«Não duvido da minha capacidade para ser treinador do Benfica»
José Morais (arquivo pessoal)

ENTREVISTA A BOLA «Não duvido da minha capacidade para ser treinador do Benfica»

INTERNACIONAL08.12.202317:30

José Morais quer voltar a Portugal após duas décadas de viagem profissional por 14 países e 18 equipas, como treinador e, pelo meio, como integrante da equipa técnica de Mourinho. E tem um sonho: conquistar a Champions com uma equipa da Liga, em particular com o ‘seu’ Benfica. «Sou dos poucos com condições para consegui-lo», garante em entrevista exclusiva

Deixou Portugal há quase duas décadas, para abraçar projetos como treinador em Inglaterra, Alemanha, Grécia, Turquia, Ucrânia, Suécia, Tunísia, Coreia do Sul, Jordânia, Iémen, Arábia Saudita e Irão, onde se encontra atualmente na segunda época aos comandos do Sepahan, no qual, após perda de quatro pontos na secretaria, está, com menos um jogo, a cinco do líder Esteghlal; e pelo qual acaba de apurar-se para os oitavos de final da Champions asiática. 

Pelo meio desta longa jornada, ainda integrou a equipa técnica de José Mourinho no Inter, no Real Madrid e no Chelsea. Tudo isto, após 10 anos na formação do Benfica. Aos 58 de idade, José Morais sente que está a chegar a hora de voltar a casa. E sonha alto.

Tenho uma vantagem: conheço o Benfica quase como a palma das minhas mãos; conheço a sua cultura porque fui treinador da formação durante 10 anos

– Em que ponto está o desejo de voltar a Portugal, onde não treina desde que deixou o Santa Clara em 2004/2005?

– Há sempre um momento em que a terra chama, não é? Em que as nossas origens nos chamam. E, neste momento, o meu sentimento é de que gostaria de voltar. Tenho as minhas intenções relativamente à continuidade da minha carreira e gostaria de voltar, quando fosse possível, e continuar no fundo a fazer algo importante em Portugal e pelos clubes portugueses que têm condições para conquistar algo importante. 

José Morais está na segunda temporada aos comandos do Sepahan, do Irão (Arquivo pessoal)

– E pode dizer que clubes vê no seu horizonte?

– Passei por grandes clubes, passei por grandes momentos. Venci como adjunto competições importantes, como a Liga dos Campeões, campeonatos, taças. E, nesses anos todos, com o que angariei em termos de experiências, penso que, no momento oportuno, posso oferecer condições para a conquista desse tipo de objetivos. E estou numa idade bonita [58 anos], por ser uma idade em que a estabilidade faz parte do meu ser interior, em que há conhecimento e sabedoria que podem, de facto, ajudar a liderar grupos que têm objetivos mais altos do que, eventualmente, possam conseguir imaginar. 

– Em Portugal podem dar-lhe as condições financeiras que tem encontrado no estrangeiro?

– Há vários tipos de projetos. Há aqueles em que é preciso e é possível ter tempo; e há aqueles que exigem resultados no imediato, como será o caso dos grandes clubes portugueses. E os líderes têm de estar preparados para isso, para dar resposta às expectativas no menor tempo possível. Falamos dos grandes clubes, feitos para ganhar. E ninguém está à espera de se dar tempo para isto e para aquilo e, portanto, está-se lá para cumprir os objetivos deles que passam por grandes conquistas. E, não fugindo à pergunta, creio que a grandeza não reside na capacidade financeira; a grandeza reside na ambição de conquistar. E essa é a recompensa. Eu não estou preocupado com a recompensa financeira, ela acaba por chegar.

(Arquivo pessoal)

– Mas o salário que possam pagar-lhe não conta?

– Eu diria que tenho uma estabilidade económico-financeira hoje que não tinha há uns anos. E hoje tenho também condições e qualidades que me permitem garantir resposta às maiores ambições e expectativas dos grandes clubes.

O que me atrai no Benfica? É a chama, sabe? É a chama eterna, a chama imensa...

– Com tudo o que já fez e ganhou na carreira, o que lhe falta? 

– O meu grande objetivo é ganhar a Liga dos Campeões como treinador principal de um clube em Portugal. E, quando eu tiver essa oportunidade, sinto que tenho condições de o fazer e que poderei fazê-lo.

– Sendo pública e reconhecida a sua ligação ao Benfica, onde treinou as camadas jovens entre 1991 e 2001, vê-se a concretizar esse sonho de conquistar a Champions no clube da Luz?

– Tenho uma vantagem: conheço o Benfica quase como a palma das minhas mãos; conheço a cultura do Benfica porque fui treinador da formação durante 10 anos e sei bem o que é tirar aproveitamento da formação. Sei qual é a mística e quais são os valores do clube, sei a ambição que o clube tem relativamente à conquista da Liga dos Campeões. E sei que a experiência pela qual eu passei poderia dar ao Benfica aquilo que, no fundo, todos nós buscamos desde o último ano em que fomos campeões europeus, nos anos 60. Tenho essa ambição. Tenho essa convicção! 

José Morais garantiu apuramento do Sepahan para os oitavos de final da Champions asiática (Arquivo pessoal)

– O que tem realmente a mais do que outros potenciais candidatos ao cargo de treinador do Benfica?

– Eu passei por grandes clubes, alguns dos maiores, como o Real Madrid. E o dia a dia de cada clube, da gestão e da liderança de cada clube, é um dia a dia diferente em função das diversas personalidades que se vão encontrando dentro dos diversos emblemas. É essa noção de liderança que distingue os diferentes treinadores, é o modo diferente de passar a mensagem aqui e ali, consoante a realidade. No fundo, é essa maturidade, é essa capacidade e é esse conhecimento que eu estou certo que tenho hoje e que pode fazer a diferença. Eu não tenho dúvidas de que tenho essa capacidade de ser treinador do Benfica. Sabendo que não é apenas a forma que eu tenho de chegar às coisas que fornece resultados. É uma questão de oportunidade. Para mim e para o Benfica, também.

– O que tanto o atrai no Benfica?

– É a chama, sabe? É a chama eterna, a chama imensa. 

José Morais foi técnico da formação do Benfica entre 1991 e 2001 (Foto ASF)

– Mais de duas décadas depois da sua passagem (1991 a 2001) pela formação do Benfica, o que mudou nessa área?

– Há uma enorme diferença. Primeiro, temos hoje um presidente que jogou no clube, que é um diamante da formação, que foi campeão no clube e é uma referência em Portugal e no Mundo. Temos, ainda, um campus Benfica que não existia na altura e que hoje tem condições que o colocam a par das melhores academias do mundo. É assim normal que a formação do Benfica tenha uma dimensão superior àquela que existia. Hoje o talento é mais facilmente exportado do que do que era há uns anos. Se o Rui Costa existisse na Academia do Benfica, hoje, creio que nem chegaria a aparecer na primeira equipa do Benfica, teria saído mais cedo…

– Aí sobrepõe-se a grandeza financeira, certo?

– Sim, a financeira, porque a verdadeira grandeza dos clubes não tem só a ver com a capacidade financeira. O Benfica é um clube tão grande como um Real Madrid, mas, claro, que a capacidade financeira do Real é diferente. Eu acredito que o Benfica tem, hoje, condições para caminhar num crescimento sustentado que não tinha há uns anos: há as condições do estádio, o marketing, a profissionalização do clube e dos várias departamentos. Temos agora um Benfica diferente e que não pode pensar só em vencer o campeonato, tem de vencer competições internacionais, tem de chegar às finais e tem de ambicionar ganhá-las.

– Menciona muito a grandeza do Benfica. É daí que vem, por exemplo, o desejo de Bernardo Silva de regressar um dia?

– É exatamente dessa grandeza que falo. O Bernardo quer voltar, como quererá o Rúben Dias, o João Félix, o Cancelo, o Gonçalo Ramos. E como quis o Di María. É o que comprova que a grandeza não tem apenas a ver com o aspeto financeiro. E falamos de jogadores com a noção do que é um clube gigante, porque passaram por grandes clubes, não é? E o Benfica é um desses grandes clubes, tem essa grandeza: pode não ter a mesma capacidade financeiramente, mas tem essa grandeza. Eu passei pelo Real Madrid, pelo Chelsea, pelo Inter e digo: o Benfica é um clube grande, é enorme. E é por isso que esses jogadores voltam.

BI - JOSÉ MORAIS

Nome completo
José Manuel Ferreira de Morais

Data de nascimento
27 de julho de 1965 (58 anos)

Naturalidade
Golungo Alto (Angola)

Carreira treinador
Benfica (camadas jovens), 1991 a 1999; Benfica B, 1999 a 2001; Estoril, 2001; Westfalia Herne (Alemanha), 2001/02; Dresdner (Alemanha), 2002/03; Académico Viseu, 2003; FC Porto (adjunto), 2003/04; Santa Clara, 2004/05; Assyriska (Suécia), 2005; Al Faisaly (Jordânia), Al Shabab e Al Hazm (Arábia Saudita), 2006/07; Stade Tunisien (Tunísia), 2007/08; Iémen (seleção), 2008; Espérance Tunis (Tunísia), 2008/09; Inter (Itália, observador), 2009/10; Real Madrid (Espanha, observador), 2010 a 2013; Chelsea (Inglaterra, observador), 2013/14; Al Shabab (Arábia Saudita) e Espérance Tunis (Tunísia), 2014/15; Antalyaspor (Turquia), 2015/16; AEK (Grécia), 2016/17; Barnsley (Inglaterra), 2017/18; Karpaty Lviv (Ucrânia), 2018/19; Jeonbuk Motors (Coreia do Sul), 2019 e 2020; Al Hilal (Arábia Saudita), 2020/21; e Sepahan (Irão), desde 2022/23.

Títulos
1x Taça da União Árabe (2008/09), 1x Campeão da Tunísia (2008/09), 2x Campeão da Coreia do Sul (2019 e 2020), 1x Taça da Coreia do Sul (2020), 1x Campeão da Arábia Saudita (2020/21) e 1x Supertaça da Arábia Saudita (2014/15)