O presidente certo
Rui Costa fala sempre para milhares de sócios e milhões de adeptos espalhados pelo mundo e é essa colossal massa anónima que é a alma do Benfica
DEPOIS de alguns dias agitados e de muito falatório, creio ser do interesse do universo benfiquista concentrar-se no que é importante e não contribuir para a propagação de desavenças menores que apenas servem para desviar as atenções do essencial.
Há uma semana escrevi neste espaço que a visita do Benfica à capital do Minho devia ser encarada com cautelas redobradas devido a vários fatores, de que destaquei, por exemplo, o histórico de confrontos entre os dois emblemas nas últimas quatro épocas, favorável aos bracarenses, com acento tónico na estranha derrota sofrida pela águia (0-3), a 30 de dezembro do ano passado, em jogo referente à 14.ª jornada da Liga.
Desta vez, para a Taça de Portugal, pode dizer-se que o árbitro errou ao não assinalar um penálti sobre Gonçalo Guedes e que, em princípio, colocaria o Benfica a ganhar por dois golos de vantagem, mas depois houve a ação disparatada de Bah, a respetiva expulsão e as precipitações que se lhe seguiram em que, sejamos claros, ninguém ficou bem na fotografia, começando no treinador e acabando no presidente:
Roger Schmidt porque não reagiu com a lucidez que se impunha, mexendo depressa de mais na equipa em vez de proceder a uma rearrumação para queimar os minutos que separavam a situação imprevista do intervalo, ver como a equipa respondia e amadurecer soluções em vez de reagir a quente e do meu ponto de vista mal, em vários níveis, mas é a opinião de quem nada tem a ver com o assunto;
Rui Costa porque se excedeu. Não fica bem a um presidente do Benfica, na linha dos chamados grandes presidentes e tive oportunidade de conviver com alguns durante a minha vida profissional, falar nos corredores ou nas garagens, muito menos ir à cabina do árbitro para discutir com ele na presença de polícias, bombeiros, delegados e do magote que ali se juntou, sujeitar-se a ser filmado às escondidas e surgir como protagonista de uma evitável cena profusamente difundida nos canais esterqueiros das redes sociais.
NÃO é minha intenção dar lições de boas práticas, não me atrevo a tal, mas entendo que o presidente de um clube com o prestígio do Benfica não deve preocupar-se nem com movimentos internos de duvidosas intenções, e que não demoraram a dar sinal de vida, nem querer agradar aos frequentadores regulares das assembleias gerais ou aos convidados habituais da tribuna presidencial.
Rui Costa fala sempre para milhares de associados e milhões de adeptos espalhados por todos os continentes e é essa colossal massa anónima que representa a alma do maior clube português, que é também a marca mais valiosa do País no mundo do futebol e que, amanhã, só não esgota por inteiro a lotação do estádio do Club Brugge porque os dirigentes belgas agiram a tempo de conter a invasão benfiquista, sem evitar, porém, que Roger Schmidt e os seus jogadores se vão sentir como em casa.
O atual líder foi escolhido em outubro de 2021, com 84,48 por cento de votos, na assembleia eleitoral mais participada na história do Benfica (mais 40 mil votantes) e está, pode dizer-se, no primeiro ano a sério do seu mandato, em que escolheu o treinador e preparou a época de raiz. Sei que no seu discurso de vitória prometeu ganhar sempre em todas as competições. Sim, é normal, mas calma, ainda agora está a começar, não precisando justificar-se sobre as suas ações nem expor-se da forma como o fez. Os adeptos da base, que são a principal força do emblema da águia, confiam nele, respeitam-no e reconhecem que é árdua a empreitada e longo o caminho porque desde o verão de 2019 que o Benfica não regista no seu rico currículo uma única conquista.
UMA boa equipa de futebol, mesmo nos clubes endinheirados, não se faz reunindo onze bons jogadores. Demora tempo, é preciso fazer correções, dar passos atrás para reparar erros de avaliação e quando se pensa que tudo está encaminhado os mercados encarregam-se de dizer o contrário. No entanto, em tão pouco tempo, Rui Costa arrumou a casa, formou um equipa para ganhar internamente, mas ainda não tem um plantel para competir ao mais alto nível, tal como o próprio Roger Schmidt admitiu.
Por outro lado, o Benfica já foi perturbado pela avareza dos países mais ricos, mas a vida continua, como também referiu o treinador benfiquista após a saída de Enzo Fernández: a equipa não ficou mais fraca, apenas ficou diferente, razão pela qual não atribuo à eliminação da Taça de Portugal a carga dramática que lhe quiseram colar porque, é a minha opinião, as coisas vão-se fazendo e neste ano 1 da presidência de Rui Costa há duas prioridades a concretizar:
a primeira, ser campeão nacional, conquistar o título 38, e esse objetivo está perfeitamente ao alcance, como atestam os cinco pontos de vantagem sobre o segundo classificado;
a segunda, consolidar a participação na Liga dos Campeões e tentar reforçá-la, estabelecendo os quartos de final como patamar de referência de modo a recuperar a dimensão europeia que foi perdendo durante este século.
Dois alvos que Rui Costa está em condições de prometer não falhar. Como ponto de partida, não está nada mal. A família benfiquista sente que encontrou o presidente certo.