Aqui me confesso incréu, agora que renovo a esperança

OPINIÃO10.09.202004:00

Não me tendo convertido a nenhum radicalismo político, ou sequer a piedosas instituições que fazem do bater com a mão no peito um dos seus gestos preferidos, aqui estou eu, qual Egas Moniz com a corda ao pescoço, a pedir desculpa aos leitores, ao Eng.º Fernando Santos e aos jogadores da seleção.

Levo isto a sério, e na semana passada, ainda que à margem da crónica principal, escrevi as seguintes linhas, referindo-me à seleção: «A nossa equipa, apesar de manter o essencial das rotinas e dos nomes, parece-me (mas isto é subjetivo) já no plano descendente da excelência que teve. Oxalá as minhas impressões estejam erradas.» Não fora este último período, em que apelava a Alá todo misericordioso, e mereceria as penas do Inferno. Porque a minha impressão subjetiva estava errada, radicalmente errada. A seleção, como demonstrou nos últimos sábado e terça-feira, está ali para as curvas. E quem diz para as curvas, diz para as trivelas, os livres em montanha russa, os passes milimétricos.

Esta pandemia há de fazer-nos mal à cabeça, mesmo que o vírus não nos ataque. Agora, quando a Espanha já aceita um punhado de espectadores nos estádios (com surtos atrás de surtos pelo país), nós continuamos a ver estádios vazios. Sou daqueles que acha que futebol sem público é como um jardim sem flores, ou qualquer coisa do género, mas manda a verdade dizer que nem isso, nem o Dragão vazio no jogo contra a Croácia, impediu que fosse um dos jogos mais conseguidos da nossa seleção. E nem o deserto Friends Arena em Solna, Suécia, impediu que Ronaldo assinasse duas obras de arte. Entre os 101 golos marcados pelo mais querido jogador dos adeptos do Sporting e do país, a jogada e remate que ontem selou o segundo (e 101.º) deve ter sido das mais belas. O livre que marcou o 100.º golo foi, igualmente, soberbo, mas destes já nos vamos habituando. Ocorre-me, aliás, que poderemos, até, ficar mal-habituados porque o que em Ronaldo parece fácil, óbvio e evidente, está ao alcance de muito poucos. No jogo na Suécia, após a entrada à margem das leis que Svensson fez sobre o nosso João Moutinho, se Ronaldo não estivesse em campo haveria, pelo menos, dois jogadores capazes de transformar o livre em golo: Bruno Fernandes e Raphael Guerreiro. Acontece que Ronaldo tem, sobre qualquer um dos dois, uma vantagem: falha muito menos, o que equivale a dizer, se preferirem, que acerta muito mais. E, quando o próprio Bruno Fernandes nos diz que no treino o capitão marcou mais quatro ou cinco golos daqueles, estamos conversados.

Por isso, caro engenheiro e caros jogadores da Seleção Nacional, aceitem lá as desculpas de quem vos via a perder qualidade. São bons e estão ao melhor nível. Ressalvo apenas uma coisa de que não têm culpa: por que razão saiu o verde do equipamento nacional? Jogamos só com meia bandeira? Não costumava ser assim…

Felizmente há acordo… e lucro!

Também escrevi na semana passada, referindo-me à dívida do Sporting ao Braga pela contratação do treinador, Rúben Amorim, que «a ideia de um clube que pode ser caloteiro não me agrada, e penso que não agradará a muitos sportinguistas do coração».  Eis que os dois clubes chegaram a acordo e eu felicito os negociadores por o terem conseguido.

O Sporting poderia ter razão moral, quando explicava que a pandemia tinha interrompido a vida normal dos clubes. Só que… continuou a vender e comprar jogadores e não caía nada para o lado do Braga. É igualmente verdade que o Braga, sobretudo o seu presidente, António Salvador, se esmifra todo contra o Sporting e é todo ternuras com o Benfica. Que preferiu fazer charivari na praça pública, e não resolver com discrição e eficácia um problema para o qual teria de haver acordo. Mas, colocando tudo isto nos pratos da balança, e gostando eu de dar razão ao Sporting… não posso, em consciência dá-la. Não basta uma parte vir dizer que há alterações de circunstâncias; seria necessário que alguém independente o decretasse. A Liga poderia ter dito que haveria uma moratória nos pagamentos devido à situação excecional, mas, que eu saiba, nunca o fez. A ser assim, e sublinhando que o acordo a que chegaram ambos é a melhor solução, digamos que argumentação do meu clube era fraca, o que permitiu ao sr. Salvador uns minutos de razão. Felizmente já a perdeu.

Outro assunto vindo à baila é o dinheiro que o Novo Banco perdeu com as VMOC (Valores Mobiliários Obrigatoriamente Convertíveis) sportinguistas. Terão sido cerca de 186 milhões de euros, de facto muito dinheiro que, no fundo, acaba por ser suportado pelo Fundo de Resolução. Há quem diga que é pelos impostos dos portugueses, e só essa possibilidade deveria ser impedida. Porém, há que referir que não são só os VMOC sportinguistas a pesar nas contas. Se olharmos para o outro lado da Segunda Circular, verificamos que o presidente do Benfica é responsável por 225 milhões de dívida ao mesmo banco.

Estes casos diferentes, mas semelhantes, indicam que as questões financeiras ligadas às SAD devem ser muito mais escrutinadas do que são. Não deveria ser possível ao Sporting continuar a ir ao mercado sem o acordo que fez com o Braga - digo-o contra o meu próprio clube, porque tento fundar-me em valores - e a CMVM e outros organismos deveriam ser muito mais escrupulosos com a idoneidade financeira dos presidentes e administradores das SAD. Claro que Luís Filipe Vieira não será o único; provavelmente nem é o caso mais grave (esta semana, soube-se que o dono do Feirense tem uma casa de apostas, o que além de ser ilegal, mostra onde podemos chegar, de forma escancarada); mas o presidente do Benfica, até pela força da marca que lidera, é emblemático.

De resto, outra boa notícia é o facto de o Sporting ter registado lucro nas contas 2019/2020 (12,5 milhões). Curiosamente é, mais ou menos, o mesmo montante que terá de pagar por Rúben, até maio do ano que vem. Mas, se é de elogiar a gestão que conseguiu o lucro, há que lembrar aos associados que isto não é o fim da crise. O Sporting continua com capital próprio negativo e a batalha pelo rigor das contas terá de se prolongar. A parte dos sócios que mostrou sempre tanta desconfiança, compreenderá agora a necessidade de venda de jogadores e a forma, mais ou menos errática, em que o clube andou.

E há equipa?

Aproximadamente à hora em que finalizava este texto, ocorreu um treino com a equipa do Marítimo, em Alcochete, que não foi transmitido. No próximo domingo haverá um marco importante, com a receção em Alvalade (à porta fechada…) do Nápoles. Porém, do que nos foi dado ver, o Sporting promete alguma coisa.
O último jogo que vi (em boa verdade, parte de jogo), contra o Valladolid, fiquei bem impressionado, como ficara no treino contra o B-SAD e o Portimonense. Mas quando cheguei a casa, após compromissos vários, já o jogo ia adiantado (65’) e estávamos a perder por um. Amaldiçoei não sei quanta gente até ver, pela segunda vez nesta pré-epoca, o Sporting dar a volta. Primeiro com um excelente golo de cabeça de Feddal e depois através de um penálti marcado por Jovane. Wendel é cada vez mais o maestro de uma equipa onde há muita juventude e poucos a transitar da época anterior. No final do jogo, dos habituais titulares da época passada, restavam Coates, Borja, Wendel, Jovane e Vietto. E isto se revertermos ao final da época; porque se estivermos a falar de há um ano, as contas seriam diferentes. Renan, Mathieu, Acuña, Bruno Fernandes, Raphinha, Luiz Phellype eram, então titulares.

Penso que a contratação de Rúben Amorim, apesar de todas as dúvidas (até éticas) que se possam levantar, foi uma boa aquisição e que o trabalho que está a ser desenvolvido mostra mais ambição e, sobretudo, maior profissionalismo e planificação. Espero que assim seja e que, à pergunta «há equipa?» a resposta seja um claro sim.