Tempo útil de jogo

OPINIÃO09.04.201904:00

A revolução que tem vindo a ser implementada nas regras do futebol visa tornar o jogo mais atrativo, justo e equitativo. Esse é, pelo menos, o princípio assumido pelo IFAB.
Há, no entanto, uma realidade que as leis de jogo ainda não conseguem contrariar com a eficácia que todos gostaríamos: a da prática sistemática do anti-jogo.
A expressão, em si, diz tudo: ‘anti-jogo’ é a antítese do que de melhor o jogo tem para oferecer. É uma malandrice camuflada, que conta com a cumplicidade do cronómetro e com a inércia da lei e de quem a aplica.
Há, sobre esta matéria, uma verdade universal que convém não nos esquecermos: todas as equipas recorrem ou já recorreram a este subterfúgio para, aqui e ali, obterem dividendos desportivos.
É certo que a tática serve melhor as equipas teoricamente mais fracas (quando se encontram com alguma vantagem), mas os chamados ‘clubes grandes’ também a utilizam, nomeadamente em confrontos entre si ou quando jogam com tubarões de outra galáxia.
A indignação de quem se sente momentaneamente prejudicado faz sentido - a manobra é contranatura e deve ser fortemente condenada - mas o melhor é que não surja via memória seletiva. Como diz o ditado, de cada vez que se aponta o dedo a alguém, há vários virados para nós.
O futebol, como qualquer outra atividade desportiva, tem regras. E o argumento encontrado para as ludibriar, contornar ou explorar as suas omissões, chama-se batota. A solução de combate é eficaz, simples e óbvia. Chama-se cronometragem de tempo de jogo.
Se o relógio parar de cada vez que a bola estiver fora das quatro linhas ou quando um jogador se lesionar, se parar quando um golo for marcado ou o jogo for interrompido, não haverá benefício direto em perder tempo deliberadamente.
Claro que queimar segundos não visa apenas dar menos tempo de recuperação ao adversário. Visa, sobretudo, enervá-lo. Quebrar a sua dinâmica ofensiva. Afetar a sua concentração e levá-lo a cometer mais erros. Visa também perturbar as respetivas equipas técnicas e os adeptos. Visa criar um clima de diversão que retire ao oponente o foco daquilo que é essencial.
Se o relógio parar naqueles momentos, a sensação de justiça será maior. Quem estiver em desvantagem terá mais tranquilidade. Haverão menos reações intempestivas e menos conflitos entre jogadores. Não existirão lesões de circunstância nem caminhadas a passo de caracol de cada vez que houver uma substituição.
Os adeptos assobiarão menos, os elementos técnicos estarão mais calmos e até o árbitro tomará melhores decisões, porque terá de lidar com ambiente menos hostil. Em última instância, o registo disciplinar será inferior e o jogo melhor . Ganham todos.
Estudos recentes apontam que as cinco maiores ligas europeias ficam abaixo dos 60’ de média, em tempo útil de jogo. Itália lidera com uns surpreendentes 57’, enquanto que Espanha não passa dos 53’.
Por cá, estima-se que a média de tempo útil em cada jogo não vá além dos 47’, o que é francamente pouco se tivermos em conta que o tempo total é praticamente o dobro.
A introdução desta medida é tão óbvia quanto inevitável. O que espanta é não ter sido ainda implementada. Mais cedo ou mais tarde, acontecerá. Não há alternativa.