Jorge Jesus, 70 anos, tem perfil para liderar a seleção do Brasil, consumada a saída de Dorival Júnior
Jorge Jesus, 70 anos, tem perfil para liderar a seleção do Brasil, consumada a saída de Dorival Júnior (Foto: Imago)

Acredito em Jesus

OPINIÃO30.03.202508:15

O senhor que se segue no Brasil poderá ser... Jorge Jesus. Imaginar um técnico português à frente da 'canarinha' era ficção científica quando Marinho Peres soltava um «fala aí, garoto»... 'Hat trick' é o espaço de opinião semanal do jornalista Paulo Cunha

Raphinha viu o feitiço virar-se contra o feiticeiro e provocou-me aquele sentimento desnecessário de vergonha alheia. «Porrada neles! Sem dúvida! Porrada neles! No campo e fora do campo se tiver que ser!», assim respondeu o craque do Barcelona depois de ter sido questionado por Romário sobre se «daria porrada no maior rival», em entrevista à Romário TV, nos dias que antecederam a catástrofe do Brasil na Argentina.

O jogador em melhor forma da seleção brasileira — a realizar temporada de sonho nos blaugrana (27 golos e 20 assistências em 42 partidas!), conforme o Benfica sentiu na pele recentemente em três duelos da Liga dos Campeões (5G e 1A) — julgou ser boa ideia provocar a Argentina antes de uma partida em Buenos Aires no mítico Monumental a rebentar pelas costuras. À míngua de bom senso, o esquerdino juntou considerável falta de inteligência emocional e encheu de motivação o depósito dos argentinos. Em campo, a garganta de Raphinha perdeu para os pés dos campeões do Mundo e vencedores das duas últimas Copas Américas, tal como Leandro Paredes avivou a Rodrygo durante o massacre que terminou com lisonjeira, apesar dos pesares, goleada de 1-4 sofrida pelos forasteiros.

E agora, Brasil? Quando Portugal não era cliente de Campeonatos do Mundo, aquele bálsamo de verão de quatro em quatro anos, a canarinha era o meu plano B, sobretudo no traumático Espanha-1982, antes de Diego Armando Maradona se intrometer nas minhas preferências no México-1986 e Itália-1990. Nos Estados Unidos-1994, após o afastamento de D10S devido a doping, e França-1998 lá estava eu a torcer pelos comandados de Carlos Alberto Parreira e Mário Zagallo, respetivamente. A partir de 2002, então sim, com a equipa das quinas sempre presente na competição, dediquei-me apenas ao plano A.

A pergunta umas linhas atrás era, no entanto, e agora, Brasil? Não me lembro dos pentacampeões mundiais contarem com uma seleção tão fraca como a atual, embora arrisque afirmar que o contexto transforma estes futebolistas em piores do que são na verdade — basta comparar o Raphinha do Barça com o desta seleção que teve três treinadores, Ramon Menezes, Fernando Diniz e Dorival Júnior, despedido na sexta-feira, em menos de dois anos. O senhor que se segue poderá ser... Jorge Jesus.

Imaginar um técnico português à frente do Brasil era ficção científica quando, por exemplo, o saudoso Marinho Peres — aqui lhe faço a devida vénia porque era um homem bom — liderava o Belenenses e sempre que nos via após os treinos, ciente de que queríamos conversar com ele, soltava um inesquecível «fala aí, garoto».

Acredito em Jesus, já em milagres... Mas que desafio será para JJ, aos 70 anos, assumir pela primeira vez uma seleção — e que seleção! — num país no qual elevou o Flamengo para outros patamares em tão pouco tempo. Logo aqui estão dois pontos a favor dessa possível escolha da Confederação Brasileira de Futebol: o conhecimento do país e a capacidade para rapidamente pôr a máquina a funcionar. A língua também não é problema e quanto a capacidade de liderança nem há dúvidas — Neymar, sobretudo ele, que tome bem nota disto.