Messi e Ronaldo
Messi não tirou a coroa da cabeça de Ronaldo, tirou-a da cabeça de Maradona...
NÃO, nunca mais me esqueci de ler o que li numa crónica de Jorge Valdano - a falar de Ronaldo pouco antes de Ronaldo ganhar a Messi a sua primeira Bola de Ouro (em 2008):
— Se alguém tivesse de desenhar o corpo ideal para jogar futebol teria de basear-se no de Cristiano. Todas as suas virtudes físicas permitem-lhe chegar antes de todos mas é com a bola em seu poder que elas se impõem, porque sobra-lhe manejo na sua condução, habilidade para o drible, qualidade de passe, potência de remate e visão de jogo. A partir de agora só lhe faltará demonstrar que também sabe o que fazer com o peso de uma Bola de Ouro. A sensação final é a de que com Ronaldo e Messi começa uma nova era e nenhum deles se deve esquecer de que a coroa que deixou Maradona ainda está à procura duma cabeça que passe à história…
No ano seguinte (no de 2009) vencedor já foi Messi - e Ronaldo, mostrando saber o que fazer com o peso de uma Bola de Ouro, agarrou mais quatro (em 2013, 2014, 2016 e 2017). As proezas levaram a que o tratassem como Melhor do Mundo - e eu não concordava. Não concordava porque o Melhor do Mundo (mesmo quando não ganhava a Bola de Ouro) era Messi - e não apenas porque (para mim) ninguém jogava (e joga) como ele: no toque do pé em veludo, elegante e simples, no encanto do passe ou do drible em poema sem deixar de fazer também o que Ronaldo fazia (e já pouco faz): transformar o remate num tiro letal...
O que o Catar-2022 me deu (para além da mágoa de ver Ronaldo a cair pelo buraco do ponto…) não foi a confirmação de Messi só como Melhor do Mundo. Se num seu verso Adélia Prado dizia:
— de vez em quando, Deus me tira a poesia: olho a pedra, vejo pedra mesmo…
no jogo que se continuou a ver no Messi a pedra não era pedra mesmo, era luz - a luz com que tira do seu jogo (ou da equipa) o negrume das vielas para lhe dar linhas de horizonte em arco-íris. E assim tirou (de vez...) a coroa não da cabeça de Ronaldo mas da de Maradona.