Meu querido Manel
O jornalista Vítor Cândido e o amigo Manuel Fernandes. DR

Meu querido Manel

OPINIÃO29.06.202418:44

Partiu um grande amigo, um amigo do peito, com quem mantive uma convivência fraternal ao longo dos tempos

A notícia chegou. Cruel: «Morreu o nosso querido Manuel Fernandes. Que tristeza!» Foi assim que o meu amigo José Barros, indefetível sportinguista, de Braga, sempre atento a tudo o que diz respeito ao nosso Sporting, me deu nota, em primeira mão, do infausto acontecimento. Fiquei em choque. Partiu um grande amigo, um amigo do peito, com quem mantive uma convivência fraternal ao longo dos tempos. Pelo que constava sobre o seu estado de saúde, talvez um desfecho algo previsível. Porém, não menos angustiante. Estou destroçado. E choroso. Partiu um grande amigo. Um rapaz da minha geração, que sempre soube granjear e cultivar amizades… Com toda a gente, sem exceção. Não só por ter sido um futebolista exemplar, respeitado e admirado por todos (companheiros e adversários), devido ao seu fair play e dignidade. Mas, sobretudo, pelo seu caráter e a sua maneira de ser humano, um homem simples e bom, amigo do seu amigo. Convivemos em profissões cruzadas: ele como futebolista credenciado eu como jornalista de A BOLA. Manuel Fernandes foi um romântico do futebol, apaixonado pelo clube e com amor à camisola. Como eram os sportinguistas no século passado. Fomos companheiros de longa data, de grandes jornadas, desportivas e sociais. De âmbito pessoal e familiar. De muitas e boas recordações. Aliás, é um bom pretexto para, um dia destes, aqui recordarmos as nossas vivências com algumas dessas memórias. Eia! Como naquele ano do Malcolm Allison em que o Sporting ganhou tudo a eito… como dizem lá na terra.

O Manuel Fernandes é um grande símbolo do Sporting, uma das maiores figuras da gloriosa história centenária do clube de Alvalade. Como enorme jogador, como treinador e como dirigente do clube. Será recordado eternamente como o Manel de Sarilhos, o rapaz humilde que um dia chegou ao Sporting para se consagrar como ídolo de gerações. Ele, que nunca saiu da sua querida terra natal. Ali nasceu, ali cresceu, ali viveu…

Merecidamente, Manuel Fernandes tem seu nome perpetuado na Porta 9 (o número da sua camisola) do Estádio José Alvalade. O futebol português vê partir um dos seus maiores ídolos de todos os tempos. E, seguramente, um dos seus mais versáteis e categorizados intérpretes. Tanto mais, sendo o futebolista com maior número de jogos disputados na primeira divisão… E um dos maiores goleadores de sempre. Reconforto-me com o facto de ter sido eu a realizar o seu último programa televisivo: Eu lembro-me de ti, o qual tem sido exibido ultimamente na Sporting TV.

Infelizmente, a doença vai dando conta de alguns dos nossos amigos. Há uma semana faleceu Carlos Valente, o árbitro internacional FIFA, outro rapaz da nossa geração. Há quinze dias faleceu o meu grande amigo Israel Matos Dias, um indefetível sportinguista, médico dentista de várias gerações de atletas e funcionários do Sporting, que a todos tratava gratuitamente, por amor à causa. O doutor Israel, do Grupo Stromp, era um rapaz da minha idade (colheita de 1945). E tal como eu, um romântico leonino do século passado. Agora foi o nosso Eterno Capitão quem nos deixou. Já é de mais!...

A emoção é tremenda. As lágrimas afloram… Sabem? É desmedida a sensibilidade de quem está prestes a fazer 80 anos. E sente que já se encontra na primeira fila pronto para partir. A propósito veio-me à ideia o poema O Tempo, do poeta brasileiro Mário Quintana, do qual aqui deixo um breve excerto: A vida é o dever que trouxemos para fazer em casa; Quando se vê, já são seis horas; Quando se vê já é sexta-feira; Quando se vê já é Natal; Quando se vê já terminou o ano; Quando se vê já se passaram 50 anos; Quando se vê já perdemos um amor da nossa vida…

Meu querido Manel. Descansa em paz! Até um dia destes!