O aleatório no caso de Debast
Debast reagiu de forma positiva após as criticas na seleção belga (IMAGO)

O aleatório no caso de Debast

OPINIÃO19.09.202409:00

«Foi o golo da pessoa certa, que nos ajuda», reconheceu Rúben Amorim sobre o central belga que terá sentido pela primeira vez na carreira que duvidavam das suas capacidades

O monumento que escapou do pé direito de Debast na medida perfeita da gaveta mais à direita à guarda de Chevalier é só mais um exemplo da efemeridade do momento quando se é futebolista, ainda mais do que para o mais comum dos mortais.

Se a descer todos os santos ajudam, lembrava-me a minha saudosa avó quando pequeno, no auge de uma sapiência profundamente gravada nas rugas, subir já depende de uma mentalidade que se apoia na força das circunstâncias. Esquecer o fator sorte, que se trabalha tanto como o evitar do seu contrário, embora não ao ponto de eliminar todos os imponderáveis, não faz sentido em jogo com tanta aleatoriedade.

Lembro-me das vezes que falei sobre o jovem central belga, antes sequer de ter alinhado num encontro oficial pelos leões, e de ter achado o mesmo que hoje, sem deixar espaço à dúvida. O potencial que tem não o permite. Seria preciso acontecer muita coisa para que Debast não resultasse numa equipa como o Sporting, que ainda por cima se apresenta há muito com o contexto certo: uma ligação forte entre quem treina e quem é treinado, e um modelo bem trabalhado.

Numa altura em que a predominância da procura pelo central-jogador em vez do central-destruidor fez diminuir a oferta dos portentos físicos dos anos 80 e 90, Debast é o pacote completo: forte nos duelos, pelo ar e pelo chão, assente numa boa dimensão física, rápido, focado e com capacidade de verticalizar com o passe, seja com o pé direito ou o esquerdo, além de poder saltar a pressão em condução. O ex-Anderlecht foi excelente decisão de mercado, que poderá tornar-se lucrativa no futuro. O portentoso golo que marcou, por muito provavelmente continuar a ser uma raridade, pouco acrescenta ao que de bom já lá estava.

A rosca infeliz na Supertaça levou a que vivesse algo inédito, tal o hype à sua volta. O da dúvida. Abanou, não só por cá, mas também na seleção. O tiro tornou-se catarse.

Ao momento menos feliz - que Amorim reconheceu agora, ao ponto de dizer que o golo surgiu na pessoa certa - ter-se-á juntado o regresso do mais experimentado Diomande e a boa performance de Quaresma. A lesão do último deu-lhe a oportunidade, e no palco certo, aberto para toda a Europa, tal como a situação dos lesionados o beneficiará no fortalecimento do estatuto na equipa. Sorte e azar existem. E há males que vêm por bem, embora dificilmente alguém pense mesmo assim. Talvez só mesmo a minha querida avó.