Com os pés bem no chão e a cabeça bem erguida
Domingo passado, marcou o regresso do Sporting às vitórias fora de casa para a Liga, o que não acontecia, por incrível que pareça, desde o dia 3 de dezembro do ano passado, em Vila do Conde. Seguiram-se a esse jogo (e falo de fora de casa e para a Liga) o V. Guimarães, o Tondela e o V. Setúbal. Haverá várias explicações para estes falhanços sucessivos, com destaque, sobretudo para os do Tondela e Setúbal. Como haverá também para o fatídico jogo em casa contra o Benfica. Mas a explicação de que mais gostei deu-a um adepto, na TVI, que munido de um enorme lençol branco, dizia que aquele se destinava a mim próprio e ao presidente do Sporting.
Como calculam, a minha culpa era muito relativa. Basicamente escrevi na semana passada que seria bom os sportinguistas guardarem os lenços brancos e os ânimos exaltados; em função disso, este jornal escolheu, como seria óbvio, uma fotografia de adeptos a agitar lenços no final do jogo com o Benfica, o que desagradou ao senhor do lençol que decidiu fazer de mim um alvo. E um alvo ao nível de Frederico Varandas… é obra!
Ainda que sob pena de aquele e de outros adeptos (são poucos, mas persistentes), me enxovalharem nas redes sociais e até nas televisões nacionais, insisto que não é altura de lenços brancos. Mesmo depois de ganharmos em Santa Maria da Feira por 3-1, a exibição deixou muito a desejar (e teve em Bruno Fernandes, mais uma vez, o herói), temos dois jogos pela frente em que a equipa vai ter de esforçar-se e muito, para nos dar alegrias - o Villarreal, já hoje, para a Liga Europa, e o SC Braga no próximo domingo para a Liga portuguesa. São ambos em Alvalade, o que aumenta a nossa responsabilidade. Acresce que o jogo europeu é contra uma formação que anda pelas ruas da amargura no país vizinho.
Porém, ainda que não sejamos bem-sucedidos numa ou noutra, ou mesmo em ambas as frentes, prossigo o meu mantra: o Sporting tem de ter os pés bem assentes no chão, refazer o que foi desfeito (o trabalho na Academia é algo que demora anos) e andar de cabeça erguida - como Bruno Fernandes.
Somos nós, aqueles cujos valores foram sempre diferentes do ganhar a qualquer custo, através da ameaça, da corrupção, do insulto, da pressão, da chantagem. Isto não tem preço. E não são os valores que nos impedem de ganhar - sabia-o bem Fernando Peres, um dos ídolos da minha juventude que, infelizmente, nos deixou.
Será Keizer o problema?
Omeu camarada de redação durante 20 anos, sportinguista de todas as gemas e atual presidente da agência Lusa, Nicolau Santos, escreveu um texto bem estruturado no Expresso (Tribuna), no qual aponta o dedo às deficiências de Keizer e ao modo como afastou jogadores como Miguel Luís ou Jovane Cabral. Verdadeiramente, eu não discordo dele. Mas, apesar de nos conhecermos desde que ele veio de Angola, há quase 50 anos, sempre divergimos, para o bem e para o mal, na intensidade das convicções. Ele quer - e bem - que o Sporting ganhe sempre. Eu também! Mas compreendo que nem sempre o pode fazer.
Como ele, também não conhecia Keizer até ele ser anunciado e, como ele, pensei que a oportunidade aos novos ia ser dada. Mas o problema - o cerne do problema, com o qual me confrontou o prof. Jorge Castelo num programa televisivo de A BOLA TV, faz hoje oito dias, é como podemos ter calma e confiança sem ganhar jogos? A minha resposta não pode ser mais simples: Não sei!
Sou, porém, obrigado a saber uma coisa, fundamental para todos os que querem fazer um caminho: de onde viemos? E compreendo, porque se pensarmos para além das emoções, é fácil compreender que partimos de um ponto miserável. Com um alucinado a presidir ao clube, que criticava a equipa; com um assalto ao centro de treinos e formação, com mais de meia equipa a despedir-se de nós. Pior: com uma situação económica verdadeiramente calamitosa. E essa é prioritária, porque se podem fazer muitas coisas quando se tem dinheiro ou se é irresponsável na sua gestão, mas nada se faz sem ele. O futebol, hoje em dia, apesar das paixões que desperta e de todo o ruído que gera, é um negócio de milhões. Um negócio no qual, se os nossos clubes e o nosso país fossem verdadeiramente organizados e escrupulosos, seria, mais do que é, fonte de prestígio e de divisas. Infelizmente, entre o que valemos e o que desperdiçamos talvez a balança ainda penda para o segundo.
Por isso Keizer parece-me - a mim que nada tive a ver com a sua escolha e que nem sabia quem era - um dos menores problemas do Sporting. É certo que há coisas que não entendo…, mas, sinceramente, não tenho a pretensão, e provavelmente até a vontade, de conhecer tudo. Sei que ganhámos a Taça da Liga (que os três que vão à nossa frente também queriam; que temos hipóteses na Taça de Portugal e que vamos ter um lugar Europeu, de preferência na liga milionária).
Felizmente há VAR
Qualquer sportinguista sabe isto intuitivamente. Ao contrário do treinador do SC Braga e de alguns elementos do Benfica que já falaram (talvez em momentos de desnorte) em acabar com o vídeoárbitro, mais conhecido por VAR, o Sporting sem VAR estaria bem pior. Não porque tenha sido particularmente prejudicado, mas porque quem o salva de ser particularmente prejudicado é o VAR. Basta olhar para o último jogo da Taça de Portugal, as meias finais na Luz, onde perdemos 2-1. Se o VAR existisse, o empate do Sporting seria uma realidade. Porque o golo foi limpo; não houve carga nenhuma sobre o guarda redes do Benfica na pequena área e porque a lei que diz que o guarda-redes é intocável na pequena área já acabou. Duarte Gomes explicou isto com meridiana clareza.
Embora não seja daqueles adeptos que gosta de contabilizar todas as vezes que fomos prejudicados, para, eticamente, não ter de contabilizar todas as vezes que fomos beneficiados, concordo inteiramente com a ideia de que o VAR é um grande avanço na arbitragem do futebol. Pode haver mais, nomeadamente o fora de jogo pode ser avaliado eletronicamente sem grandes dificuldades (e parece-me que aquela recomendação de, em caso de dúvida, beneficiar o ataque anda a ser esquecida) como já o é a linha de golo. Curiosamente, na sociedade em geral anda muita gente preocupada com a inteligência artificial, e aqui, onde ela faria falta, porque sendo artificial tenderia a ser neutral, vê-se pouca gente com iguais preocupações.