Com a frontalidade que o caracteriza, o presidente do Sindicato dos Jogadores, que apresenta nesta quarta-feira, na sede da PJ, o ‘Dossier Tráfico Humano’, garante que manterá o tema na agenda mediática e assume: «Por mais que digam que sou inconveniente, nunca irei hipotecar os meus valores.»
O presidente do Sindicato dos Jogadores, Joaquim Evangelista, concedeu uma entrevista a A BOLA, no Dia Europeu contra o Tráfico de Seres Humanos. O dirigente foi frontal como é seu hábito e não tem dúvidas da importância do tema.
— Estes miúdos, com mais de 18 anos, entram no País com visto de turista e vão ficando por cá. Não é possível exercer uma fiscalização mais eficaz e evitar este encapotamento?
— Amanhã [hoje] será anunciado que Polícia Judiciária (PJ) irá ficar com competência exclusiva sobre esta matéria. Acho que o SEF fez muito, mas podia ter feito mais, não fossem as fragilidades da organização, e aguardo com expetativa o que o Diretor Nacional da PJ irá dizer sobre esta matéria.
— Então este problema passa para os ombros da PJ…
— Sim, tem mais meios, mas deverá agir em cooperação com as restantes entidades envolvidas. E são muitas do ministério dos Negócios Estrangeiros à Segurança Social. O que não pode suceder é que um jogador vá bater à porta de uma organização e receba por resposta ‘é tráfico, eu ajudo, não é tráfico, nada tenho a ver com o assunto’. Desde que estou no Sindicato nunca deixámos de ajudar quem nos bateu à porta, sócio ou não.
Com a frontalidade que o caracteriza, o presidente do Sindicato dos Jogadores, que apresenta nesta quarta-feira, na sede da PJ, o ‘Dossier Tráfico Humano’, garante que manterá o tema na agenda mediática e assume: «Por mais que digam que sou inconveniente, nunca irei hipotecar os meus valores.»
— De 2015 para cá, quantos jovens futebolistas foram deixados em situação de abandono?
— Imensos! E no documento que vamos apresentar conseguimos que muitos dessem a cara. E só o fazem porque confiam em nós. O que não é fácil, porque muitas vezes ficam reféns dessas organizações criminosas, que lhes tiram o passaporte, coagem-nos, ameaçam os pais…
— Essa é a descrição de um comportamento mafioso…
— É uma máfia que não pode ter espaço no futebol. É disso que estamos a falar, de criminosos, de gente do pior que há, que explora a pessoa humana. E não podemos esquecer que através do futebol há muitos jovens que são atirados para a prostituição, para a droga. E estamos a falar de miúdos extremamente fragilizados, porque não querem muitas vezes regressar a casa para não assumirem que afinal não tinham talento, acabam por ser despojados da sua autoestima, e tornam-se farrapos humanos. Não é um problema só do desporto, é de toda a sociedade.
— Estas redes de tráfico de jovens jogadores funcionam segundo os mesmos parâmetros das redes de prostituição que operam a Leste ou na América Latina?
— É exatamente isso, é desta natureza humana que estamos a falar.
— Perante o que está em cima da mesa, qual foi a reação do secretário de Estado?
— A sensação que tenho é sempre a mesma: politicamente é importante dar um sinal de vida, mas isso não chega. Já disse ao Secretário de Estado da Juventude e Desporto que quero saber quais serão os comportamentos concretos que vão fazer a diferença. As alterações legislativas só me interessa se delas saírem consequências.
— Os jovens são abandonados de um dia para o outro?
— Aparecem-nos de mala na mão, com fome, sem dinheiro e nós damos-lhes de comer, arranjamos estadia, e metemo-los no avião de volta ao entorno familiar. E de preferência este processo é rápido, porque podem cair na tentação, numa lógica de qualquer coisa serve para não assumir o fracasso, de entrarem em mundos sem retorno.
Com a frontalidade que o caracteriza, o presidente do Sindicato dos Jogadores, que apresenta nesta quarta-feira, na sede da PJ, o ‘Dossier Tráfico Humano’, garante que manterá o tema na agenda mediática e assume: «Por mais que digam que sou inconveniente, nunca irei hipotecar os meus valores.»
— Amanhã [hoje] é apresentado o vosso Dossier Tráfico Humano, que passos vão seguir-se?
— Vamos entregar o documento aos Grupos Parlamentares, Associações, outros organismos desportivos, vamos traduzi-lo para enviar às organizações internacionais e proporemos três grandes medidas: 1 – Criar uma rede de cooperação efetiva que se articule para prestar auxílio eficaz às vítimas; 2 – Até ao fim do ano vamos apresentar um Manual de Entrada e Acolhimento, para já a implementar no Brasil, através dos nossos homólogos, que depois será introduzido nos PALOP, de maneira a que o jogador saiba, quando vem para Portugal, os direitos que lhe assistem; 3 – Criar uma plataforma on line, que irá chamar-se SOS futebol, que funcionará como Observatório sobre tráfico, racismo, assédio, discriminação por género, ou match-fixing. Servirá para termos memória...
— O tema do tráfico deve fazer parte da agenda dos candidatos à presidência da FPF?
— Claro que sim. Há que humanizar o desporto. E falar seriamente deste tema dirá muito sobre o país desportivo que queremos ser, ou não. É preciso quem dê a cara. E, pela minha parte, por mais que digam que sou inconveniente, nunca irei hipotecar os meus valores.