No futebol, os deuses não são eternos

OPINIÃO28.08.202107:00

Com Cristiano Ronaldo começa a criar-se um sentimento de nostalgia e a pensar-se como será, num futuro próximo, a Seleção Nacional sem ele

HÁ momentos particulares numa equipa de futebol que só podem ser lidos de dentro. A decisão de Massimiliano Allegri em deixar Cristiano Ronaldo no banco foi entendida pelo português como um sinal de que era altura de fechar as contas com a Juventus, depois de três anos que não ficam nas páginas douradas do livro de  memórias de la vecchia signora, nem terá lugar de grande destaque no museu de CR7.
Os jornais desportivos italianos já tinham dado sinais do que pensava Allegri sobre a renovação da Juve, o que significa que, tendo informação privilegiada de dentro do clube, mesmo que sem rosto, sabia-se que o novo treinador tinha uma clara ideia de que a construção do futuro e o regresso ao comando do calcio, agora que o Inter e o AC Milan ganham novo fôlego, não se faria com um jogador à beira dos 37 anos, mesmo que esse jogador continuasse a ser  um dos melhores do mundo. Não tanto pela idade, nem, sequer, pela diminuição de qualidades do jogador, que, por força de um elogiável profissionalismo se mantém ao mais alto nível, mas porque, como dizia «fonte próxima» do clube, Allegri quer criar um sistema e uma rotina de jogo que não tenha de passar sempre por um jogador, mesmo que seja alguém tão especial como é Cristiano Ronaldo.
Curiosamente, muito se tem falado, recentemente, do novo Barcelona, agora, sem Leo Messi. Para os mais arrebatados fãs do argentino, a saída de Messi é uma calamidade, mas para muitos outros barcelonistas, a saída de Messi obrigará o Barcelona a ser mais criativo, mais coletivo, mais diverso e, sobretudo, menos dependente de um homem, mesmo quando esse homem é um génio.
O mesmo problema, aliás, mais cedo do que tarde se haverá de colocar à Seleção Nacional. Portugal e o futebol português nunca deixarão de estar eternamente gratos a Cristiano Ronaldo, mas haverá, num futuro mais ou menos próximo (talvez depois do Mundial do Catar) em que o selecionador nacional, seja ele ainda Fernando Santos, ou quem o substituir no cargo, terá de tentar reconstruir o futebol da seleção portuguesa sem a referência óbvia, omnipresente e obrigatória de Cristiano.
 

Cristiano Ronaldo regressa a Manchester


Há, no entanto, que ter especial sensibilidade nestes casos, que causam melindre e, não raras vezes, se aproximam da ingratidão. Com Cristiano, os principais protagonistas, gente experiente e de bom senso, têm sido exemplares.
Allegri afirmou que foi Cristiano quem lhe disse que queria sair, que tinham falado (não sei se discutido) da decisão de ter o português sentado no banco dos suplentes, no último jogo da Juventus, mas que, já depois disso, Cristiano tinha dito que ficava. Afinal, não. E Allegri diz que entende, responsabilizando apenas as mudanças que o mercado proporciona.
Também Pep Guardiola foi elegante e simpático, dizendo que não era ele, nem o City, quem escolheria um jogador como Ronaldo, porque um jogador da sua dimensão é que escolhe onde quer jogar.
Há, como se vê, uma reverência que não esbanja toda a admiração que o futebol mundial, ao mais alto nível, deve a Cristiano Ronaldo. E acredito que o seu regresso ao Manchester United, até por se tratar do futebol inglês, mais aberto, mais leal, mais genuíno, lhe proporcionará condições para o brilho intenso da sua estrela. Inglaterra é uma boa escolha e Manchester faz todo o sentido.
Permitam-me, no entanto, o realismo de um certo sentimento de nostalgia por sabermos que nem estes deuses do futebol são eternos como, eventualmente, mereciam. Aconteceu com Pelé e com Garrincha, com Eusébio, Maradona e Platini e acontecerá com Cristiano e com Messi. É a vida.
 

O ESPLENDOR DOS MAIORES

Grandes clubes mundiais, como o Bayern de Munique ou o Liverpool, o Barcelona ou o AC Milan têm encontro marcado para Lisboa e para o Porto. Os que se apaixonam mais pelas vitórias do que pelos clubes nacionais acharão um transtorno, mas todos os que gostam verdadeiramente dos seus clubes e, em especial, do futebol português acharão que é uma bênção, e, sobretudo, uma homenagem à História do nosso futebol. Oxalá a pandemia comece a dar tréguas e a dar espaço a todo o esplendor que estes espetáculos prometem.
 

FEIRA DO LIVRO ABRIU AS PORTAS

A Feira do Livro já abriu as portas e ficará aberta ao público até 12 de setembro. Não se trata, apenas, de celebrar o livro, os seus autores e, sobretudo, os seus leitores. A Feira do Livro é um bastião da cultura, e, ainda mais do que isso, o essencial de uma ideia decisiva de que nenhuma sociedade evolui sem saber e que o maior de todos os valores de um país é o conhecimento. Em tempo de pandemia, o livro foi uma das poucas janelas que tivemos aberta de par em par, virada para o mundo. Um companheiro fiel. Um amigo sempre presente.