Ponta de lança à força
Pavlidis não vive momento particularmente feliz no Benfica (Foto Imago)

Opinião de Rui Águas Ponta de lança à força

OPINIÃO10:00

'Visão de golo' é o espaço de opinião semanal de Rui Águas, antigo internacional português e treinador

O vértice fundamental de uma equipa. Um tema que justifica um livro e no meu caso uma história vivida. A verdade é que eu fui um ponta de lança à força. Joguei a médio no curto período que cumpri de formação. Era franzino e filho de alguém famoso na arte de fazer golos. Duas razões importantes para fugir da área...

A parte final da minha formação foi, na altura, interrompida por uma lesão que teimava em não passar. Quando, finalmente, fiquei bem, então sem clube, tentei a minha sorte no Atlético Clube de Portugal que promovia sessões de experiência para candidatos ao plantel. Lá me apresentei na minha posição de médio, mas o clube procurava um avançado e não fiquei...

Seguiu-se nova tentativa no Sesimbra (III Divisão). Quando me perguntaram qual a minha posição, disse que era avançado, previsivelmente aquilo que ali também faltava. A necessidade aguça o engenho... O treino correu bem e fui aceite logo no primeiro treino. Estava encontrada definitivamente aquela que seria a minha posição e que me levou a um nível que, na altura, nem sonhava.

Tinha 20 anos, estudante de Educação Física, e o futebol era para mim tão simplesmente, nessa altura, um meio de conseguir algum dinheiro. Três anos foram cumpridos nas divisões inferiores, que me permitiram depois chegar à I Divisão, sendo que o resto da história a maioria dos leitores já conhece.

NÚMERO 9

Falando de avançados na atualidade do Benfica, Pavlidis é o homem do momento, muito pelos golos que inesperadamente derrotaram a Inglaterra. Este feito não resulta, curiosamente, de um momento particularmente feliz do jogador grego no Benfica, ao contrário da promessa goleadora que ficou bem vincada nesta pré-época.

É uma lógica irregular aquela em que vivem frequentemente os goleadores. É uma luta de afirmação contínua muito individual, num desporto cuja força é coletiva. A questão mental é, como sempre, decisiva. Sendo Pavlidis o mesmo jogador que há uma semana, o que leva a que o rendimento seja tão diferente em tão pouco tempo? Será circunstancial ou sorte? Será pelo maior conforto e entendimento que encontra na sua seleção? Ou por ser o início num campeonato diferente e num clube mais exigente, a adaptação está ainda por concluir?

Não tenho dúvidas da capacidade do jogador e da validade desta contratação do Benfica. Mas não há ponta de lança que se alimente só de esforço e assistências... Não chega... A maneira de reagir a períodos de seca é um dos recursos que fazem a diferença para quem veste o número 9.

ARTE SOCIAL CANARINHA

Gosto e acompanho o Estoril Praia, porque é uma parte feliz da minha vida desportiva. Foi lá a minha estreia como treinador principal, há alguns anos, na extinta II Divisão B. Os tempos são agora, como se sabe, bem diferentes, não dando para comparar. O investimento estrangeiro e a valiosa participação regular na nossa principal Liga são a realidade atual.

Ressalvo, no entanto, um passado de imagem muito positiva e bonita de apoio incondicional dos seus adeptos, que seria ótimo conseguir preservar. A violência que hoje é vulgar ver-se é só vulgar, não tem de ser imitada.

Classificação à parte, que não sendo boa rapidamente muda, o Estoril estabeleceu na comemoração do Dia da Doença Mental uma parceria, mais valiosa do que qualquer vitória que só vale três pontos, com a Associação de Desenvolvimento Criativo e Artístico.

A redução do estigma à volta da doença mental é o objetivo principal deste projeto de inclusão social em que o Manicómio Lisboa e o Estoril se juntam. O clube definiu inclusivamente um espaço de atendimento psicológico no seu estádio. Um equipamento alternativo para a equipa foi criado como retribuição artística ao importante apoio público que o clube significa.

Boa, Estoril!