Resistentes, mas não conformistas!...

OPINIÃO01.02.202305:30

Nós temos de mudar também alguma coisa, designadamente de roupa: talvez o luto ponha em evidência a falta de vergonha!

«...SOU optimista, somos resistentes, acredito e acho que isto vai acabar por mudar», assim concluiu Frederico Varandas as suas declarações após o jogo da final da Taça da Liga. Não tenho o mesmo optimismo do Presidente do Sporting, e, portanto, não acho que isto vai acabar por mudar. Não chega resistir que é muitas vezes uma forma de conformismo; é preciso agir, porque hoje não há apenas um dono disto tudo, mas dois, com a agravante de ambos disputarem o poder.

Em tempos, não foram poucas as vezes, em que tive de me sacrificar fisicamente para que a minha vida profissional não fosse prejudicada por querer assistir aos jogos ao vivo. Agora já não assumo esse sacrifício, porque já tenho idade suficiente, para ter o direito a não me incomodar. Não significa que me conforme com o que vejo. Aliás, está no ADN da profissão de advogado não se conformar com a injustiça e a mentira, antes lutando pela verdade e, servindo-se apenas de provas, desmascarar os mentirosos.

No jogo com o Arouca, apesar do frio, que aliás agravou a minha constipação, lá estive de corpo e alma, a ver o jogo e a observar certos comportamentos hipócritas que me incomodam e irritam sobremaneira, porque odeio o servilismo e as espinhas curvas. Era previsível mais servilismo e hipocrisia no jogo da final e por isso entendi não ser justo sacrificar o corpo e a alma, em nome da conciliação entre o jogo, a vida profissional e a saúde, para assistir ao que era previsível sabendo do árbitro que foi nomeado: uma provocação só possível porque a falta de respeito pelo Sporting por parte da arbitragem (e não só) é um dado adquirido no sistema vigente. Aceitámos pacatamente a nomeação ao contrário de outros que têm uma estratégia diferente que, aliás, lhes traz normalmente bons resultados. Os bens comportados não merecem consideração, porque não causam medo.

Sentado no sofá e olhando para a tribuna tradicionalmente de honra vi quem devia estar: o anfitrião, Presidente da Liga. Descortinei o Secretário de Estado nessa mesma tribuna e achei que se iria sentar à direita de Pedro Proença, mas enganei-me e nesse lugar sentou-se Frederico Varandas. Do lado esquerdo, não parecia óbvio, mas sentou-se Pinto da Costa. Protocolarmente, aquele que deveria ser o primeiro a sentar-se, sobejou e, portanto, acabou por sentar-se à esquerda, não porque é de esquerda, mas porque à esquerda estava o poder. Imagine-se, pois, o que pensam sobre o poder as três equipas quando se perfilam de frente para a tribuna: a simbologia tem mais força que o símbolo. O que parece é, ainda que o símbolo signifique verdadeiramente a história de uma instituição.

Perante este cenário torna-se natural que João Pinheiro tenha decisões que abalem a já abalada credibilidade da classe da arbitragem, antes e após Qatar, já que este não é o único exemplo.

Neste clima, são manifestos os comportamentos para agradar ao poder. É assim no futebol, como na politica. Os poderosos estão sempre protegidos e os jogadores - os protagonistas do espectáculo - não se sentem protegidos. Quem andou perto, como eu andei, sabem o que eles sentem quando, apesar de jogarem bem, vêem o campo a inclinar-se.

Senhor Presidente do Sporting Clube de Portugal: não chega resistir ou ser optimista e achar que isto acabará por mudar. Nós temos também de mudar alguma coisa, designadamente, de roupa: talvez o luto ponha mais uma vez em evidência a falta de vergonha!...
 

«{... ] À direita de Pedro Proença [...] sentou-se Frederico Varandas. Do lado esquerdo, não parecia óbvio, mas sentou-se Pinto da Costa»


COMENTÁRIO AOS COMENTÁRIOS 

EM comentário à já por si comentada arbitragem do árbitro João Pinheiro, disse ontem o comentador de arbitragem, ex-árbitro, Duarte Gomes: «João Pinheiro é o melhor árbitro português da actualidade. Ponto». Este ponto final, para terminar com a discussão acerca de quem é o melhor árbitro português, como se isso interessasse para alguma coisa, é mais um sinal da arrogância com que os árbitros e os ex-árbitros tratam a questão da arbitragem, fugindo sempre à questão de fundo - o corporativismo do sistema.

Para além da arrogância, que me irrita a mim e a qualquer ser humano, esta afirmação coloca-me uma questão: não sei se chore de tanto rir se deva rir até chorar. Se este é, sem discussão, como quer Duarte Gomes e não só, o melhor árbitro português, está encontrada a explicação sobre a ausência de qualquer árbitro português no mundial do Qatar. Na verdade, se este é o melhor, como serão os outros? Forçosamente ainda piores.

Curioso é que, em destaque, pode ler-se no seu comentário: «João Pinheiro esteve mal num conjunto de decisões que o expôs a um critério disciplinar incoerente». Ora, qualquer dicionário de língua portuguesa define critério como uma faculdade de distinguir o verdadeiro do falso, o bom do mau, pelo que quando falamos de um critério disciplinar incoerente não estamos a falar em erro humano, mas em falta de coerência, isto é, de um sinal da personalidade do árbitro ou de falta da mesma.

Duarte Gomes não se fica por aqui e acrescenta que tal «critério disciplinar incoerente» foi «em prejuízo directo do Sporting. Isso foi factual não vale a pena dizer o contrário». E eu pergunto: critério disciplinar incoerente, em prejuízo directo do Sporting é erro humano ou será antes condição sine qua non para ser considerado o melhor árbitro português? Para a FIFA talvez não seja critério de escolha, ao contrário do que acontece em Portugal!...

«As opções beliscaram a credibilidade da arbitragem, dando azo a velhas conversas de taberna», conclui Duarte Gomes. A referência às tabernas será por terem acabado vouchers para ir a determinado restaurante ou será que se quer dizer que até um bêbado percebe que critério disciplinar incoerente nada tem a ver com erros involuntários, mas, efetivamente, com credibilidade? Bem-vindo Duarte Gomes ao tema!...

Na análise técnica à arbitragem aos lances do jogo, no domingo passado, Duarte Gomes intitulou-a de «não correu bem»; agora, serenado os ânimos e com tranquilidade, sem dúvida que a sua análise correu melhor e foi mais assertiva, o que é de saudar: critério disciplinar incoerente, em prejuízo directo do Sporting e beliscando a credibilidade da arbitragem!

Assim devia ter sido o seu comentário na noite do jogo, e não a corporativa e infeliz comparação que fez dos erros de João Pinheiro com o erro de Adan, na abordagem à bola.

Na verdade, Adan não beliscou a sua credibilidade de grande guarda -redes, que tantas vitórias deu ao Sporting com as suas defesas decisivas; dessa abordagem resultou um prejuízo para o Sporting, obviamente não querido e que podia ter sido minorado não fosse a abordagem disciplinar ao jogo de João Pinheiro, em prejuízo directo do Sporting; Adan falhou involuntariamente no critério de abordagem da bola, João Pinheiro teve dualidade de critérios na abordagem disciplinar do jogo, como aliás é habitual, e, nesse aspecto, coerente. Confundir o erro involuntário de Adan com critério disciplinar incoerente é o mesmo que confundir a estrada da Beira com a beira da estrada. E o pior é que critérios disciplinares incoerentes não dão lugar a castigos, mas apenas ao silêncio do Conselho da Arbitragem e da sua sócia APAF (como Dupont & Dupont) e às conversas de taberna, tal é a bebedeira!
 

NOTA FINAL

Nos últimos dias têm circulado nas redes sociais, onde eu não acedo, mas que me chegam via whatsapp, diversos vídeos recordando as intervenções de Medina Carreira - um homem livre com o enorme defeito de falar verdade.

Entre esses vídeos, de que se realça a coragem e independência das suas afirmações e ideias, destaca-se - vamos lá saber porquê - uma entrevista, em 2012, à TVI, em que, referindo-se ao governo e aos partidos, diz, curto e grosso, que «com esta gatunagem, a democracia não sobreviverá!»

Dez anos depois, ainda sobrevive, o que mostra que há gente importante, e há mais tempo, muito mais pessimista do que eu! E com razão!...