Salvador, Horta e Carmo

OPINIÃO13.07.202206:30

SC Braga ambiciona estatuto e títulos, mas assume-se inferior aos rivais: vende-lhes craques e admite-lhes pagamentos dependentes de sucessos desportivos que são insucessos minhotos

Otrabalho de António Salvador no comando do SC Braga elogia-se, menos pelos títulos e mais pela obra que dotou o clube de infraestruturas de primeira, dignas de clube que ambiciona, legitimamente, intrometer-se com mais regularidade na luta pelos sucessos no futebol português, quase sempre reservada a Benfica, FC Porto e Sporting. Percebe-se, pois, a indisponibilidade comunicada em público para facilitar a saída de Ricardo Horta para as águias. O internacional português, ao estatuto de capitão dos guerreiros, soma os títulos de melhor jogador no plantel de Artur Jorge e maior goleador na história dos minhotos.

O passe de Ricardo Horta tem muitos proprietários, mas os direitos desportivos são do SC Braga. Por isso António Salvador não abdica de contrapartida financeira milionária - 20 milhões de euros, precisamente o valor de mercado na plataforma transfermarkt! - para abrir mão de futebolista com qualidade muito acima da média. O jogador até é adepto benfiquista, a exemplo do irmão, André, com quem partilha o balneário bracarense. Mas, experiente, o futebolista também sabe que namoro não é sempre sinónimo de casamento…
Roger Schmidt, o alemão escolhido por Rui Costa para impor ordem nova no futebol das águias, elogiou Ricardo Horta no primeiro encontro com a comunicação social. Este facto sublinha-se pela raridade. A demonstração pública de interesse numa contratação é rara, pelo menos em Portugal, e o treinador, ao assumi-lo, colocou mais pressão nos ombros do presidente encarnado, que tem o processo nas mãos, por exigência, também pública, de António Salvador, que recusou conversas com intermediários.

Ricardo Horta, mais do que futebolista talentoso, diz-se, é profissional de mão cheia e, por isso, está focado apenas na preparação dos guerreiros para a temporada 2022/2023. A mudança para a Luz não está garantida, admite-se até destino diferente, mais próximo de Braga que de Lisboa, há Mundial no Catar na linha do horizonte e, recentemente, regressou, com golo, à Seleção, o que alimenta o sonho de integrar a convocatória de Fernando Santos. Logo, independentemente da camisola sobre o tronco, início de época (muito) bom, obrigatório!
Seja qual for o futuro do jogador, este Benfica precisa mais de Ricardo Horta do que Ricardo Horta precisa do Benfica. Para Schmidt, o atacante suprime lacuna num plantel extenso, extensíssimo, por combinar características diferenciadas e diferenciadoras com maturidade. O ainda bracarense, como o Darwin Núñez, movimenta-se, preferencialmente, pela esquerda, maltrata as defesas adversárias depois de escapar-lhes às marcações, socorre-se da velocidade para ganhar-lhes vantagem, tem capacidade de finalização acima da média e, no frente a frente com o uruguaio transferido para o Liverpool, ganha em capacidade técnica o que perde em potência física.

A contratação de Horta obriga a esforço financeiro considerável e a irredutibilidade de António Salvador é obstáculo que Rui Costa precisa de derrubar, da mesma forma que Luís Filipe Vieira trouxe Rafa de Braga para Lisboa em agosto de 2016, a troco de 16 milhões de euros, Frederico Varandas venceu os duelos por Rúben Amorim, primeiro, e Paulinho, depois, ou Jorge Nuno Pinto da Costa comprou Galeno para substituir Luis Díaz e David Carmo para suceder a Mbemba no eixo da defesa da FC Porto, ao lado de Pepe, resolvendo problema a Sérgio Conceição.

António Salvador ambiciona SC Braga maior e melhor, mas falta-lhe massa adepta para lutar com Benfica, FC Porto e Sporting. E a necessidade de dinheiro para alimentar o crescimento extraordinário do clube, por não poder transferir um Francisco Trincão para o Barcelona todos os anos (em agosto de 2020, o atacante de 22 anos rendeu-lhe 31 milhões de euros), fá-lo contradizer-se. Os guerreiros lutam por títulos, sim, mas reconhecem-se inferiores aos rivais quando aceitam vender-lhes os craques e admitem-lhe fórmulas de pagamento dependentes de sucessos desportivos nas competições nacionais que representam insucessos dos minhotos.