Divisionismo maligno
Neste divórcio interno que se espera temporário, há que separar algumas considerações
O encerramento oficial da temporada desportiva 2023/2024 ocorrerá apenas no dia 30 de junho, mas os jogadores e staff técnico da Benfica SAD já seguiram para férias após o jogo com o Rio Ave. Procedimento normal com um plano na bagagem de cada atleta para ser cumprido durante o descanso de que irão beneficiar até à segunda quinzena de junho.
Ainda assim, a comitiva não logrou ter uma despedida calma e tranquila à saída de Vila do Conde. Como se não fosse suficiente saber-se que sócios e adeptos do próprio clube se encontram de costas voltadas o que fere de morte qualquer agremiação desportiva, decidiram os jogadores aplaudir, do centro do campo onde se encontravam e de forma muitíssimo envergonhada, apenas e só uma das bancadas com tons vermelhos e brancos (ignorando a outra bancada do exato lado oposto e com maior número de associados).
Neste ponto, cumpre relembrar que, previamente a esta atitude propositada dos jogadores, apenas por uma vez se ouvira um tom crítico mais aguerrido no Estádio dos Arcos: quando Roger Schmidt decide colocar os nervos à flor da pele todo e qualquer benfiquista que se preze ao substituir, durante o minuto 87’, Carreras por Bernat, um jogador fantasma em 2023/24 e contratado à última hora para se tentar corrigir o erro de casting que foi Jurásek (cujo investimento se espera não se transformar numa total imparidade).
Portanto, mesmo que a união benfiquista respire hoje um ar menos puro, a verdade é que pouco houvera no último jogo da época a registar. O problema chegaria mais tarde e já fora daquele que é o recinto desportivo propriamente dito. Pelo meio de impropérios que se têm vindo a acentuar desde Faro e enquanto se dirigia para o seu lugar cativo no autocarro, Roger Schmidt entendeu parar e fazer peito numa altivez desajustada daquela que passa por ter que ser, necessariamente, a perceção do seu profissionalismo. Foi, inclusivamente, travado por um agente da PSP que se apercebeu em tempo do ato e que motivou o arrastamento dos adeptos pelo corpo de intervenção em funções no local.
Posto isto, a análise que se retira friamente sobre a gestão do futebol profissional do Benfica na época 2023/24 resume-se ao resultado positivo da conquista da Supertaça (título sempre com distinto valor e contabilizado para a história) mas a clara, evidente e perigosa negatividade da suspensão de funções por tempo indeterminado da divisa E Pluribus Unum cuja definição resulta do n.º 2 do artigo 5.º dos Estatutos do Clube. Mas, pelo meio deste divórcio interno que se espera temporário, há que separar algumas considerações que, na minha ótica, têm sido veiculadas por alguns opinadores de forma menos prudente independentemente das boas intenções de cada um.
Ora, foi Leila Pereira, atual presidente do Palmeiras, quem referiu que não administra o seu clube segundo nota da torcida organizada. No caso da gestão do Palmeiras (que tem desbravado enorme sucesso desportivo e financeiro, não obstante a existência de eventual conflito de interesses pelo facto da presidente ser, ao mesmo tempo, patrocinadora e credora do clube), está claramente identificado um grupo de pessoas que sempre se manifestou contra a figura da presidente desde o início do seu mandato. Ela convive com essa crítica, dá a cara e manifesta o seu ponto de visão (com resultados bastante positivos pelo meio) enquanto declama para que surjam candidatos interessados empenhados em fazer mais e melhor.
Mas, por cá, o filme é outro pois a maioria dos comentadores optou por colocar a crise associativa do Benfica ao nível de um Pinto da Costa que perdeu o seu trono por apoiar uma minoria em discordância com os outros sócios e adeptos do mesmo clube. Ou, mais grave ainda, quando se debate a atual crise emocional da Luz exteriorizada por atos irrefletidos e condenáveis de lançamento de garrafas de água na direção do treinador com base na selvajaria vivida em Alcochete em maio de 2018.
Sejamos honestos intelectualmente e puxemos a fita atrás: os objetos atirados na direção de Schmidt nos dois jogos frente ao Farense não surgiram da minoria organizada. E, já agora, em algum momento da sua história, esteve o Benfica refém dessa ou de qualquer outra minoria?