Luz que cega

OPINIÃO13.07.202206:30

Quando se fala nas ‘operações’ do PSG é preciso contextualizar. Fazer um esforço para pensar noutra escala. Maior. Muito maior

OPSG é um dos vários ativos do infindável portfólio dos Al Thani, a riquíssima família reinante do Catar, cuja fortuna está avaliada em cerca de 330 mil milhões de euros. Acionistas de referência de colossos da economia como a British Airways, a Volkswagen e o banco Barclays, proprietários de dois dos arranha-céus mais famosos (e estilosos) do Mundo - o Empire State Building (Nova Iorque) e o The Shard (Londres) - e da loja mais icónica da capital inglesa, o Harrods, os Al Thani não devem perder muito tempo a olhar para as contas do PSG, que não devem significar mais que uma ínfima gota de água no oceano dos seus assets e investimentos globais. É assim que o noticiário relativo às movimentações do PSG no mercado futebolístico tem de ser contextualizado e creio que podemos dizer o mesmo do Manchester City, propriedade dos Al Nahyan de Abu Dhabi; e do Newcastle United, recentemente comprado pela príncipe herdeiro da mais rica e poderosa de todas as famílias reais da península arábica, a Saudita.

Empenhado numa putativa alteração do espírito instalado no PSG (considerado demasiado brando, permissivo e complacente para as exigências do futebol europeu de ponta), o presidente Al-Khelaifi endureceu o discurso e contratou um treinador com fama de disciplinador, Christophe Galtier, para tentar domar as estrelas que mandam na equipa; e também contratou o diretor técnico português Luís Campos para programar o PSG do futuro em moldes mais lúcidos e racionais. Em todas as declarações produzidas no defeso, percebeu-se em Al-Khelaifi a intenção de levar a cabo uma grande limpeza no balneário parisiense. Neymar seria um dos principais alvos, mas o divertido e folgazão internacional brasileiro não é assim tão fácil de despachar como a direcção do clube pensava. Agora surgiu na Imprensa francesa uma lista dos jogadores descartáveis que, presume-se, será da responsabilidade de Luís Campos com o acordo Galtier.

Na lista mais reproduzida dos putativos excedentários, o meio campo do PSG é quase todo para deitar fora (com  excepção do italiano Marco Verratti e, claro, do recém contratado Vitinha). Na lista figuram futebolistas que custaram larguíssimos milhões como Mauro Icardi, Julian Draxler, Leandro Paredes, Gini Wijnaldum, Ander Herrera, Idrissa Gueye e Abdou Diallo; mas também (numa ou noutra versão) o médio/defesa internacional português Danilo Pereira e o ex-sportinguista Pablo Sarabia, o internacional espanhol mais utilizado por Luis Enrique na época que findou.  Bom, se retirarmos Danilo e Sarabia da lista, estamos a falar de um conjunto de jogadores que custaram €250 milhões ao PSG (a maior parte nos últimos dois/três anos) e cujo valor no Transfermarkt ascende a €165 milhões (com Danilo e Sarabia os valores ascendem, respetivamente, a €284 e €181 milhões).

Aceitando que mesmo um talento notável como Sarabia (o mais valioso dos descartáveis) dificilmente teria hipótese de se expressar, com regularidade e continuidade, numa equipa com Neymar, Messi e, sobretudo, Mbappé (o novo chefe da banda), custa perceber como é que Galtier poderia abrir mão de Danilo, um dos médios mais combativos e físicos do PSG, sem ter outros nomes já assegurados. Renato Sanches será um deles (assim como o central Milan Skriniar, do Inter; e o médio ofensivo Hugo Ekitike, do Reims), mas ainda assim parece curto para uma equipa que tem nos intocáveis Neymar e Messi dois jogadores habitualmente avessos a tarefas de marcação. Há muito tempo que deixei de me surpreender com a dimensão dos investimentos, luxos e desperdícios dos magnatas árabes no universo dos negócios europeus - futebol e outros, bem mais grandiosos. Li, vi e sei o suficiente sobre as famílias reinantes na península Arábica para saber que aquilo que eventualmente nos possa chocar - como um prémio de assinatura de €300 milhões, por exemplo - não tem o mesmo significado para eles. É preciso contextualizar. Fazer um esforço para pensar noutra escala.
Maior. Muito maior.
 

SUPERPLENO À GUARDA DE ABEL 

OPalmeiras recebe amanhã o São Paulo na 2.ª mão dos oitavos de final da Copa do Brasil. Derrotado por 1-0 no Morumbi, há 15 dias, o Verdão de Abel Ferreira tem de operar a reviravolta para poder continuar a sonhar com a conquista de um superpleno histórico. O Palmeiras aspira a ganhar todas as competições em que está envolvido, sendo o Brasileirão a única joia em falta na coroa de rei Abel. Campeão Estadual Paulista, vencedor da Recopa Sul-Americana (o equivalente à nossa Supertaça Europeia), líder isolado do Brasileirão e favorito máximo na presente Taça dos Libertadores (defronta nos quartos de final o Atlético Mineiro de Hulk, numa reedição da meia-final da época passada), a equipa de Abel Ferreira está a fazer uma época de tal forma conseguida e convincente que muitos cronistas e opinadores (nomeadamente os que escrevem na  Folha e no Estado de São Paulo) já olham para este Palmeiras como uma equipa de época, destinada a figurar álbum de glórias do futebol brasileiro.

A questão é que o São Paulo de Rogério Ceni não vai facilitar um milímetro na quinta edição do choque-rei da época. Até porque das quatro derrotas sofridas pelo Palmeiras na temporada (em 45 jogos) duas foram com o eterno rival tricolor (as outras duas foram com o Ceará e com o Chelsea, na final do Mundial de Clubes). Copiosamente goleado pelo Verdão na final do campeonato Paulista (0-4 no Allianz Parque depois da vitória inicial por 3-1), o São Paulo também perdeu para o rival no campeonato (1-2 no Morumbi, com os golos palmeirenses a surgirem em tempo de descontos) antes de vencer por 1-0 na Copa. O supremo prazer de destruir o sonho de milhões de adeptos alviverdes (tchau, pleno!) está ao alcance da turma de Rogério Ceni.
Tem a palavra Abel, o guardador de sonhos.