La Masía vive: depois de Yamal, há Guiu, o patinho feio que virou cisne
Nova jovem estrela não é típico 'produto' da cantera do Barcelona; foi um dos melhores marcadores do Euro sub-17; Xavi Hernández fundamental na ligação com a academia
Dois dias apenas depois de La Masía festejar o 44.º aniversário e após uma fase em que o desfasamento entre a primeira equipa e a formação era notória, eis que a academia do Barcelona volta a dar nova prova de vida, agora sob o comando de um dos ‘seus’: Xavi Hernández.
Lamine Yamal e Fermín López tinham sustentado esta nova afirmação da formação ‘culé’ já no seguimento da consolidação de apostas que vinham de Ronald Koeman em Alejandro Baldé e Gavi – Ansu Fati surge ainda mais atrás, por ordem de Ernesto Valverde e Quique Setién, e precisava de mudar de ares, estando a tentar recuperar a magia no empréstimo ao Brighton –, e na recuperação do antigo aluno Oriol Romeu. Agora, 34 segundos depois de ter entrado em campo pela primeira vez pela equipa principal, é Marc Guiu quem dá ainda mais colorido a La Masía.
La Masía: 44 anos (e não só) a pensar no ‘ADN Barça’
A 20 de outubro de 1979, La Masía de Can Planes abre portas pela primeira vez e torna-se a primeira residência para jovens futebolistas em Espanha, ocupando o edifício que até aí servira de sede oficial. A decisão de Josep Lluis Núñez em apostar na formação desportiva e humana de novas promessas muda por completo a história do emblema catalão e da própria região.
Se o Barcelona tem no passado uma ligação forte à ‘cantera’, esta ganha tremendo impulso com a infraestrutura, que dá finalmente aos jovens de fora da cidade as condições ideais para crescer e se preparar para a primeira equipa, equiparando-se aos que viviam perto dos campos de treino, como aconteceu antes, por exemplo, com Charles Rexach, símbolo da formação culé nas décadas de 60 e 70. O primeiro jogador a beneficiar do novo espaço é Ángel Pedraza, para depois chegarem Guillermo Amor, Lluís Carreras, Jordi Roura, Pep Guardiola, Sergi Barjuán, Iván de la Peña e Andrès Iniesta, entre tantos outros.
A aposta na juventude é prática comum desde a fundação. Logo em 1901, Lluís d’Ossó cria três equipas além da principal como viveiros de talento para as várias classes etárias. O alemão Udo Steinberg e o húngaro Jesza Poszoni, este já na década de 20, tornam-se verdadeiros ideólogos, um papel também assumido, meio século depois, por Laureano Ruíz, considerado hoje um dos pais do ‘estilo Barça’. E ainda mais tarde, em 1982, a inauguração do hoje desaparecido Miniestadi dá ainda mais sentido a todo o projeto.
Uma nova fase nasceu há 12 anos, no mesmo dia 20 de outubro, com a inauguração de uma nova La Masía – Masia Centro de Formação Oriol Tort – batizada assim em homenagem ao antigo jogador, treinador e responsável pela ‘cantera’ – na Ciudad Desportiva Joan Gamper de Sant Joan Despí. A nova infraestrutura, que possui todas as comodidades para os (e as) jovens futebolistas e passa a albergar atletas de outros desportos, facilita ainda mais toda a logística de produção de craques. Para trás, já nessa altura, está a Bola de Ouro de 2010, com Messi, Iniesta e Xavi a ocuparem todo o pódio, algo que nenhum outro clube conseguiu até hoje. Não podem restar dúvidas do que a Academia significa para o Barcelona.
Quem é Marc Guiu, a nova jovem estrela culé?
Marc Guiu é agora o mais recente ponto de exclamação de La Masía, embora não se comporte como o habitual avançado que é aí ‘produzido’ e que depois tem espaço nos seniores: móvel, que deriva para os flancos ou baixa para ligar jogo com os médios. Aos 17 anos, é um avançado puro de área, que se faz valer ainda da velocidade e da potência física, e é bastante competente a finalizar com ambos os pés (preferencialmente o direito) e com a cabeça. Um patinho feio que parece querer agora virar cisne.
Ainda há uns meses alinhava pela equipa juvenil B. Depois de ter representado Espanha no Europeu sub-17 (chegou às meias-finais), em que dividiu o prémio de melhor marcador com o compatriota e colega de equipa na cidade-condal Lamine Yamal, e os alemães Robert Ramsak e Paris Brunner, começou a nova temporada em grande forma na Juvenil A, com cinco golos marcados, e estreou-se pelo Barcelona Atlètic, a segunda equipa, diante do Nástic de Tarragona, na Primera RFEF, o terceiro escalão espanhol. Esteve no banco do conjunto principal às ordens de Xavi diante do Granada e alcançou finalmente a estreia, uma estreia perfeita, frente ao Athletic Bilbao, com um golo marcado.
Guiu chegou ao Barcelona ainda para as ‘escolinhas’, depois de ter alinhado pela equipa de adeptos do clube de Sant Celoni, a terra natal. A primeira época como ‘culé’ foi a de 2013-14. Há dez temporadas.
Numa equipa que apresentava uma das gerações mais promissores de La Masía, com nomes como os defesas modernos Alexis Olmedo e Héctor Fort, o clarividente médio ofensivo Pau Prim e o talentoso esquerdino Arnau Pradas, nunca se destacou ao ponto de que lhe augurassem um futuro brilhante e uma aposta de Xavi Hernández ou de outro treinador que lhe sucedesse. No entanto, tem contrariado essa dose de talento menos evidente com capacidade de trabalho, sacrifício e dedicação.
Xavi, entretanto, está convencido. «Marc, um miúdo da formação, fez a diferença para nós. Estou feliz por ele e pelos três pontos, que são muito importantes. Pensei nele porque tem golo, faísca, e gosto dele pessoalmente. Não tenho problema nenhum em olhar para dentro de casa. Muito pelo contrário. Devolvo a confiança que me deram quando eu tinha 17 ou 18 anos.»
É verdade que, por mais talento que uma academia consiga produzir, de nada vale se não houver alguém que dê continuidade ao trabalho feito. La Masía volta a ter boas gerações e alguém que deixa sempre a sua porta aberta. Quem melhor do que um treinador nascido e criado no 'Barça' para fazê-lo?