Portugal: comandar seleções não é o mesmo que treinar um clube
Portugal tem em aberto a passagem à 'final-four' da Liga das Nações; este texto não é sobre o jogo de quinta-feira com a Dinamarca, bem pelo contrário. Mas, já agora, este serve de exemplo para algum realismo
Quando era criança, Portugal apurou-se pela segunda vez na história para uma grande prova de seleções (Euro-84). E logo depois pela terceira (Mundial-86), ambas com milagres dificeis de replicar — um penálti contra a União Soviética na Luz assinalado após falta cometida longe da área e um remate épico de Carlos Manuel em Estugarda que fez Portugal vencer a Alemanha contra todas as expectativas, num daqueles episódios que só o futebol, entre as modalidades coletivas, permite acontecer. Depois passaram-se mais 10 anos e fomos ao Euro-96. Falhámos o Mundial-98 e finalmente tornámo-nos presença habitual nas fases finais, não falhando nenhuma desde então. Convém não esquecer que as fases finais foram sendo alargadas, mas não é isso que vem agora ao caso.
O que vem ao caso, antes de mais, é ter noção da dimensão histórica de Portugal perante os grandes colossos europeus e mundiais. Portugal tem grandes jogadores — mas perguntem aos dos anos 70 e 80 se não os havia por cá também? Gerações de ouro? A de 1980 nada era de deitar fora. E a dos anos 60? E a própria geração de ouro, resultante dos mundiais de juniores de 1989 e 1991? Acontece que lá fora havia outros melhores — ou regularmente melhores, como foram sendo sempre, passe a redundância.
O Euro-2000 foi brilhante do ponto de vista exibicional (eventualmente inigualável), o Mundial-02 sofrível, o Euro-04 e o Mundial-06 muito bons (aqui sim, a geração de ouro a funcionar, ainda com Figo e o diamante chamado Ronaldo), o Euro-08 e o Mundial-10 normais, o Euro-12 muito bom, o Mundial-14 péssimo e o Euro-16 paranormal. O Mundial-18, o Euro-20, o Mundial-22 e o Euro-24 normais.
Vamos aos bons: no Euro-84 (meias-finais), havia uma comissão técnica de quatro treinadores (Toni, José Augusto, Fernado Cabrita e António Morais); em 2000 era Humberto Coelho o selecionador; em 2004 e 2006 Scolari; em 2012 Paulo Bento; em 2016 Fernando Santos.
Todos, ou quase todos, estes treinadores fizeram o seu percurso em clubes, com relativo sucesso, mas os melhores momentos foram vividos na Seleção, nalguns casos em mais que uma seleção (veja-se Scolari).
Se calhar treinar seleções não é mesmo como treinar clubes. E se calhar por isso devíamos ter mais pudor na hora de reclamar questões técnico-táticas quando isso, para quem se encontra de três em três meses, é o que menos parece contar.