro de José Régio para dizer «só sei que não vou por aí».