Três reflexões desapaixonadas sobre os três grandes

OPINIÃO06.04.202206:55

Esta jornada foi perfeita para se avaliar a saúde desportiva do futebol dos três grandes. Houve de tudo, até um clube a queixar-se da arbitragem em jogos alheios

U M exercício - e não passa disso - interessante de se fazer é verificar quantos pontos necessitam os clubes para, nos seis jogos que faltam neste campeonato, alcançarem a pontuação do ano passado. Façamos esse exercício.

Ao FC Porto faltam-lhe apenas quatro para obter os 80 pontos do ano passado. Em seis jogos bastar-lhe-ia uma vitória e um empate, pelo que seguramente fará muitos mais pontos este ano.

Ao Sporting faltam 15 pontos. Ou seja, cinco vitórias nos seis jogos que faltam. Se, como diz Rúben Amorim, a equipa de Alvalade ganhasse todos os jogos que faltam, ficaria com mais três (88) do que aqueles que obteve em 2021, quando foi campeão.

Ao Benfica faltam os mesmos pontos. E só chegará aos 76, com que encerrou a época passada, se não desperdiçar mais do que um jogo, ou três pontos. Como ainda tem de se deslocar a Alvalade (já na jornada 30), e ainda ao Marítimo e a Paços de Ferreira, dir-se-á ser difícil. Até porque ainda é o único que tem, pelo menos, dois jogos da Champions para jogar.

Curiosamente, a título indicativo, ao Braga, que parece agora tão distante, só lhe faltam 12 pontos para atingir o score do ano passado - menos do que ao Sporting e ao Benfica.

Quer isto dizer que, em relação à época passada - e mudando o que há a mudar, nomeadamente a dificuldade dos jogos que ainda faltam -, o Porto é, de longe, a equipa que mais fez pela vida, melhorando substancialmente a sua performance. Com apenas quatro empates até à última jornada, tem de ir a Guimarães (próxima jornada), receber o Portimonense, ir a Braga, receber o Vizela, ir à Luz e receber o Estoril. Não é fácil, também, até porque não há jogos fáceis nesta altura do campeonato.

Neste particular, talvez seja o Sporting com a vida mais facilitada: ir a Tondela, receber o Benfica, ir ao Boavista, receber o Gil, ir a Portimão e receber o Santa Clara. De todos só o Tondela está claramente numa posição desconfortável, mas obviamente que um jogo contra o Benfica pode gerar qualquer resultado.


MAIS COMPARAÇÕES 

TALVEZ o mais comparável com os próximos seis jogos seja ver o que se passou nos últimos seis. E assim temos que o Porto, da jornada 23 até à 28 (inclusive) só perdeu dois pontos (em casa com o Gil Vicente). Se mantiver a passada, conseguirá mais 16 pontos, terminando com 92 pontos (mais 12 que em 2021) e sem derrotas, o que seria notável.

Já o Sporting nos últimos seis jogos perdeu também dois pontos: no Funchal, com o Marítimo. Continuando assim faria 86 pontos, curiosamente mais um do que na época passada em que foi campeão, mas desta vez seis pontos atrás do primeiro.

O Benfica perdeu sete - são mesmo sete - pontos. Dois no Bessa, dois em casa com o Vizela, e três em Braga, este fim de semana. Ou seja, dos 18 em disputa, os encarnados conseguiram 11. Se continuassem assim, fechariam a época com 72 pontos, ou seja, quatro pontos a menos do que no ano passado, mas a 20 pontos do primeiro e a 14 do segundo.

Pior, poderia teoricamente ser ultrapassado pelo Braga, não fosse o Braga ter perdido também sete pontos nos últimos seis jogos. Aplicando a mesma regra, os bracarenses não passariam dos 63 pontos, continuando a nove do Benfica, mas apenas com menos um do que na época transata.

Desta espécie de adivinhação com base em estatísticas passadas (e, no fundo, é o que fazem economistas e meteorologistas, quando preveem a longo prazo), verificamos que o Sporting e o Braga têm uma performance semelhante à do ano passado, ao passo que o Porto aumenta substancialmente a sua prestação, em contraste com o Benfica, que tendo feito uma má época em 2020/2021, piora, ainda, este ano.

Curiosamente, o Benfica gastou mais do dobro do dinheiro do Sporting em jogadores e substancialmente mais do que o Porto, pelo que a razão não está na falta de investimento, nem na penúria de recursos, mas nas opções feitas pela direção ou pelo treinador. Tanto uma como o outro mudaram, mas sem que se vejam mudanças. Sabe-se  - veja-se o Sporting - que por vezes leva tempo a encontrar uma forma de estar e um espírito mais competitivo, após uma mudança brusca e traumática.
 

Rúben Amorim, treinador do Sporting


O FUTEBOL QUE SE VÊ 

TUDO o que ficou para trás dito é mera contabilidade e teoria. Mas, no futebol jogado - e nesse ponto este fim de semana foi bem visível - o resultado parece-me o mesmo. O Sporting joga, talvez, um pouco melhor do que o fez na época passada; em contrapartida, sendo mais conhecido e havendo mais cuidado das outras equipas com ele, tem, por vezes, mais dificuldades em desenvolver o seu modelo de jogo. Na realidade, com o Paços de Ferreira teve momentos em que parecia desligado, ausente… Coisa que não se passou com o Benfica na Luz ou com o Porto, mesmo quando perdeu em casa, por 1-2, na primeira eliminatória da Taça de Portugal. A seu favor tem os jogadores que foi formando e que se revelam autênticos tesouros. Os dois Matheus (Nunes e Reis) são o maior exemplo, porque Gonçalo Inácio já no ano passado dera provas. Adán, Porro, Ugarte, Edwards, Slimani e Sarabia (este, infelizmente, não deve ficar) além dos indiscutíveis Coates, Palhinha, Pedro Gonçalves, Nuno Santos, Paulinho, Bragança, Tabata, Luís Neto ou Feddal, todos eles têm evoluído de forma notável com Rúben Amorim e com as experiências que foram tendo

Já o Porto, mesmo depois da saída de Luis Díaz para o Liverpool, manteve uma rotação elevadíssima. O facto de não perder há 56 jogos para o campeonato diz muito da equipa. Fábio Vieira, Vitinha,  Otávio, entre outros, passaram a nomes conhecidos do grande público com esta Liga. No jogo contra o Santa Clara, equipa que não é fácil, o Porto não deu hipóteses e o golo de livre é magnífico. Há que reconhecer o mérito a Sérgio Conceição, que é, pelo menos, tanto como o seu proverbial mau feitio.

Já o Benfica, que prometia mundos e fundos (na verdade era Jorge Jesus o arauto da grandeza), fica-se numa apatia constante. Excetuando Darwin Núñez, que merece uma referência positiva pelo muito que tem feito, nomeadamente golos, razão pela qual foi contratado, os restantes jogadores não são maus, nem desinteressados. Mas persiste uma sensação, desde o início da época, de que jogam juntos sem se conhecer. Individualmente são bons. Otamendi e Vertonghen são bons centrais; Weigl e João Mário jogam bem no meio campo e Rafa tem explosões notáveis. Mas quando estão juntos dá a ideia de que não têm nada a ver uns com os outros. E mesmo quando interagem e isso dá resultados, quando como esta semana, em Braga, em três minutos passaram de perder 0-2 para um empate a dois, o certo é que praticamente no minuto seguinte o Vitinha bracarense marcou um golo e o Benfica desfez-se, como tinha andado desfeito durante boa parte do jogo.

Em conclusão, por muito que se possa falar das arbitragens e das jogadas de bastidores (que estou certo deve haver) a classificação da Liga acaba por refletir o que se tem passado. Veremos se o Porto, com deslocações tão difíceis como Guimarães, Braga e Luz, aguenta a passada, ou se o Sporting ainda pode espreitar a vitória final, o que seria inédito num campeonato português, onde nunca nenhuma equipa a seis pontos a seis jogos do fim foi capaz de ultrapassar o primeiro. 
 

JOGAR FORA

BENFICA

Apesar de, por motivos vários, ter sido obrigado a escrever estas linhas antes do jogo com o Liverpool, espero que os deuses tenham sido favoráveis aos da Luz. Sempre em nome dos pontos para as equipas portuguesas, o que permite ter duas entradas diretas para a Champions, mais uma com pré-eliminatória. 


PENÁLTI 

Não vou discutir o penálti sobre Paulinho no jogo com o Paços. Foi ao VAR e o árbitro reviu e marcou. Não se pode dizer que foi inventado e sempre embirrei com a ideia da intensidade. Se um guarda-redes mete o pé, na disputa de bola e não lhe acerta, acertando, por outro lado, ainda que de leve, no pé do adversário, é falta. O mesmo se passa com as mãos dos defesas quando não se trata das normais disputas da bola. Refiro-me à mão de Vertonghen na cabeça de um jogador do Braga. Não é normal. Como não são normais as mãos nas costas e muitas outras decisões. Claro que existe muito teatro entre os jogadores, mas a intensidade é algo muito subjetivo acerca de ações que provocam efeitos muito diversos. É diferente se um jogador vai a correr, se está já desequilibrado, se está a saltar, ou outras situações. O melhor é ficar claro que lances desses são sempre punidos.