Persiste a ideia em certas franjas de que os dragões só vencem com base na guerrilha do passado, quando há uma alteração estrutural em curso que para uns põe em causa o 'Ser Porto'. Sem resultados, vence a minoria ruidosa
Ninguém esperava que fosse fácil suceder a Jorge Nuno Pinto da Costa. Apesar do evidente declínio nos últimos anos ao nível de gestão que levou o FC Porto para um enorme buraco financeiro, os resultados desportivos mantinham-se de acordo com os padrões a que o mais longevo de todos os dirigentes a nível mundial habituou os adeptos e o responsável por isso tinha um nome: Sérgio Conceição.
A maioria dos sócios subscreve as decisões de André Villas-Boas (como se verificou na recente Assembleia Geral, além da votação esmagadora de 80,28 por cento nas eleições contra apenas 19,52% de Pinto da Costa), mas nada garante que a contestação não pare de aumentar. Primeiramente porque o voto não implica silêncio; segundo, porque os que nunca com ele concordaram tendem a ser mais ruidosos do que a maioria silenciosa que apenas se manifesta nos fóruns próprios.
Decidiu o novo presidente dos dragões que a mudança teria de ser acompanhada por outro homem no cargo de treinador que não Sérgio Conceição. A forma de trabalhar de um e de outro seriam alegadamente incompatíveis, pelo que a escolha incidiu no ex-adjunto, que apesar de ter bebido os ensinamentos do seu mestre é o oposto no resto: polido no discurso, focado apenas no que fazem os seus jogadores sem entrar em discussões com a equipa de arbitragem, bancos adversários ou jornalistas no pós-jogo.
André Villas-Boas acredita que treinador pode inverter ciclo negativo de resultados. Reuniram-se esta segunda-feira no Olival, mas exigência do universo azul e branco faz com que jogo com Anderlecht ganhe mais importância. Presidente também falou aos jogadores, ainda no Dragão
A fórmula é, curiosamente, semelhante à que Pinto da Costa usou em 2011 quando teve de encontrar sucessor para André Villas-Boas, promovendo o então n.º2 Vítor Pereira, e com sucesso pelo menos a nível interno, já que foi bicampeão e ganhou duas Supertaças. Mas olhando agora para trás é fácil perceber que serão maiores as diferenças, a nível de metodologia e personalidades, entre a passagem de testemunho atual do que a que ocorreu há 13 anos.
Porque o FC Porto não está a apenas a viver uma alteração na equipa técnica, de gestão e de fundamentos, está a passar por uma mudança cultural que não se faz de um dia para o outro, provavelmente nem de um ano para o outro e só o tempo dirá se AVB terá sucesso na demanda. Porque se para uns esta era uma necessidade rumo à modernidade, para outros isto poderá representar um sinal de tibieza que vai contra o Ser Porto.
Simplificando: o grande desafio do dragão do século XXI (e consequentemente de André Villas-Boas) é mostrar que pode manter o ADN sem entrar em caminhos e práticas do passado; que pode vencer sem a guerrilha ou histerismos que diziam mais de quem os fazia ou proferia – mas que, como se viu nas eleições, já não tinham adesão num público que pedia novos ares e não se identifica com o género, preferindo passar por dificuldades agora do que regressar ao tempo das cavernas.
Garantia dada por António Tavares, presidente da Assembleia Geral do emblema azul e branco
No que respeita à equipa técnica, precisava o FC Porto (e Villas-Boas) de conciliar o génio tático de Sérgio Conceição com o comportamento de Vítor Bruno. Nunca se sabe como as coisas vão evoluir, e até parece mais verosímil que o atual treinador possa melhorar no que ainda não tem de tão bom do que o ex-técnico melhore no que tem de mau, mas na mente de cada portista surgirá sempre o comparativo que pesa muito mais a favor de um. Aquele que, apesar de tudo, não permitiria o presidente falar ao plantel na sua ausência.