A história dos Mundiais: 1.ª parte

Ciclismo A história dos Mundiais: 1.ª parte

CICLISMO05.08.202318:50

O primeiro campeonato do mundo da história do ciclismo realizou-se em 1927, até esta data e durante muitos anos existia o “Grande Prémio de Wolber”, uma corrida de grande prestigio que se corria em França, a qual era considerada como uma espécie de «campeonato do mundo não Oficial». No Congresso de Paris em 1920, representantes da Bélgica, França, Itália e Suíça que eram na altura as maiores potências do ciclismo, solicitaram à UCI (na altura designada por F.I.C.P.) a criação de um Mundial para profissionais, dada a forma como a modalidade evoluía e que através de um campeonato a poderia projectar ainda mais em todo o mundo.

O organismo máximo do ciclismo internacional, criou então em 1921, um Campeonato de Contra-Relógio par Amadores, mas só seis anos mais tarde (1927) decidiu dar um passo definitivo e inaugurar uma competição, que desde então se converteu numa grande “Clássica” e denominada «Campeonato do Mundo de Ciclismo».

1927 - 1938

A primeira edição do Mundial de Ciclismo em Estrada, disputou-se em Adenau no circuito de Nurburgring na Alemanha em 21 de Julho de 1927 com um total de 182,5 kms, sobre um circuito com 22,810 kms de perímetro que foi percorrido por 8 vezes, merecendo destaque a terrível subida de “Hedwigshohe” (com um grau de inclinação de 20%, que marcaria as diferenças) e para o mau tempo, com vento forte e chuva intensa que obrigaria aos muitos abandonos. Participaram 22 corredores profissionais e 33 amadores em representação de 11 países, chegando ao fim apenas 18 ciclistas, dos quais 9 eram profissionais e os outros 9 amadores. Este primeiro Mundial converteu-se num autêntico festival italiano, já que o vencedor foi o mítico Alfredo Binda com 6h37’29”, à média de 27,545 kms/h, seguido dos seus compatriotas Costante Girardengo a 7’16”, Domenico Piemontesi a 10’57” e Gaetano Belloni a 11’11”, perante uma multidão entusiasmada com o evento, em que os últimos 7 corredores ficaram a 28’59” sendo 3 amadores e 4 profissionais.

De destacar que Alfredo Binda se apresentou com travões designados de “torpedo”, que faziam parar a bicicleta com um contrapedal e não com os habituais travões debaixo dos manilares. Alguns ciclistas de outros países riam-se de Binda, mas o italiano ganhou e levou consigo 20.000 liras, dinheiro que foi pago pela empresa que fabricava esse modelo de travões, pela demonstração e eficácia verificada ao longo da corrida. A vitória de Alfredo Binda deu à marca imensos benefícios porque a moda pegou e os cicloturistas passaram a usar travões “torpedo” de contrapedal para imitar o campeão do mundo.

Dizem os jornais da altura, que Benito Mussolini aproveitou o momento para fazer propaganda e enviou o seguinte telegrama aos membros da equipa italiana que se classificaram nos quatro primeiros lugares: «Gli atleti d´Itália trionfano nel campionato mondiale ciclístico; Binda primo, Girardengo secondo, Piamontesi terzo, Belloni quarto. Ali atleti esultano perché la vittoria esprime la fede, la forza e la devozione dei vostri fedeli gregari ed il valore sportivo del l´Italia». (Os atletas italianos triunfaram no Mundial com Binda em primeiro, Girardengo em segundo, Piamontesi em terceiro e Belloni em quarto. É um motivo de alegria para os nossos desportistas, porque a vitória expressa a fé, a força e a devoção dos vossos fiéis seguidores e o valor desportivo de toda a Itália).

Refira-se que o primeiro corredor amador foi o belga Jean Aerts que conseguiu ser o quinto na geral a 11’51” seguido do alemão Bruno Wolke a 14’24” do vencedor.

Depois deste primeiro êxito italiano surgiu Georges Ronsee (Bélgica), que se impôs no ano seguinte (1928) em Budapeste na Hungria no dia 16 de Agosto com 6h20’10” para um percurso com 191,7 kms à média de 30,255 kms/h, protagonizando uma fuga que lhe permitiu chegar na frente dos alemães Herbert Nebe e Bruno Wolke, que ficaram a 19’43” tendo iniciado a prova 16 corredores em representação de 6 países, mas apenas 8 a conseguiram terminar, numa corrida que teve partida e chegada a Budapeste com passagem por Vacz, Becske, Verseg, Godollo e Kerepes. O facto mais importante refere-se à rivalidade existente entre os italianos Alfredo Binda e Girardengo, que acabou por permitir a fuga que levou Georges Ronsee à vitória com um alarga vantagem. A Federação Italiana face aos acontecimentos aplicou a ambos uma suspensão de 6 meses pela atitude de ambos, que viria depois a baixar para 30 dias. 

O belga Georges Ronsse voltou a vencer no ano seguinte (1929) em Zurich na Suíça no dia 16 de Agosto onde o entusiasmo neste País pelo ciclismo crescia de forma impressionante que teve a participação de 7 países. A prova compreendeu o percurso Zurich – Rapperswill – Arth – Luzern – Aarau – Staffeleg – Bozberg – Zurich, na    distância de 200,0 kms que foram percorridos pelo vencedor em 6h48’05” à média de 29,405 kms, seguido de Nicolas Frantz do Luxemburgo e de Alfredo Binda de Itália, todos com o mesmo tempo, tendo terminado o campeonato os 16 corredores que o haviam iniciado, situação única na história dos campeonatos do mundo e que ainda hoje se mantém. O italiano Alfredo Binda era o grande favorito mas acabaria por falhar no sprint final, numa entrevista dada na altura afirmava que: «fui prejudicado por umas pastilhas energéticas que me deu o massagista a poucos quilómetros da meta e que me deixaram bloqueado no final da corrida», são os chamados imprevistos que acontecem quando menos se espera.

No ano de 1930 mais precisamente no dia 30 de Agosto debaixo de um calor sufocante, voltou a surgir a figura do lendário Alfredo Binda (Itália) em grande plano, que acabaria por vencer perante uma multidão entusiasmada com os seus feitos, desta vez em Liége na Bélgica sobre um percurso de 210,0 kms que teve o seguinte itinerário: Liége – Spa – Malchamps – Francorchamps – Stavelot – Trois Ponts – Vielsalm – La Roche – Marche – Barvaux – Aywaille – La Reid – Mont Theux – Louvaigné – Aywaille – Sprimont - Liége. Nos lugares imediatos classificaram-se o seu compatriota Learco Guerra e o belga Georges Ronsee (que tinha sido campeão nos dois anos anteriores) sendo na altura a maior referência do ciclismo daquele País, chegando todos à meta com o mesmo tempo 7h30’45”, fazendo a média de 27,953 kms/h, tendo partindo 23 corredores e terminado 17 e em que se fizeram representar 9 países. A grande figura da corrida foi o espanhol Ricardo Montero que andou mais de 100 kms em fuga, mas um furo colocou fim aos seus sonhos acabando por desistir.

 No Mundial de 1931, no circuito de Copenhaga na Dinamarca no dia 26 de Agosto, os italianos voltaram a desfrutar com a vitória de Learco Guerra, a quem denominavam da “locomotora humana” que tinha sido medalha de prata no ano anterior e que realizou o percurso de 172,0 kms em 4h53’43” à média de 34,727 kms/h, seguido do francês Ferdinand Le Drogo a 4’37” e do suíço Albert Buchi a 4’48”, numa corrida que foi efectuada no sistema de contra-relógio individual, em que dos 17 corredores que alinharam apenas desistiram 4 ciclistas e em que estiveram presentes 9 países. O percurso foi efectuado entre Kobenhavn – Rinsted – Baarse – Kuge – Kobenhavn, com a partida de cada corredor ter sido feita com intervalos de 2 minutos.

Foi a única vez que o Mundial se disputou em sistema de contra-relógio, tendo o percurso sido designado como “desumano”, daí a sua fraca participação e o desinteresse que teve para todos.

No ano seguinte (1932) em Itália na cidade de Roma no dia 31 de Agosto, os italianos Alfredo Binda e Remo Bertonni conquistaram o ouro e a prata ficando este último a 15” do vencedor que gastou 7h21’08” à média de 29,340 kms/h, enquanto o belga Georges Ronsee voltava a impressionar ficando em terceiro lugar a 4’52”, num Mundial disputado sobre 206, 1 quilómetros que compreendia um circuito com o perímetro de 68,7 kms, o qual foi percorrido por três vezes, com destaque para a subida “La Rocca di Papa” que se apresentava como a principal dificuldade, num dia com sol brilhante, em que apenas desistiram 4 dos 21 atletas que alinharam à partida em representação de 8 Países. Neste ano o italiano Alfredo Binda conquistava o seu terceiro campeonato do mundo, mas 23 dias depois teve uma desagradável surpresa pois a União Velocipédica Italiana decidiu suspender a sua licença durante um mês, por considerar que tinha tido pouco espírito nas corridas posteriores, pelo que lhe tirava, segundo eles, prestígio à “maglia iridata” (camisola arcos-íris) que transportava. Binda nada satisfeito com a situação disse então: «Se me têm por fenómeno eu sou apenas uma pessoa. Não entendo nada», mas teve que cumprir o castigo imposto por quem liderava o ciclismo em Itália.

A França recebeu os Mundiais no dia 14 de Agosto de 1933 na cidade de Montlhery nos arredores de Paris, num percurso com 250,0 kms os quais foram percorridos num circuito fechado com o perímetro de 12,5 kms por vinte vezes, merecendo destaque o “Côte Lapize” uma subida que era apontada como a grande dificuldade. A corrida teve a presença de 28 corredores que representavam 11 países, verificando-se o abandono de 13 ciclistas. A vitória pertenceu ao francês Georges Speicher depois de várias tentativas de fuga que começaram logo no primeiro quilometro, conseguiu chegar sózinho à meta depois de se ter isolado a meio do percurso, fazendo o tempo de 7h08’58”, à média de 34,967 kms/h, seguido do seu compatriota Antonin Magne que ficou a 5’03” e do holandês Marius Valentijn a 5’04”, num dia que ficou na história do ciclismo gaulês mercê da conquista das medalhas de ouro e de prata, pois os franceses apenas possuíam a medalha de prata conquistada em 1931 por Ferdinand Le Drogo. 

Com a evolução que se verificava a nível de preparação dos atletas, assim como o aperfeiçoamento cada vez mais avançado das bicicletas, o ano de 1934 era marcado pela média verificada que ultrapassava a casa dos 37 kms/h. Os campeonatos Mundiais foram disputados na cidade de Leipzig na Alemanha no circuito de Park-Kurs totalmente plano com o perímetro de 9,4 kms que foi percorrido por 24 vezes num total de 225,0 kms, no dia 18 de Agosto onde marcaram presença 26 corredores oriundos de 11 países. A medalha de ouro foi para a Bélgica através do pistard Karel Kaers (que foi o mais novo campeão do mundo da história com apenas 20 anos, 2 meses e 15 dias) que gastou o tempo de 5h16’15” à média de 37,994 kms/h, seguido do italiano Learco Guerra e do seu compatriota Gustave Danneels, numa chegada emocionante disputada ao sprint por 14 dos15 corredores que terminaram a corrida, onde apenas o italiano Vasco Bergamaschi gastou mais 1’45”, num final espectacular e digno de uma grande corrida.

A primeira medalha conquistada pelo ciclismo espanhol chegava no ano de 1935, no Campeonato do Mundo disputado no dia 18 de Agosto na localidade de Floreffe perto da Namur na Bélgica com a extensão de 216,0 kms. O circuito que tinha um total de 13,5 kms e que foi percorrido por 16 vezes, compreendia a passagem por Floreffe – Buzet – Haute Mariagne – Sart – St. Laurent – Floreffe, com a maior dificuldade a surgir na subida denominada de “Côte de Buzet” que viria a marcar o desenrolar da corrida. Nesse ano o belga Jean Aerts foi o vencedor com 6h05’19” à média de 35, 476 kms/h, ficando na segunda posição o espanhol Luciano Montero a 2’57”, que se converteu no primeiro espanhol com sabor a pódium, recebendo a medalha de prata, com o belga Gustaaf Danneels a 9’08” a conquistar a medalha de bronze, numa corrida em que partiram 31 corredores de 10 países e que apenas foram classificados 13 corredores, pois cerca de 100.000 espectadores que presenciavam o espectáculo invadiram a zona de meta, em virtude de não terem conseguido conter a sua alegria e foram participar na festa.

Dado o percurso ser muito duro e bastante selectivo, o belga Karel Kaers (vencedor no ano anterior) nem sequer foi convocado para a sua selecção, também o seu companheiro Jean Aerts renunciava num primeiro momento desculpando-se com o facto de ter tido um grande desgaste no Tour de França, mas pressionado acabou por voltar atrás e alinhar à partida. Foi uma decisão que o levou a  ser campeão do mundo atacando a corrida desde o seu início juntamente com o espanhol Luciano Montero, ganhando ambos tempo ao pelotão perseguidor. À passagem da 14ª. volta começou a chover intensamente, altura em que já havia abandonado com dores no estômago o grande favorito Learco Guerra (Itália), entretanto o espanhol sofreu um ligeiro desfalecimento, acabando por ficar na frente da corrida Jean Aerts que ganhou com quase três minutos de avanço sobre o seu companheiro de fuga e mais de nove sobre o seu compatriota Gustaaf Danneels que foi medalha de bronze.

Em Berna na Suiça no dia 6 de Setembro de 1936, onde alinharam 39 corredores em representação de 12 países, desistiram 30 entre os quais o representante português Teófilo Lopes, na estreia de Portugal nestas andanças velocipédicas, pois apenas terminaram 9 ciclistas, com a vitória a ser conseguida por Antonin Magne (França) que tinha sido segundo classificado no ano anterior, que gastou o tempo de 5h53’32” para os 218,0 kms do percurso à média de 36,997 kms/h, deixando Aldo Bini (Itália) e Theo Middelkamp (Holanda) que tiveram direito a pódio a 9’27”, assim como os restantes 6 sobreviventes, os quais faziam parte de um grupo de 8 unidades. O vencedor cometeu a proeza de conseguir chegar isolado à meta depois de andar em fuga cerca de 200 kms, numa corrida que se desenrolou no circuito automobilístico de “Bremgarten”, com o perímetro de 7,280 kms tendo sido percorrido por 30 vezes. Dizem os registos da época, que o mítico Gino Bartali (que nunca conseguiu ser campeão do mundo) fez aqui a sua estreia em Mundiais ficando na sétima posição. 

Não são muitos os elementos que dispomos sobre a presença do português Teófilo Lopes na alta roda do ciclismo mundial, sabe-se entretanto que se tratava de um emigrante residente em França. De acordo com o boletim da União Velocipédica Portuguesa da época, a mesma recebeu «um pedido do corredor Teófilo Lopes, residente em França, para efectuarmos a sua inscrição na categoria de profissional. Como tínhamos em nosso poder elementos que permitiam avaliar o valor do nosso compatriota, não hesitámos em satisfazer a sua pretensão, convictos de que, fazendo-o, não colocaríamos mal o nosso País». O mesmo boletim assinala que «a sua desistência foi plenamente justificada pelos inúmeros acidentes de que foi vitima e não pela sua inferioridade atlética ou técnica. Devemos até salientar que, enquanto a adversidade o não perseguiu, marchou sempre entre os primeiros e já se tinham verificado abandonos de estradistas de comprovada classe internacional».

Para completar as informações conseguidas sobre Teófilo Lopes sabemos que nasceu a 9 de Fevereiro de 1910 e que era emigrante em França, pelo que na impossibilidade do processo de naturalização não estar resolvido a tempo de representar a França, recorreu então à União Velocipédica Portuguesa representando o nosso País no campeonato do mundo, mas 12 dias depois ou seja a 18 de Setembro de 1936 conseguia a nacionalidade francesa coma idade de 26 anos passando a chamar-se Théo Lopez. Este não foi um caso único no ciclismo, pois em 1949 um português de nome António Gomes nascido a 26 de Agosto de 1927 pedia com 21 anos a naturalização francesa o que viria a conseguir no dia 20 de Maio de 1949 passando a denominar-se Antoine Gomez, desconhecendo-se o seu percurso desportivo.

Em 1937 no dia 23 de Agosto os campeonatos do mundo regressaram a Copenhaga na Dinamarca, tendo a participação de 34 corredores que defenderam as cores de 12 nacionalidades, mas apenas terminaram 8, sendo mais uma vez ultrapassada a média dos 37 kms/h. O percurso bastante fácil e totalmente plano teve a extensão de 297,5 kms – o mais longo percorrido até aqui – tendo como cenário um circuito com 8,5 kms de perímetro que foi percorrido por 30 vezes, cabendo a vitória ao sprinter Eloi Meulemberg (Bélgica), que gastou 7h59’48” à média de 37,203 kms/h, conquistando as medalhas de prata e bronze, o alemão Emil Kijeuski e o suíço Paul Egli respectivamente. Os 8 corredores que terminaram a corrida chegaram à meta em dois pequenos grupos, o primeiro com 5 unidades que disputou a três medalhas e o segundo com 3 elementos que registaram um atraso de 6’14” para os homens da frente.

O último Campeonato do Mundo que se realizou antes da 2ª. Guerra Mundial (a qual obrigou à sua paragem durante sete anos) realizou-se a 5 de Setembro de 1938 na cidade holandesa de Valkenburg, teve a extensão de 273,0 kms sendo disputado num circuito com o perímetro de 10,110 kms o qual foi percorrido por 27 vezes, apresentando como maior dificuldade a passagem pelo “Côte de Cauberg”, uma subida que obrigava muitos participantes a descolar. O vencedor foi o rolador e velocista Marcel Kint (Bélgica) a quem chamavam o “Anjo Negro”, que gastou o tempo de 7h53’25” à média de 34,599 kms/h, na frente dos suíços Paul Egli e Amberg Leo, que foram batidos no sprint final, numa corrida em que alinharam 36 corredores e terminaram somente 8, em representação de 12 países.

1946 - 1959

Entre 1939 e 1945 os campeonatos do mundo não se puderam realizar devido à 2ª. Guerra Mundial, o que talvez tivesse impedido que o italiano Gino Bartali (que era considerado o melhor corredor da actualidade), tivesse o título de campeão do mundo no seu invejável palmarés.

O reencontro do ciclismo com o campeonato do mundo de estrada, teve lugar no dia 1 de Setembro de 1946 de novo em Zurich (Suíça) debaixo de chuva intensa, sendo o suíço Hans Knecht o vencedor (que foi o primeiro campeão deste País e que já havia sido Campeão de Amadores em 1937) que gastou 7h24’28” à média de 36,448 kms/h para percorrer os 270,0 kms, por diante dos belgas Marcel Kint que ficou a 10” e de Rik Van Steenbergen a 59” (um corredor que brilharia com luz própria, já que acabaria por vencer os mundiais de 1949, 1956 e 1957, nas cidades de Copenhague e Ballerup ambas na Dinamarca e Warengem na Bélgica). Neste Mundial competiu pela primeira vez o mítico Fausto Coppi que levou o dorsal 27, seria terceiro em 1949 e conquistaria a medalha de ouro em 30 de Agosto de 1953 na cidade Suíça de Lugano. Alinharam neste Mundial 30 corredores que representaram 10 nacionalidades terminando a corrida 17 ciclistas, num circuito que tinha 13,5 kms de extensão o qual foi percorrido por 20 vezes, constituindo a maior dificuldade a passagem pelo Côte de Neubuhl. De salientar que Fausto Coppi furou na 15ª. volta sendo obrigado a abandonar, pois os regulamentos não permitiam que mudasse de roda, como ele o tentou fazer quando chegou à box da sua equipa.

O holandês Theo Middelkamp conquistou no dia 3 de Agosto de 1947 em Reims na França o título mundial, depois de percorrer os 274,0 kms num circuito bastante selectivo com o perímetro de 7,826 kms ao qual se deram 35 voltas, em 7h28’17” à média de 36,677 kms/h debaixo de um forte calor. Na discussão dos restantes lugares no pódio ficaram Albert Sercu (Bélgica) e Jef Janssen (Holanda) que gastaram mais 10” ficando como mesmo tempo Fiorenzo Magni (Itália), sendo o último classificado Joseph Magnani (E. Unidos) na 7ª. posição, pois apenas terminaram 7 dos 31 corredores que tinham alinhado à partida em representação de 11 nações.

A cidade holandesa de Valkenburg voltou a receber os Mundiais de ciclismo no dia 22 de Agosto de 1948, que foram disputados num circuito com10,260 kms que foi percorrido por 26 vezes num total de 266, 0 kms, onde a famosa subida do Cauberg era a maior dificuldade, pertencendo a vitória ao belga Brik Schotte, realizando o tempo de 7h30’42” à média de 35,518 kms/h, batendo ao sprint nos últimos cem metros o seu companheiro de fuga Apo Lazarides (França) que deixou a 1”, com o terceiro lugar a ir para outro francês Lucien Teisseir que gastou mais 3’41”, num campeonato que teve representantes de 7 países e um total de 37 corredores dos quais apenas 10 se classificaram. Mas o caso principal e o mais comentado, foi a polémica que se deu na selecção italiana onde Gino Bartali que tinha ganho o “Tour” (o que acontecia 10 anos depois do seu primeiro triunfo na corrida francesa), mas ao qual Fausto Coppi não concorreu para preparar o Mundial o qual se adaptava às suas características. O seleccionador Lunari não sabia o que havia de fazer, pois ambos queriam ganhar e, aconteceu a repetição da cena da qual tinham sido protagonistas Binda e Girardengo em 1928, vigiando-se mutuamente, não entrando nas vários tentativas de fuga, não arriscando nada para movimentar a corrida e não colocando na estrada a sua real valia, acabaram ambos por abandonar, sendo de seguida penalizados pela Federação Italiana com um mês de suspensão devido ao seu comportamento.     

No dia 21 de Agosto de 1949 os dinamarqueses organizaram o Mundial na cidade de Copenhaga, num percurso com 290,0 kms que foram percorridos num circuito com 8,787 kms ao qual foram dadas 33 voltas, marcando presença 7 países todos da Europa com 31 corredores, chegando ao final 22 dos que haviam alinhado à partida. A vitória pertenceu a Rik Van Steenbergen (Bélgica) que conseguia o seu primeiro triunfo numa corrida com a presença de Fausto Coppi que era o principal favorito juntamente com o francês Jean Robic e a quem foi creditado o tempo de 7h34’44” à média de 38,013 kms/h, que num espectacular sprint venceu os seus dois aliados na fuga, Ferdi Kluber (Suíça) e Fausto Coppi (Itália), – o qual tinha vencido o Giro e o Tour nesse ano -  que deixaram o quarto classificado o belga Brik Schotte a 3’02”, com a Bélgica a demonstrar ser na altura uma das maiores, senão mesmo a maior potência do ciclismo mundial.

A confirmar o que atrás dizemos, no dia 20 de Agosto de 1950 outro belga de nome Brik Schotte (que já havia sido campeão do mundo em 1948), repetiu a façanha na cidade belga de Moorslede, num traçado com 284, 0 kms, num percurso misto que apresentava um troço de estrada com 87 kms, compreendido entre Ypres – Mont Rouge – Ploegstedt – Mesen , seguindo-se um circuito de 11 kms que foi percorrido por 7 vezes em Moorslede. Pedalando isolado nos últimos quilómetros para delírio dos milhares da assistentes belgas que se encontravam ao longo do percurso, venceu com o tempo de 7h49’54” à média de 36,263 kms/h, deixando o segundo classificado o holandês Theo Midelkamp a 1’01” e o terceiro o suíço Ferdi Kubler a 1’48”. Estes Mundiais tiveram a participação de 11 países com 40 corredores presentes dos quais 22 terminaram a corrida. O vento forte foi o principal obstáculo e a chave do desfecho da corrida, pois por estranho que pareça nenhum italiano terminou a prova, pelo que se pode considerar o maior fracasso de sempre de uma das selecções mais potentes do ciclismo mundial.

Em 1951 no dia 3 de Setembro, a cidade italiana de Varese, foi a anfitriã dos Mundiais desse ano com a presença de 9 países os quais formaram um pelotão de 45 unidades, dos quais 24 seriam classificados. O percurso teve a extensão de 295,2kms, com 8 corredores a apresentarem-se na recta da meta para discutir o título, bem posicionado e bastante forte nos metros finais o suíço Ferdi Kluber vencia ao sprint gastando o tempo de 8h28’28” à média de 34,834 kms/h, seguido dos italianos Fiorenzo Magni e António Bevilacqua, que foram creditados com o mesmo tempo assim com os restantes elementos do grupo de 8 unidades, deixando o primeiro corredor do pelotão o italiano Gino Bartalli a 1’05”. Ferdi Kluber tinha sido medalha de prata em 1949 e medalha de bronze em 1950 e era conhecido pelo “Nasone” devido ao comprimento do seu nariz, e também pela sua ironia e uma certa prepotência que irritava os seus rivais. O circuito onde decorreu a prova tinha o perímetro de 24,6 kms, ao qual foram dadas 12 voltas e era praticamente o mesmo que tinha servido de palco aos Mundiais de 1939. 

Pela primeira vez na história dos campeonatos do mundo, os alemães conquistavam a sua primeira medalha de ouro através de Heinz Muller no Luxemburgo no 24 de Agosto de 1952. A corrida teve a extensão de 280,0 kms tendo sido disputada num circuito com o perímetro de 17,5 kms ao qual foram dadas 16 voltas, tendo como principal obstáculo uma subida com 355 metros, a qual teve a participação de 48 corredores que representavam 9 países, tendo desistido apenas 10 dos participantes, pois tratava-se de um circuito que não apresentava grandes dificuldades. Foi uma corrida muito táctica com as tentativas de fuga a não resultarem, pelo que um pelotão de 34 unidades se apresentou na recta da meta na discussão do título mundial, onde era apontado com principal favorito o belga Rik Van Steenbergen que embora fizesse parte do pelotão não foi além da 8ª. posição. O quase desconhecido velocista alemão Heinz Muller saltou a 200 metros da meta e aguentou bem a resposta de Gottfried Weilenmann (Suíça) e de Ludwig Hormann (Alemanha) segundo e terceiro respectivamente, tendo sido todos creditados com o tempo de 7h05’51” à média de 39,449 kms/h, naquele que foi apontado pelos especialistas como um dos mais pobres pódios de sempre, na medida em que nenhum dos três se voltou a destacar na sua carreira desportiva. 

A cidade de Lugano (Suíça) viveu no dia 30 de Agosto de 1953, um dos mais espectaculares Mundiais de sempre através da magistral exibição de Fausto Coppi (Itália), que deixando tudo e todos chegou à meta com mais de seis minutos de vantagem sobre os seus perseguidores. Era apontado como o grande favorito dado a excelente época que vinha realizando e confirmou na estrada as previsões dos especialistas fazendo um a prova sensacional. Contam os jornais da época, que Coppi exigiu ao seleccionador italiano na altura Alfredo Binda, que Gino Bartali não corresse o Mundial, caso contrário o “campeoníssimo” não tomaria lugar na saída. Assim aconteceu e Fausto Coppi não decepcionou, atacando no Alto de La Crespera chegou à meta isolado e com uma confortável vantagem sobre o segundo classificado.  

Alinharam à partida para percorrerem 270,0 kms num circuito com ligeiras subidas e descidas e com a extensão de 15 kms que foi percorrido por 18 vezes, 70 corredores em representação de 12 países dos quais 27 completaram a corrida, sendo a principal dificuldade a subida ao “Côte de Crespera”. O vencedor Fausto Coppi gastou o tempo de 7h30’59” à média de 35,921 kms/h, ficando nas posições secundárias e com direito a pódio, os belgas Germain Derycke a 6’22” e Stan Ockers a 7’33”, mas as suas duas medalhas conquistadas pela Bélgica não chegaram para a festa italiana em Lugano. 

Os Mundiais regressavam à Alemanha no dia 24 de Agosto de 1954 tendo por cenário a cidade de Soligen, que apresentou um percurso com 240,0 kms de extensão bastante acidentado, com um perímetro de 15 kms ao qual foram dadas 16 voltas, merecendo destaque uma subida com3 kms com uma inclinação de 3,5% já muito perto da chegada  e que foi percorrido por 22 dos 71 participantes que representavam 11 países. A vitória pertenceu a Louison Bobet (França) que fez o tempo de 7h24’36” à média de 32,388 kms/h, seguido de Fritz Schaer (Suíça) a 12” e de Charly Gaul a 2’12”, regressando o título mundial a França 18 anos depois de Antonin Magne ter sido campeão do mundo em 1936. O novo campeão do mundo Louison Bobet, era considerado um corredor exemplar com uma força de vontade fora do normal, bastante temperamental e perfeccionista, nasceu na Bretanha e era conhecido como “o padeiro de St. Meen”. Realizou nesse ano uma corrida extraordinária num circuito percorrido debaixo de chuva constante, tendo como companheiro de fuga o suíço Fritz Schaer, furou a 10 kms do final e toda a gente pensou que estaria arredado de disputar a vitória final, mas, com tenacidade e num esforço gigantesco não só alcançou Fritz Schaer como acabaria por vencer com 15 segundos de vantagem. 

Louison Bobet sofreu posteriormente um grave acidente de automóvel juntamente com o seu irmão Jean Bobet também corredor e que era conhecido como “o professor”, vindo mais tarde a ser um dos mais brilhantes jornalistas do ciclismo francês. O mais afectado no acidente foi Louison, que perdeu a mobilidade de uma das pernas. O vencedor de três edições do Tour de França descobriu então os benefícios da “talassoterapia” para reabilitar-se da sua lesão e criou um centro na cidade de Quibron no ano de 1964. Actualmente existem três hotéis de “talassoterapia” que têm o seu nome, um em Mijas (Espanha) e dois em França nas cidades de Biarritz e Quibron. Outra das suas paixões era a aeronáutica, a qual transmitiu a seu filho Philippe antes de falecer a 13 de Março de 1983.   

Em 1955 no dia 28 de Agosto, a Bélgica regressava às medalhas depois do no ano anterior ter ficado em branco, desta vez levaram na bagagem a medalha de ouro e a medalha de bronze. O campeonato decorreu em Frascati na Itália, onde marcaram presença 65 corredores que representavam 10 países, acabando por chegarem ao final 21. O percurso teve um total de 293,1 kms e desenrolou-se num circuito com o perímetro de 20,930 kms, tendo sido percorrido por 14 vezes, apresentando uma subida com um desnível de 7,4% a célebre “Côte de Crocefiss”. No dia em que se realizava o campeonato do mundo, o jornal italiano “Gazzetta dello Sport” falando sobre a lista de inscritos trazia o seguinte título «O prestigio da estrada», mas no final gerou-se alguma confusão, pois não existia consenso para o número certo dos que tinham terminado, falava-se em 19, 20, 21 ou 22 ciclistas, uma coisa é certa a UCI homologou 21 e é este o número oficial. Venceu Stan Ockers (Bélgica) com 8h43’29” à média de 33,595 kms/h, seguido de Jean-Pierre Schmitz (Luxemburgo) a 1’03”e de Germain Derycke (Bélgica) a 1’15”, que sobre a linha de chagada bateu o italiano Gastone Nencini. Stan Ockers era um pequeno e veterano corredor belga, que não teve oportunidade para gozar por muito tempo o título conquistado, pois um ano e dois meses depois falecia num acidente no velódromo de Amberes. Foi o primeiro Mundial em que o espanhol Miguel Poblet teve várias opções para vencer e sagrar-se campeão do mundo, mas teve pouca sorte ao beber um batido quase congelado para combater a sede e o calor, que segundo palavras do próprio lhe assentou como um ladrilho no seu estômago. Faltavam 90 kms para a meta, o catalão encontrava-se em fuga com Jacques Anquetil e Pasquale Fornara com uma vantagem de 9 minutos sobre Stan Ockers, que iniciou nesse momento uma sensacional recuperação acabando por vencer, ele que já havia conquistado nesse ano as Clássicas “Fleche Valone” e o “Liége – Bastogne – Liége”, naquele que foi o seu décimo sexto ano como profissional.     

Em 1956 no dia 26 de Agosto em Copenhaga (Dinamarca) e 1957 em Warengem (Bélgica) o sprinter  belga Rik Van Steenbergen vencia os dois Mundiais. Em Copenhaga foram percorridos 285,1 kms no circuito “Ballerup” com 12,960 kms de perímetro ao qual foram dadas 22 voltas, em que participaram 13 países que se fizeram representar com 71 corredores dos quais apenas 27 chegaram ao fim. Vitória ao sprint de Rik Van Steenbergen com 7h26’15” à média de 38,335 kms/h que fazia parte de um grupo composto por 10 corredores, sendo segundo Rik Van Looy (Bélgica) e terceiro Gerrit Schulte (Holanada), ambos com o mesmo tempo do vencedor. Foi o segundo título de Rik Van Steenbergen, numa corrida em que a chuva e o frio deixaram enregelados muitos dos concorrentes, os que conseguiram terminar fizeram-no cobertos de lama, com os olhos vermelhos devido ao frio e ao vento que soprava forte.        

Em Warengen (Bélgica) no dia 18 de Agosto de 1957 numa distância de 285,6 kms que foram percorridos num circuito com 23,8 kms de perímetro por 12 vezes, o qual tinha uma pequena subida sem grande expressão denominada por “Côte Vossenhol”. O colosso Rik Van Steenbergen renovava o título mundial, num percurso segundo se dizia feito à sua medida, batendo ao sprint um grupo de 6 corredores que foram impotentes para travar a força do belga. Alinharam à partida 70 corredores em representação de 13 países, tendo-se verificado o abandono de 29 ciclistas. O campeão Rik Van Steenbergen gastou o tempo de 7h43’10” à média de 37,593 kms/h, com Louison Bobet (França) e André Darrigade (França) nas posições de pódio e com o mesmo tempo do vencedor, seguidos de Rik Van Looy (Bélgica), Alfred De Bruyne (Bélgica) e Jacques Anquetil (França), enquanto o pelotão comandado por Léon Van Daele (Bélgica) chegava com mais 12” que os primeiros.