Entrevista A BOLA: «Benfica tem condições para continuar a ser dominante»

Benfica Entrevista A BOLA: «Benfica tem condições para continuar a ser dominante»

NACIONAL17.08.202300:05

Abel Xavier, antigo internacional português, faz uma viagem ao passado para recordar o começo de carreira no Estrela da Amadora e a ascensão no Benfica. E aproveita o jogo de sábado entre os dois clubes para dar um salto ao presente. Na presidência dos encarnados, afinal, está um antigo companheiro de equipa e de Seleção.

- Que memórias guarda dos tempos de Estrela da Amadora, ainda muito jovem e com o sonho de se tornar profissional?
- Antes de mais, chego ao Estrela depois de uma dispensa forçada do Sporting. O Estrela angariava jogadores dispensados de Benfica, Sporting e Belenenses. Entrei para a formação com 16 anos, na mesma altura estreei-me na seleção sub-15. Tive uma evolução muito rápida, aos 17 anos treinava-me com a equipa sénior, com Manuel Fernandes e José Mourinho, homens de grande dimensão técnica e humana, sensíveis aos problemas sociais dos jovens. Foram muito importantes para mim. Tenho de deixar uma palavra de apreço a Manuel Fernandes, pelo apoio, e a José Mourinho, já muito evoluído. E o salto maior dei com João Alves, integrou-me na equipa sénior, o Estrela conquistou a Taça na finalíssima [em 1990, contra o Farense]. Mais tarde estreei-me na Europa contra o Neuchatel Xamax, na Taça das Taças.

- O que o marcou mais no Estrela?
- Dos treinadores que me apoiaram na formação, tenho de mencionar José Faustino e Augusto Matine, depois Manuel Fernandes, José Mourinho, João Alves, Joaquim Teixeira e Jesualdo Ferreira. Jesualdo foi de capital importância para me transferir para o Benfica porque se juntou à equipa técnica de Toni. Era jovem e atraí o interesse de Sporting, V. Guimarães e Boavista, mas apareceu o Benfica e o Estrela fez uma venda importante.

- Como foi mudar para o Benfica no verão de 1993?
- Apesar da minha experiência na I Divisão, uma coisa é a realidade do Estrela e outra a realidade e o peso do Benfica. Recordo-me de jogadores míticos e da mística no balneário. Foi muito importante para me adaptar. Mas os primeiros seis meses foram muito difíceis, fui muito criticado pelos adeptos. Foram sempre muito particulares em relação a mim. Foi a minha força mental e a força do grupo que me ajudaram a ultrapassar a situação. Foi uma época muito boa. Ganhámos o Campeonato, o meu primeiro título, houve o emblemático 6-3 em Alvalade e chegámos às meias-finais da Taça das Taças com o Parma.

- E ainda marcou um golo no célebre empate a quatro golos em Leverkusen.
- Exatamente. O nosso trajeto foi invejável. Afirmei-me a nível internacional. No jogo em que o Mozer foi expulso [segunda mão das meias-finais, em Parma], passei para central. Cheguei a ter um acordo fechado para me transferir para o Parma. Houve negociações de Manuel Damásio [presidente] com o Parma para me venderem, o Benfica tinha relações privilegiadas com a Parmalat. Mas acabei por ficar.

- E, no Benfica, quem mais o marcou?
- Terei de falar em Rui Costa, atual presidente, e João [Vieira] Pinto, crescemos juntos nas seleções e encontrámo-nos no Benfica. Apanhei jogadores emblemáticos e tenho de citar, também, Carlos Mozer, a minha referência e maior exemplo. Formei-me como central, depois fui adaptado a lateral, mas revia-me muito nele. Foi um prazer tê-lo como companheiro. Foram épocas extremamente difíceis, o clube tinha dificuldades financeiras e prevaleceu a força do balneário. Na segunda época, com a saída do mister Toni e a entrada de Artur Jorge saíram muitos que tinham sido campeões. E, no final, saí para o Bari.

- Como o recebem na Luz e na Amadora?
- Tenho um carinho muito especial pelo Estrela, considero-me um embaixador do Estrela, porque acredito que fui um bom exemplo. Estou muito contente por o clube ter voltado à I Divisão, depois de um processo doloroso para os adeptos. É preciso enaltecer quem o conseguiu - a administração e o treinador Sérgio Vieira, que trabalhou muito bem a equipa. Que seja um ano de estabilidade. Estou muito grato ao Estrela, foi lá que progredi para um clube da dimensão do Benfica. E estou grato ao Benfica porque foi lá que consegui internacionalizar a carreira. O Estrela foi muito importante na passagem para o futebol sénior e o Benfica na afirmação internacional. Sou muito bem tratado pelas duas instituições, não me esqueço de quem foi importante para mim.

- Como será o jogo de sábado?
- Para o Estrela, este será ano de luta pela manutenção. O campeonato está mais competitivo, as equipas bem trabalhadas, uma delas o Estrela. Sérgio Vieira irá preparar a equipa para conseguir pontuar. O Benfica não começou bem e terá de reagir. Será um jogo extremamente difícil para o Estrela. Tenho muito carinho e respeito pelos clubes e não vou fazer prognósticos.

- Benfica está mais forte?
- Formou um grupo forte, consequência normal do que aconteceu no ano passado. É legítimo que esteja focado em ganhar todos os troféus. Esta época a gestão de Roger Schmidt será, seguramente, diferente. Tem todas as condições para continuar a ser dominante, sabendo que os adversários se fortaleceram e reduziram diferenças porque também tiveram capacidade de contratar bons jogadores. A capacidade de o Benfica contratar jogadores que possivelmente ninguém esperaria é um claro sinal de que prevalece a gestão desportiva sobre a financeira. E as conquistas servirão de motivação.

- Como vê Rui Costa na presidência?
- Com respeito, admiração e amizade. Era previsível, uma questão de tempo. O Rui sempre teve esse objetivo. Tem um estilo muito pessoal, que envolve a paixão pelo clube. Quer projetar o clube para a hegemonia nacional e ter impacto internacional. Deve reunir-se das pessoas mais capacitadas para o ajudar a projetar o clube a novas conquistas.