O desporto e a política (artigo de Vítor Rosa, 58)

Espaço Universidade O desporto e a política (artigo de Vítor Rosa, 58)

ESPAÇO UNIVERSIDADE15.09.201916:35

O desporto é uma atividade social importante. O seu sucesso parece natural e não perturba muito as consciências. As investigações universitárias levadas a cabo nos últimos anos revelam: a distribuição social das práticas e dos gostos desportivos, a diversidade de políticas levadas a cabo e a sua conjuntura histórica, a natureza das motivações para a prática, entre outros aspetos. Nobert Elias, no seu livro “Sport et civilisation. La violence maîtrisée” (Arthème Fayard, Paris, 1994, p. 25), não hesitou em escrever que “o conhecimento do desporto é a chave do conhecimento da sociedade”. O desporto, de fato, é portador de valores humanistas, de princípios éticos e de virtudes morais. E, porque dão um sentido a todas as atividades humanas, os valores são indispensáveis e omnipresentes. Podemos perguntar em que medida o humanismo de Pierre de Coubertin pode ser classificado de utopista? Cremos que prisioneiro do seu “habitus” de classe, ele funda o ideal olímpico sobre uma conceção muito particular da democracia. Neste caso, o olimpismo surge como uma forma de educação cívica e encontra a sua força num projeto de político de transformação da sociedade.
 

O desporto serve assim a democracia. Mas também serve qualquer outro regime (totalitário, por exemplo), tornando-se num terreno de confronto (pacífico e regulado) dos Estados. Independentemente dos regimes políticos, os resultados inscrevem-se numa lógica de rivalidades internacionais. Esta situação de concorrência acentua o culto da velocidade, do progresso e do rendimento. “Ser forte para estar em paz tornou-se prioritário da política desportiva que considera o desporto como um catalisador da identidade nacional”, refere Michaël Attali, em “Le sport et ses valeurs” (La Dispute, Paris, p. 44).
 

As eleições legislativas portugueses estão para breve (06 de outubro). Tenho visto alguns debates nas televisões. Para além dos lugares-comuns e das frases feitas, não ouvi quase nada sobre política desportiva. Fomos ler o programa do Partido Socialista (PS), com o título “Fazer mais e ainda melhor”, para saber o que prometem sobre o assunto, dado que as sondagens apontam para a sua vitória nas eleições. Na página 86 lê-se: “o PS vai continuar a potenciar o contributo do desporto, concentrando a sua atuação em dois objetivos estratégicos principais: (1) afirmar Portugal no contexto desportivo internacional e (2) colocar o país no lote das quinze nações europeias com cidadãos fisicamente mais ativos, na próxima década”. É muito ambicioso este ponto dois, pois os portugueses são dos que menos desporto fazem na Europa. Com a população envelhecida que temos, e os jovens que já parecem velhos, vejo mal como se pode concretizar esta medida. Outras medidas contempladas no Programa do PS mereciam comentários, mas deixamos essa tarefa para o leitor e eleitor.

Vítor Rosa

Sociólogo, Doutor em Educação Física e Desporto, Ramo Didática. Investigador Integrado do Centro de Estudos Interdisciplinares de Educação e Desenvolvimento (CeiED), da Universidade Lusófona de Lisboa