Roberto Rivelino é especialista em guarda-redes. Treinador, observador e analista, trabalha no Dubai, no Fursan Hispania, clube dirigido pelo antigo internacional espanhol Michel Salgado. Em entrevista a A BOLA falou sobre a posição que desde menino o apaixona, convidando-nos a visitar o Mundo dos Guarda-redes.
- És, talvez, o grande defensor dos guarda-redes em Portugal. Sentiste necessidade de sair em sua defesa?
- Ao se criar o espaço ‘O Mundo dos Guarda-redes’ e através deste, e não em meu nome, procurou-se essa proteção e valorização que não existia antes. Houve uma revolução, com as respetivas aspas. Surgiram mais eventos, os técnicos de guarda-redes começaram a ter nome próprio e os guarda-redes também começaram a ser valorizados de uma outra maneira.
- Até nasceu o Dia Nacional do Guarda-redes…
- Sim, não foi uma tarefa fácil encontrar uma data e acabei por escolher o dia 18 de dezembro, data da primeira internacionalização portuguesa. Pareceu-me justo homenagear o Carlos Guimarães, que continua a ser um desconhecido, claro, fruto da época.
- Sentiste que faltava mesmo essa defesa, então?
- Senti que no espaço mediático não havia, por vezes, tanto critério na avaliação, na opinião, na informação, e que os guarda-redes estavam desvalorizados. Havia a lacuna nos media e nas redes sociais, que no fundo já se misturam… E que Portugal carecia realmente de um espaço onde os guarda-redes se sentissem valorizados ou onde, se surgisse um erro, alguém o explicasse e não fosse declarado como simplesmente resultado de, passe a expressão, galo ou azar, e sim consequência de um porquê e de um como.
Roberto Rivelino é analista e treinador de guarda-redes. Em entrevista a A BOLA traçou a evolução da posição e do que tem sido de bem feito um pouco por toda a Europa
- Explica-me lá como alguém chamado Rivelino se entusiasma mais em defender uma baliza ou um guarda-redes e não com alguém que tenta marcar como era o original?
- É paixão desde menino. Sempre me atraiu a baliza, só que, infelizmente, nunca tive condições morfológicas para ser guarda-redes e, por isso, colocaram-me a jogar à frente. Mais tarde, por volta dos 14 ou 15 anos, comecei a ser guarda-redes amador. Não posso dizer que fui guarda-redes, posso dizer que fui à baliza, tal como aqueles que nunca jogaram futebol podem dizer que jogaram à bola. No entanto, sei o que é estar na baliza, o que é ser guarda-redes. Claro que não me vou comparar a ninguém, nem tenho essa autoridade, mas sempre me atraíram muito os guarda-redes. Taffarel apaixonava-me, porque como o meu pai é brasileiro víamos muita televisão brasileira. Depois, foi o Oliver Kahn. Esse tipo de referências acabou por ficar e sempre gostei de ir à baliza.
- Fala-me do teu percurso…
- Comecei a treinar guarda-redes aos 16 anos numa academia que o meu pai criou, mas sempre fui muito autocrítico. Vem de um tipo de pensamento mais abstrato, em que se duvida de tudo, em que tem de haver sempre um porquê e um como. Então tive essa capacidade para parar e dizer para mim mesmo ‘ainda não estou a fazer um bom serviço’, e estudei e informei-me. Depois, aos 19 anos, comecei a trabalhar com os guarda-redes do Alpendorada, nas distritais do Porto. Daí, passei para as camadas jovens do Boavista, depois para o Coimbrões e voltei a entrar no futebol sénior, já como profissional, na AD Oliveirense. Passei por Felgueiras, Vilaverdense, Sanjoanense e, em 2022, fui desafiado para ir para a Finlândia, onde consegui trabalhar com o Beto Pimparel. Em 2023, parti para o Fursan Hispania, nos Emirados Árabes Unidos, onde ainda estou.
Roberto Rivelino é analista e treinador de guarda-redes. Em entrevista a A BOLA analisou o estado da posição em Portugal e lembrou as dificuldades que os atletas têm de passar para se afirmarem
- Já pediste ao Michel Salgado, que é o principal responsável do teu clube, para te ajudar a treinar os guarda-redes com remates à baliza?
- Nunca surgiu essa necessidade, porque depois de tantos anos a treinar já existe aqui alguma técnica de remate, quase ambidestra. Ele também não era muito conhecido pelos golos que marcava ou pelas assistências que fazia, era mais pela operacionalidade na defesa.
- Conta-me um pouco sobre o Dubai. Como está a correr o teu trabalho, quais as tuas perspetivas…
- Só não gosta de estar no Dubai quem não quer ou quem já vai para o país com uma mentalidade mais negativa. Há sol todos os dias e este é o melhor doutor que existe. Há uma oportunidade cultural que nunca tive nos três, quatro países onde já estive. Só isso já é fantástico. E, depois, há sempre a oportunidade de em cinco minutos dar por mim a falar espanhol, português, francês ou inglês. E se soubesse falar árabe ou russo também falaria. Existem poucos países a oferecer isto. O Dubai não deixa que falte nada. Existe tudo o que existe na Europa, estão a preparar-se para ser uma potência, um novo centro do mundo. Nunca senti qualquer tipo de restrição e sinto-me bastante contente. A nível profissional, o registo é o mesmo. Esperava um nível mais baixo, mas o clube permite que treine guarda-redes que não sejam locais, da Grécia, Ucrânia, Rússia, Líbano, Portugal, Espanha, Argentina, que já trazem outro aporte, outras valências. Alguns com experiência de treino em Portugal, Espanha ou noutros países, e que continuam a ser solicitados para lá voltarem. E isto traz outras possibilidades de trabalho. O clube recebe gente de diversas nacionalidades e procura também internacionalizar-se, está sempre de portas abertas e é requisitado por outros. Há novidades constantes. Também me permitiu liderar um vasto grupo de guarda-redes ao qual aplicar o meu método de treino. Trago algumas novidades, que junto a algumas coisas que eles já faziam, e tenho sempre a preocupação de que, no momento em que saia, por minha decisão ou do clube, sejam eles os próximos treinadores. Isso é a melhor recompensa. Serem felizes na sua posição, mas também terem conhecimento cognitivo ou cultural sobre a mesma.
Roberto Rivelino é analista e treinador de guarda-redes. Em entrevista a A BOLA falou um pouco sobre a baliza de Sporting, Benfica, FC Porto e SC Braga, e analisou ainda a grande temporada de Ricardo Velho
- E é mais fácil observar e analisar ou treinar?
- É mais fácil observar e analisar. Claramente.
- Mas tens de fazer um pouco das duas coisas: observar e analisar para poder treinar…
- Claro, o treino nunca está dissociado da análise. É muito importante que o treinador seja um bom analista ou observador. Faz parte do treino e da sua conceção detetar onde o guarda-redes tem lacunas ou vicissitudes e criar exercícios para que isso seja estimulado ou melhorado, sem corromper as outras capacidades. É um exercício muito forte dentro da criação do exercício em si.