A nossa mania das grandezas
Ronaldo e Fernando Santos celebram a conquista da Liga das Nações em 2019 (IMAGO)

Opinião A nossa mania das grandezas

OPINIÃO01.07.202412:00

Portugal é candidato, mas não favorito. Palavras sábias de Roberto Martínez

Sou do tempo em que a qualificação de Portugal para a fase final de uma grande competição era um feito por si só. Mas ninguém tem culpa disso, a não ser os pais que me trouxeram ao Mundo. Também guardo pouca paciência para a conversa geracional de «no meu tempo é que era» e «os jovens hoje isto e aquilo», portanto atalhemos caminho e dirijamo-nos ao que interessa.

Os portugueses têm, com a Seleção Nacional e desconfio que com o País em si, uma relação meio esquizofrénica. Ou somos péssimos, ou somos os melhores, e só a nossa própria incompetência nos impede de demonstrá-lo cabalmente ao Mundo.

Não sei exatamente por que razões (há sempre mais que uma), a determinada altura passámos a achar que somos tão grandes quanto os maiores da Europa e do Mundo. Teve a ver com a exportação de talento, certamente. Vimos cada vez mais e melhores jogadores portugueses a brilhar noutros campeonatos e deduzimos daí, de forma bastante linear e rústica, que a Seleção, por maioria de razão, teria de ser candidata a ganhar tudo o que mexe.

Passámos a ser de tal forma exigentes que o único selecionador que até hoje conquistou títulos seniores é uma espécie de mal amado porque, diz-se, «a equipa não jogava bem». Espero que dentro de duas semanas possamos juntar o nome de Roberto Martínez à lista de vencedores que é, por ora, exclusiva de Fernando Santos. Mas pelo andar da carruagem mediática desconfio bem que, se ele ganhar, será pouco mais amado que o antecessor. E porquê? Porque perdeu com a Geórgia.

Na verdade sabemos que é porque não convocou, ou não põe sempre a jogar, os jogadores que cada português achava, consoante a cor clubística, serem as melhores escolhas.

Mas agora Portugal perdeu com a Geórgia e foi um ai-Jesus! Não interessa se a Geórgia precisava do resultado e Portugal entrou em campo a saber que seria primeiro do grupo. Cheguei a ouvir que se tratou da «pior derrota de sempre» da Seleção numa fase final. Peço desculpa pelo pragmatismo, mas quer-me parecer que as piores derrotas foram todas as que nos deixaram fora das competições. Sobretudo contra Marrocos, duas vezes.

Portugal é estruturalmente melhor que Marrocos, e por isso essas duas derrotas foram as piores, a par das de 2002 contra Estados Unidos e Coreia. De resto perdemos com França, Espanha, Bélgica, Alemanha, República Checa, Uruguai e Grécia. Temos ganho a Inglaterra e aos Países Baixos.

A nossa mania das grandezas faz-nos pensar que pertencemos ao grupo dos favoritos à conquista de grandes competições, mas a realidade diz-nos que a verdade não é bem essa. Temos dos melhores jogadores do Mundo? Sim, três ou quatro. Os outros são de um modo geral muito bons, mas há outras seleções carregadas de talentos. Alguns com nomes esquisitos. Além disso, um naipe de bons jogadores não faz necessariamente uma boa equipa, e não é com meia dúzia de treinos por ano que um selecionador resolve o problema.

Há um conjunto de seleções sucessivamente favoritas à conquista dos grandes títulos: Alemanha, Espanha, França e Itália, às quais acrescem Brasil e Argentina nos Mundiais. Portugal pode vencer qualquer uma delas, certamente. Mas não é favorito. Faz parte de uma segunda linha que por vezes surpreende. Tenhamos a humildade de perceber isso e de não achar que nos caem os parentes na lama por ter perdido com a Geórgia num jogo a feijões. Perder com a Eslovénia, isso sim, poderia tornar-se o pior resultado de sempre numa fase final. Se bem que Marrocos...