A natureza do adepto luso

OPINIÃO09.10.202407:30

Assobios, insultos e ódio. Os jogadores não são máquinas, têm pais, mães, irmãos, mulheres e filhos na bancada, e sabem que depois do jogo o sofrimento será distribuído pela família. 'Estádio do Bolhão' é o espaço de opinião semanal do jornalista Pascoal Sousa

Os assobios não são um exclusivo do Dragão. Na generalidade dos estádios da Liga, o público aplaude vitórias e censura derrotas ou exibições pobres. Não é a natureza humana a funcionar. É a natureza do adepto português, por muito que nos custe fazer essa leitura. Uma equipa favorita ser contrariada por outra menos favorita não é sinalizado como um fator que potencie o espetáculo, mas como uma desgraça, o presságio de fim do mundo.

No meio de todo este ruído, de apelos à unidade e à reeducação, quase nos esquecemos que o FC Porto-Man. United e o FC Porto-SC Braga ofereceram a quem gosta de futebol momentos de grande espetáculo e emoção, e que o Sporting-Casa Pia foi um autêntico bocejo, ainda assim nunca merecedor de assobios ou algo do género. Os assobios e insultos magoam os novos e os menos novos. Não há uma faixa etária mais ou menos imune a um tribunal num estádio.

Veja-se o caso de João Mário, que deixou o Benfica com destino ao Besiktas após compreender que nunca poderia vencer um estádio em chamas. A retórica dos treinadores, segundo a qual a pressão é bem-vinda mesmo que acompanhada de impropérios e de ódio, é uma mentira pegada, uma manobra psicológica destinada a retirar o peso negativo dos ombros dos futebolistas. Só que não retira, porque os jogadores não são máquinas. Têm pais, mães, irmãos, mulheres e filhos na bancada, e sabem que depois do jogo o sofrimento será distribuído pela família. É verdade, adeptos. Os jogadores (como você, caro leitor) têm família.