Os selecionadores de bancada
Como é que alguém que está de fora sabe o que se passa, verdadeiramente, lá dentro?
CONFESSO que fico incomodado de cada vez que ouço comentários negativos à nossa seleção. Não me interpretem mal: sei que ninguém está acima da crítica. E sei que há sempre espaço para melhorar, aprender e aceitar o que os outros têm para dizer. Mas não é a esse tipo de observações que me refiro. Falo das outras. As que esmagam e são maliciosas. As que saem sempre num tom jocoso, irónico ou destrutivo.
Ganhe, empate ou perca, esta seleção nunca está bem. Nunca tem mérito. Ou teve sorte ou não arriscou ou encolheu-se. Quando a cabeça fixa no bota abaixo, não há ninguém que nos valha. Aparecem logo os especialistas de bancada - alguns deles com obrigações ativas no jogo (shame on you) - que logo apontam o dedo acusador, a vomitar tudo o que acham ser erros, falhas ou más estratégias. Depois de tantos árbitros, políticos, virologistas e epidemiologistas, chegou a altura de sermos brindados com um universo cheio de selecionadores. Selecionadores imaculados, que sabem sempre tudo antes, durante ou depois do jogo.
É a turma do copo meio vazio. Nada está bem, nunca está bem. Mesmo quando trouxemos o caneco, estava tudo mal. Tivemos sorte. Exato. Essa turminha vive disto. Da busca pela falha. Nunca valoriza o mérito. E, neste caso, o mérito que salta à vista de todos: a mudança de chip que este equipa conseguiu. Passou de jogar muito e perder como sempre para ganhar. Ganhar competições, ganhar provas, ganhar taças. Chama-se cultura de vitória... Mas que importa isso? Não chega. Nunca chega.
Uma das coisas que me faz mais confusão é a leviandade com que se atiram atrocidades. Como é que alguém que está do lado de fora sabe o que se passa, verdadeiramente, lá dentro? Como é que alguém pode aferir, melhor do que aquele que acompanha tudo de perto, quem está mais cansado, menos motivado ou em vias de contrair uma lesão? Quem melhor do que um selecionador para saber isso?
«Joga o W e o D? Que horror, este homem é ultra defensivo». Resultado: 3-0 à Hungria, em Budapeste, com 60 mil húngaros em silêncio, no jogo de abertura. A mesma Hungria que depois encostou França e Alemanha às cordas. É chato, não é?
«Porque é que não joga o P e o R»? Jogaram. Infelizmente a seleção perdeu, porque perder acontece. Os outros também jogam e jogam muito. E também querem o mesmo que nós.
«Ah, espera. Se calhar devia ter saído o BS e entrado o BF mais cedo, ou o PG que nem jogou». Pois. Se a minha avó tivesse rodas era um trator. Mas nós não sabemos mais de quem sabe a sério.
É cultural, esta forma pequenina de (não) valorizar o que é nosso. Falta-nos mais salero para discutirmos firmemente o que realmente importa e menos pequenez de espírito para deixarmos, para quem percebe, os assuntos que cabem a cada um.
It is what it is.