Ridículo!

OPINIÃO18.08.202306:35

Os méritos de Frederico Varandas no Sporting e os deméritos de Simeone no ‘caso-João Félix’

DEVEM, creio, os adeptos do Sporting dispor-se, finalmente, a reconhecer o mérito dos responsáveis do clube na tentativa de serem dados, numa fase ainda difícil da vida da SAD leonina, passos na medida certa da perna. Por muito que alguns grupos mais ou menos organizados de adeptos do Sporting pareçam permanecer ainda numa espécie de conflito silencioso com a liderança do clube, a verdade é que lhes será cada vez mais difícil não reconhecer o mérito de um trabalho que tem procurado (e conseguido) devolver ao clube um mais saudável estado de saúde estrutural e financeiro e, ao mesmo tempo, dotá-lo de cada vez melhores condições para competir ao melhor nível e estar na principal discussão dos títulos, em particular na equipa principal de futebol, que é, como diz o cliché, a mola real de qualquer grande instituição desportiva.

Não se trata, agora, de questionar, ou debater, o posicionamento que o presidente do Sporting tem tido na relação com clubes, Liga, federação, arbitragem, homólogos das principais instituições desportivas do País. Trata-se de olhar, apenas, para o que Frederico Varandas tem feito no Sporting e pelo Sporting, quer na reorganização do clube, reformas económicas (com o proveito de benefícios bancários que o clube se limitou a aproveitar), quer no equilíbrio financeiro entre receita e despesa, que levou a SAD a recuperar, por exemplo, capitais próprios positivos, e o clube a tornar-se, claramente, mais competitivo.

Queira ver-se como se quiser, mais ou menos em pormenor, o resultado do trabalho líder Frederico Varandas, é difícil de sustentar a peregrina ideia, porventura, ainda de algumas franjas de adeptos leoninos, de que Varandas estava longe de ser um homem certo para o lugar.

Eleito em 2018, reeleito em 2022, Varandas atravessou a ‘acusação’ de estar impreparado, teve de conviver com a ideia de ter muita dificuldade em comunicar, debateu-se (corajosamente) com uma claque, sobretudo, ou com a liderança dessa claque, habituada a gozar de benefícios e impunidades inaceitáveis, e foi sendo coerente, mesmo nalguns dos erros de alegada deselegância ou inconveniência que pode, aqui e ali, ter cometido, levado pelo impulso de discutir demasiadas vezes o que se passa na casa dos rivais.

Hoje, provavelmente mais tranquilo, menos ansioso (o que é absolutamente normal) e mais preparado (o caminho sempre se faz caminhando), Frederico Varandas tem o Sporting, globalmente, talvez no melhor plano dos últimos largos anos. E não tem que ver só com futebol; tem que ver com tudo. Continuar a contestá-lo é só ridículo!
 

HÁ, realmente, muitas maneiras de matar moscas. Se não, vejamos: Griezmann também disse um dia que queria deixar o Atlético de Madrid, fez com imensa felicidade um casamento com o Barcelona e, dois anos depois (primeiro por empréstimo, logo depois em definitivo), já estava de volta a Madrid e nada, nem ninguém, o tentou humilhar como se tem vindo a tentar humilhar, no Atlético de Madrid, o português João Félix, que cometeu o mesmo erro de declarar-se ao mesmo Barcelona. Félix cometeu, porventura, outros erros, alguns deles próprios da juventude e normal falta de maturidade, mas não me parece que isso justifique um ambiente tão tóxico a sua volta.

Já sei que a memória no futebol é curta, e apesar de Félix eventualmente precisar de mudar alguma coisa no seu comportamento como jogador de alta competição, a verdade é que bem recordo como foi importante para o único título do Atlético de Madrid nos últimos nove anos, conquistado em 2021.

Nessa época, por exemplo, Félix fez 31 jogos na Liga, sete golos e cinco assistências, mas chegou ao fim da temporada com um total de 51 jogos, dez golos e sete assistências. Na época seguinte, ainda somou 24 jogos na Liga, oito golos e quatro assistências, e terminou com um total de 40 jogos, dez golos e cinco assistências. Na última temporada, tudo foi diferente, esses números diminuíram e Félix esteve meia época em Madrid e outra meia em Londres. Por muito que o jogador não tenha dado ao treinador a resposta em campo que o treinador exigia, a verdade é que Simeone pareceu condená-lo.

Griezmann, se bem nos recordamos, também forçou a saída do Atlético, e apesar de ter vindo esta semana afirmar que o que fez para se redimir foi «calar-me e trabalhar» até que a situação se resolvesse, a verdade é que não passou um décimo do que está a passar João Félix.

Griezmann também queria juntar-se ao Barcelona e conseguiu-o, porque o Barcelona se dispôs a pagar por ele, em 2019, qualquer coisa como 120 milhões. A curiosidade seguinte foi ver, dois anos depois, Griezmann viver no Barcelona cenário semelhante ao que vive agora Félix em Madrid. Ou seja: após pagar 120 milhões pelo francês (como o Atlético pagou por Félix), o Barcelona viu-se em aflições para pagar os salários de alguns jogadores e teve de aceitar que Griezmann regressasse a Madrid por empréstimo (como Félix quereria agora que o Atlético fizesse em sentido inverso). E o Atlético, que recebeu por Griezmann 120 milhões, pagou, em 2021, 10 milhões pelo empréstimo do francês, e, depois, apenas mais 20 milhões para o voltar a ter definitivamente. Despachou-o e recebeu-o, defendendo, porém, o jogador ao ponto de não permitir que alguma vez Griezmann fosse alvo da ira dos adeptos como está a ser o infeliz, e também imprudente, João Félix.

Tem o treinador de Félix todo o direito de não querer contar com o jogador para o plano da nova temporada do Atlético. O argentino Diego Simeone, que validou com Félix uma das contratações mais caras (se não mesmo a mais cara) da história do clube, considerará que o futebolista português não responde ao que dele exige o treinador e a autoridade do treinador legitima, naturalmente, a decisão técnica, tática e até humana de não o querer incluir na operação. É assim em todo o lado.

O que me parece que Simeone, ou qualquer outro treinador, não tem o direito de participar é na evidente tentativa de humilhação a que Félix tem sido sujeito, desde muito antes de o jogador ter vindo publicamente dizer (através de um jornalista italiano muito conhecido no plano internacional) o que na realidade nunca devia ter dito, quando declarou o desejo de «jogar no Barcelona».

É importante, porém, compreender o contexto, e o jovem jogador português, certamente, apenas disse o que disse por perceber que é, no Atlético, carta absolutamente fora do baralho, levado pelo impulso, e talvez alguma angústia, de ver a vida desportiva a andar para trás por estar condenado nos colchoneros.

Há muito que Simeone parece ter declarado Félix proscrito na equipa madrilena e obviamente foi de Simeone a decisão de o afastar, em janeiro passado, e levar os responsáveis da administração do clube a proceder ao empréstimo do jogador. O azar de Félix foi, mesmo assim, o de apenas o Chelsea (que atravessava o pior momento desportivo dos últimos largos anos) se ter disposto a pagar, por seis meses, os 11 milhões de euros que o Atlético de Madrid exigiu (mais salários), um valor absurdo para o que se pratica habitualmente no futebol, por mais compreensível que pareça tendo em conta o que o Atlético de Madrid pagou para contratar o jogador.

Visto, talvez, da forma mais simples: se o treinador do Atlético de Madrid não quer João Félix, e esta, sublinhe-se, no seu pleno direito, então cabe ao clube encontrar a melhor solução para viabilizar a carreira desportiva do futebolista e, ao mesmo tempo, defender os seus legítimos interesses financeiros.

O que não pode é dar, por um lado, a ideia de querer encontrar uma solução, e por outro lado parecer dispor-se a complicá-la, contribuindo para a angústia do jogador e, ao mesmo tempo, validar a decisão do treinador de tão depressa o excluir dos planos como logo a seguir o exibir, como troféu de caça, em pleno estádio, para ser humilhado por dezenas de milhar de adeptos.

A imprudência com que Félix disse o que disse sobre a vontade de jogar no Barcelona, mas sobretudo a forma como a estrutura do clube e o treinador argentino têm gerido e falado do jogador é que acaba, na realidade, por levar os adeptos, não tenhamos ilusões, a produzirem o inqualificável e feroz ataque ao jogador português que se viu, e ouviu, na última segunda-feira, no estádio do clube, durante o jogo do Atlético de Madrid com o Granada para a 1.ª jornada da Liga espanhola.

Simeone decidiu levar João Félix para o banco (e pouco o fazia prever) e não se livra, pelo menos, da suspeita de o ter feito para expor o jovem jogador à esperada humilhação e inqualificável enxovalho, com os adeptos da casa, cantando num uníssono e ensurdecedor coro ‘português filho da p…’ (entre outras preciosidades) a esmagarem o jovem jogador, num ataque indecoroso e épico (com laivos de xenofobia) como há muito não se via num estádio de futebol para com um jogador da casa. Foi ridículo!
 
PS: Em Portugal, castiga-se um treinador (seja ele qual for), mas ele vai ao estádio, comanda a equipa por ‘rádio’, fala com os jogadores ao intervalo, não está no jogo, mas está. É apenas ridículo!