Benfica e o caminho para sair da crise
Alguém vai ter de dizer a Roger Schmidt que ele só poderá contar para a solução se deixar a teimosia de todos os dias aumentar o problema
Um pouco de lucidez, se faz favor. O Benfica vive um caos emocional. Quando a equipa joga, e mesmo quando mostra verdadeiro desejo de fazer mais e melhor, como aconteceu no jogo com o Rangers, percebe-se a ausência de alegria em jogar à bola e quando isso acontece tudo sai mal e as soluções da saída da crise, ou como dizia Otamendi na sua expressão mais popular e franca, da saída «desta situação de merda», escondem-se atrás de insensatez e do ruído.
É verdade que alguém tem de dizer muito claramente a Roger Schmidt que ele só contará para a solução se deixar de, todos os dias, contribuir para aumentar a dimensão do problema. Não é com uma superioridade virtual que o distancia do adepto comum, muito menos com a tentativa falhada do reconhecimento de uma realidade que ninguém vê, que se consegue fazer triunfar a ideia de que já se vê uma luz ao fundo da crise escura do túnel.
Sejamos claros. Para já, o que se pode constatar é que esse adepto comum, que incomoda e desconforta Schmidt, não acredita que haja solução com a continuidade do treinador alemão. Rui Costa também não terá dúvidas de que é isso que a maioria dos benfiquistas sente, mas ele é o presidente e a sua responsabilidade é de natureza bem mais complexa e não deve admitir a tomada de decisões mais emotivas do que racionais. É admissível e expectável que no momento atual da época um clube como o Benfica não se comporte, mesmo em tempos de profunda crise, como um velho clube de bairro, que ainda procura resolver tudo a chicotadas.
Até porque o problema deste Benfica não é, apenas, o desnorte do treinador. É muito mais do que isso, e a administração do clube tem de começar por fazer uma importante autocrítica e perceber como foi possível gastar tanto dinheiro e ter tão poucos resultados, em especial, na escolha atabalhoada de reforços que apenas se têm mostrado ótimos a reforçar o banco dos suplentes.
Mas é neste momento e com os meios de que dispõe que o Benfica tem de encontrar soluções e tem de dar a volta à profunda crise de qualidade do seu futebol, sim, mas, acima de tudo, de identidade.
Julgo que o trabalho mais urgente será o de voltar a unir a equipa e levar os líderes de balneário a encontrarem uma plataforma de entendimento, capaz de ajudar um treinador que em cada dia que passa se sente mais isolado e mais perdido num país que, antes, julgara encantador e dócil.
Admito que não seja fácil a tarefa desses líderes. O plantel será diverso na qualidade técnica, mas também na qualidade humana. Há demasiadas dúvidas sobre a equipa nuclear para haver estabilidade. Ninguém se conforma por não ser escolhido e, pior, ninguém entende bem por que razão foi escolhido e por que razão foi deixado de fora. E só a cabina saberá, ao certo, a dimensão da crítica a certas preferências de jogadores que têm, indisfarçavelmente, um estatuto diferente e aos quais se admite um nível mais baixo de trabalho e de comprometimento no jogo.
É, pois, verdade que se tem de considerar inadmissível que Schmidt não tenha resolvido, na sua cabeça, nem o onze, nem, sequer, o sistema. E, no entanto, a prioridade que salta à vista é a de resolver a insegurança, a instabilidade, a identidade do grupo e escolher, sem hesitações e dúvidas existenciais, o caminho para acabar a época na melhor condição possível. Mais importante, é urgente reavaliar os objetivos a atingir. Por exemplo, o Sporting de Rúben Amorim só tem olhos para o campeonato. Alguém ainda acha que no Benfica o objetivo possa ser diferente?