A cruz de Jesus e o sacrifício do Benfica

OPINIÃO29.12.202105:55

A Direção perdeu-se em assuntos laterais e não foi ao ponto essencial para manter a estabilidade do plantel mais caro da nossa Liga

SEM milagres, com fuga oportunista, começaram a emigrar os fundamentalismos que se repetem no tempo. Houve quem tenha manifestado a convicção de se tratar de um plano para criar situação irreversível e lucrativa. O calvário de Jesus agudizou-se nas declarações de Pizzi no balneário, após a derrota no Dragão. Jesus afastou-o, por isso, dos trabalhos do plantel. Pizzi passou a treinar isolado, enquanto os colegas se terão recusado treinar, em solidariedade com um dos capitães de equipa, mas o Benfica alterou o treino para a tarde. A onda de desilusões, com um plantel valioso e caro, criou um inferno inexplicável. A construção de um plano de saída sempre deve ter estado preparado. Os títulos na imprensa transformaram-se num juízo final. Jesus exagera sem necessidade, mas com objetividade e, quando vence, não lhe falta claque alargada na comunicação social. Nunca se conseguiu levá-lo a deixar de ser egocêntrico e a saber contribuir de forma tranquila, evitando expressões muito infelizes. A conferência de imprensa, sem direito a questões, foi um momento breve, na qual Rui Costa oficializou a rescisão, desejando felicidades a Jorge Jesus. O treinador afirmou que julgava que iria ser a solução, nunca o problema, e portanto foi a melhor decisão para ambas as partes. Ficou a ideia de retirada ardilosa, num plano inteligente de antecipação à Direção, que deixa o clube numa situação complexa. O Benfica, o presidente e a sua Direção revelaram fragilidade, incapacidade para resolver com eficácia e rapidez uma navegação à vista, que enfraqueceu todos. Depois de elevadíssimos investimentos, que acabaram por não dar o resultado desejado e as vitórias a não surgirem, as exibições erráticas e a relação do treinador sempre instável com os jogadores, já anunciava um ciclone destrutivo. Jesus vai sair (exigindo os valores do seu contrato) e um dos maiores derrotados será a Direção do clube, particularmente o seu presidente que tolerou uma continuidade que deveria ter sido estancada. Rui Costa e a sua Direção foram responsáveis pela indefinição e falta de decisão definitiva atempada. Um grande clube nunca pode ter soluções pequenas, nem perder jogos em simultâneo, numa época em que interferências externas (encontro de Jesus com dirigentes do Flamengo, aceite por Rui Costa) foram determinantes. Rui Costa conhece bem Jesus e os seus métodos e a (in)capacidade de comunicação. O principal erro foi a falta de um projeto coerente e de uma estratégia qualificada, na qual o treinador deveria ter sido outra escolha. Em vez disso, a Direção perdeu-se em assuntos laterais e não foi ao ponto essencial para manter a estabilidade competitiva do plantel mais caro da nossa Liga. A suspensão de Pizzi não é um facto isolado mas o momento definitivo de eventual fuga para a frente e com muitos milhões. Jorge Jesus deixou de ser o treinador do Benfica. E o clube? Vai continuar uma nau sem rumo e projeto indefinido? 
 

Jorge Jesus deixa o Benfica um ano e meio depois de ter regressado à Luz 


VIOLÊNCIA NO FUTEBOL 

NO jogo Paris FC contra Lyon o futebol foi derrotado pelas agressões, que instalaram um caos intolerável. Esse jogo da Taça da França foi invadido por encapuzados que obrigaram os adeptos a refugiarem-se no relvado e mesmo a abandonarem o estádio, numa fuga por segurança. Invasores embriagados foram expulsos com carga policial. O Lyon corre o risco de ser eliminado da Taça de França pelos incidentes, cuja responsabilidade o presidente do clube atribui a adeptos infiltrados do PSG. A França vive momentos de muita violência associada ao futebol, de forma crescente e nem as penalizações mais duras conseguem travar esta onda destrutiva, que pode causar danos irreversíveis ao futebol francês.  


TAÇA DE PORTUGAL 

VOLTOU a prova mais tradicional do nosso futebol, agora nos oitavos de final. O Portimonense foi a Famalicão empatar, apurando-se nas grandes penalidades. O Tondela eliminou o Estoril. O Casa Pia esteve prestes a conseguir surpreender, mas o Sporting conseguiu o apuramento. O Leça venceu, nas grandes penalidades, o Paredes. O Mafra superou o Moreirense. O Rio Ave apurou-se, nas grandes penalidades, perante o B. SAD. O Vizela venceu o Braga. O FC Porto goleou o Benfica, num jogo memorável para os azuis e brancos (com Vítor Bruno e João de Deus nos respetivos bancos, por castigo a Sérgio Conceição e Jorge Jesus). Apuraram-se para os quartos de final: 5 clubes da Liga, 2 clubes da Liga 2 e 1 clube do Campeonato de Portugal. 


MERCADO COM ALGORITMOS 

C OM tanto por resolver, para que o futebol mundial seja cada vez mais fantástico e motivante, a FIFA decidiu criar um suporte tecnológico para atribuir a cada jogador o respetivo valor. Mesmo que as intenções sejam criar referências do valor de cada jogador, para evitar inflação nas transferências, acaba por se cair numa lógica totalitária oposta ao funcionamento do mercado. Investigar transferências que possam servir para contabilidades estranhas é tarefa de instituições específicas, autoridades judiciais, controlo de regulamentações e procedimentos de empresários. Se já existem mecanismos e legislação, basta investigar e fazer cumprir a lei. Tentar controlar o valor de todos os jogadores do mundo com algoritmo específico, além de exagero megalómano desvirtua a liberdade de opção. As regras têm de ser cumpridas e o tal algoritmo surge como tendência para um controlo absoluto que nunca se pode aceitar.


APRENDER COM OS ERROS 

HÁ várias formas de aprofundar o conhecimento. O erro é um dos processos que a inteligência nunca desperdiça. Claro que em todos os casos há sempre quem esteja à espera de oportunidades para passar pelo meio dos pingos da chuva sem se molhar, mas esses aparecem em todos os pântanos. Recentemente foi decidido que nenhum jogo de futebol se pode iniciar, caso uma equipa apresente menos de 13 jogadores. Decisão unânime das diversas entidades do futebol em Portugal. Não seria preferível que a escolha designasse o mínimo de 15 jogadores, evitando facilitismos e mantendo o rigor indispensável com o máximo cuidado e o mesmo número de atletas por equipa, para que todos tivessem as mesmas condições? Por esse facto e atendendo ao precedente de Palhinha, que alterou os regulamentos e consequências da aplicação do quinto cartão amarelo, a meio da competição, as decisões têm de ser pensadas com equilíbrio. Assim, na nova lógica de definição de um número de jogadores para se poder realizar um jogo, a repetição do encurtado jogo do Belenenses SAD com o Benfica, no Jamor, deveria acontecer, de acordo com as novas regras que, mais uma vez, dividem o campeonato em dois (antes e depois do número mínimo de jogadores por equipa). Esperemos que não seja caso para o Tribunal Europeu. A maior falha é da tutela do futebol profissional, por não ter antecipado decisão adequada às realidades da pandemia Se tivessem existido mais reuniões para análise das competições, não seria preciso correr atrás do prejuízo  mas antes ter a capacidade de antecipar os problemas, para mais facilmente encontrar uma solução. É impensável que tantas instituições não apresentem, sistematicamente, sugestões que, baseadas nas realidades, permitam avançar com ponderação. O diálogo e o contraditório permitem decisões que envolvem todos e nunca por exclusiva imposição do topo da pirâmide. Os debates para criar estratégias de desenvolvimento são imprescindíveis. Que as imperfeições sejam corrigidas para não mais se repetirem: basta falar, saber ouvir e decidir. Não são os casos que devem originar as alterações, mas essencialmente a capacidade de antecipação, para que não se criem problemas com eventuais soluções, a meio da competição. 
 

REMATE FINAL  

— Karl-Heinz Rummenigge considera Luís Campos como o melhor diretor desportivo do mundo, dando o exemplo do que fez no Mónaco ao contratar jogadores excelentes, que garantiram o título, por valores aceitáveis. Depois, os mesmos valorizaram-se bastante e foram vendidos aos melhores clubes do mundo com mais-valias enormes. Atualmente, é um dos maiores protagonistas do futebol mundial que prestigia o nosso país. 

— Taça de Portugal: quartos de final e emparelhamento das meias-finais: Leça-Sporting, Vizela-FC Porto; Rio Ave-Tondela, Portimonense-Mafra (1.ª mão a 1 e 3 março; 2.ª mão a 19 e 21 de abril).

Para todos, um feliz 2022 com muita saúde.